Feres Sabino
Para alguns ingênuos não era difícil acreditar na figura do brasileiro bonzinho, que se aproveitava, quem sabe?, da riqueza democrática de sua natureza, para descarregar sobre os escravos o seu chicote ininterrupto, definidor do chamado racismo estrutural, que deixou marca indelével em nossa cultura, imantada em nossas estruturas sociais, e em nossa alma.
A emergência de um oficial defenestrado do nosso glorioso Exército, e posteriormente levado à altitude do Poder Político, com a arrogância ignorante de considerar as nossas Forças Armadas, como o “Meu (Seu) Exército”, veio acompanhada da certeza de que seria o suficiente para impugnar o resultado eleitoral das urnas eletrônicas e garantir sua permanência e a conclusão de seu projeto autoritário, incluindo em especial a defesa de parentes e amigos. Era a certeza gerada pela benesse salarial distribuída entre militares e forças policiais e com a antecipada liberação do acesso as armas.
A resistência da sociedade, com parte dela investindo numa frente ampla nas eleições, em favor do Estado Democrático de Direito, e a maioria velada dos militares, sujeita à força da disciplina, caminhou através da aspereza das chamadas manifestações antidemocráticas, até chegar ao paroxismo de um atentado terrorista, e continuar desbravando a canalhice em fuga…
O Brasil, que recebe tantas etnias, de tantos países e lugares conflagrados por violências sofisticadas, sabe que o terrorismo, que busca a surpresa para alcançar o maior dano destrutivo, não separa de suas consequências, pessoas ou bens, e ainda fez o favor de dispensar o Brasil da importação da besta da destruição de qualquer daqueles países.
Viu-se que o acampamento de Brasília, funcionando como “incubadora de violência”, e o funcionário (?) de um Posto de Gasolina, lá do Pará, afastou-se do emprego para gastar e adquirir 160 mil Reais (será que o dinheiro não veio de outra fonte?) em armamento de grosso calibre, aproveitando-se de licença como inscrito num Centro de Tiro e de Caça, transportando tais armas, para fazer acontecer o atentado inaugural do caos, antes da posse do novo presidente. Na confissão revelou seu impulso homicida despertado pela pregação presidencial de que “O povo armado jamais será vencido”, o que talvez explique o silêncio ensurdecedor do presidente derrotado diante do vandalismo incentivado. Talvez inicie nessa frase a suspeita causada pelo general da segurança interna, em que sugere que o tempo eleitoral e sua conclusão ainda não tinha terminado… O que nos permite desconfiar que a articulação do paroxismo da violência era ansiosamente conhecida e esperada. O preso confessou que falara com um general.
Afinal, se nossa boa-fé não chegaria jamais a tanto, o fato é que o Brasil inaugurou o terrorismo político, em suas terras, seguramente animado pelo poder político central, que preparou meticulosamente o ambiente das armas, com a facilidade de sua importação, enfraquecendo sua fiscalização pelo Exército Nacional, a ponto de Roberto Jefferson declarar que seu ataque à Polícia Federal, ferindo delegados, era só um sinal. Aquele ato de tiros seguidos e de explosão de granadas era só um aviso? Aviso do que aconteceria em Brasília? — o atentado terrorista. Portanto, tem-se fortes indícios de que a articulação é antiga e a liberação da compra das armas seria simplesmente a execução inicial de um plano para armar milicias.
Agora, os pregadores do ódio podem gritar: o terrorismo é nosso! O bicho-papão desse ódio propagado é derrotar o tal do comunismo, esta eficaz mercadoria histórica, muito conhecida dos brasileiros e convocada para iludir os incautos, submetidos as mesmas práticas nazistas e fascistas, que nossas Forças Armadas ajudaram a enterrar na 2ª. Guerra Mundial, nos campos da Itália. Hoje são confrontadas pelos aprendizes com suas manifestações antidemocráticas e violentas. E sempre se espera das nossas Forças Armadas, um dia denominadas de “o povo fardado”, a ação forte e determinada em defesa intransigente do Estado Democrático de Direito, e ainda que construam, juntamente com todos os segmentos da sociedade brasileira, um projeto nacional de desenvolvimento.
Nós precisamos reconquistar a racionalidade política perante esses novos desafios, para recolocar a besta das armas e da violência no bueiro da história, e do qual saiu. Nós precisamos investigar as raízes profundas desse precedente violento, como medida de defesa e de prevenção, punindo todos os que direta ou indiretamente colaboraram com tal ato. Tarefa que não será fácil … já que o terrorista seguramente não agiu sozinho, e por trás dele quem estava ou está?