Tribuna Ribeirão
Política

Confiança ou golpe? – Bolsonaro diz que ‘só Deus’ o tira do cargo

ANDERSON RIEDEL/PR

Em seu discurso na cerimô­nia de abertura da 27ª Feira Inter­nacional de Tecnologia Agrícola em Ação (Agrishow 2022), em Ribeirão Preto, Jair Bolsonaro (PL), pré-candidato à reeleição, afirmou que “só Deus” vai tirá­-lo da cadeira de presidente da República. “Quero reforçar aqui. Só Deus me tira daquela cadeira”, disse, confiante, apesar de estar atrás do ex-presidente Luiz Iná­cio Lula da Silva (PT) em todas as pesquisas divulgadas até agora.

Em sua visita a Ribeirão Pre­to, o presidente pouco falou sobre agronegócio, mas veio fazer polí­tica e desafiar os outros poderes, principalmente o Judiciário. Bol­sonaro afirmou que o decreto editado para perdoar o deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), con­denado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a oito anos e nove meses de prisão por atacar mi­nistros da Corte, as instituições e a democracia, e de estar inele­gível atualmente, é constitucio­nal e “será cumprido”.

“O decreto da graça e do indulto é constitucional e será cumprido. No passado solta­vam bandidos, ninguém falava nada. Hoje eu solto inocentes”, disse o presidente com sua em­páfia característica. Os partidos Rede Sustentabilidade, PDT e Cidadania e o senador Renan Calheiros (MDB-AL) ingressa­ram com ações no STF pedindo a suspensão do decreto.

No Congresso, deputados do PSOL e os senadores Ales­sandro Contarato (PT-SE), Re­nan Calheiros e Randolfe Ro­drigues (Rede-AP) anunciaram projetos de decretos legislativos para anular o ato. O presidente também ameaçou não cumprir eventual decisão do STF sobre o marco temporal para demar­cação de terras indígenas.

A tese defendida por ruralis­tas e por Bolsonaro é que os indí­genas só têm direito às terras que ocupavam até a data da promul­gação da Constituição de 1988. O relator do caso, Edson Fachin, votou contra. “Se ele conseguir vi­tória nisso me restam duas coisas: entregar a chave para o Supremo ou falar que não vou cumprir. Não tenho alternativa”, disse.

Em sua visita à Agrishow, Bolsonaro também não anun­ciou os recursos para o Plano Sa­fra deste ano. O programa foi ins­tituído em 2003 para fomentar a produção rural brasileira. Todos os anos, o governo federal desti­na verbas para investimento ou para custeio, industrialização e comercialização dos produtos agrícolas. Trata-se do maior in­centivo financeiro para a área, no contexto nacional.

Motociata
Bolsonaro chegou a Ribei­rão Preto por volta de oito ho­ras da manhã, de avião. No Ae­roporto Estadual Doutor Leite Lopes, um grupo de apoiadores esperava o presidente para uma motociata. A concentração dos apoiadores ocorreu na avenida Thomaz Alberto Whatelly. De lá, eles seguiram pelas rodovias Anhanguera (SSP-330) e Pre­feito Antônio Duarte Nogueira (SP-322), no Anel Viário Sul, até o recinto da Agrishow. Re­tornou a Brasília no começo da tarde desta segunda-feira (25).

Firme na estratégia de alavan­car pré-candidaturas governistas Brasil afora, Bolsonaro trouxe a tiracolo para Ribeirão Preto dois ex-ministros: Tarcísio de Freitas (Republicanos), antigo titular da Infraestrutura e pré-candidato ao governo de São Paulo, e Walter Braga Netto (PL), que deixou a Defesa e está alocado como as­sessor da Presidência para ser o candidato a vice do chefe do Exe­cutivo na busca pela reeleição. Ao lado do ex-ministro do meio Ambiente, Ricardo Salles, eles passearam a cavalo pela feira.

ABI denuncia Jair Bolsonaro à ONU
Além da reação de partidos, entidades da sociedade civil também se mobilizam contra o decreto do presidente Jair Bolsonaro (PL) que beneficiou o deputado Daniel Silveira (PTB) – condenado a oito anos e nove meses pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por ataques à democracia, à Constituição e a instituições.

A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) encaminhou um “informe urgente sobre violação de Direitos Humanos” à Orga­nização das Nações Unidas (ONU). O texto afirma que o perdão concedido por Bolsonaro ao parlamentar “afronta a demo­cracia, a separação de Poderes, a independência do Judiciário e a administração da Justiça”.

O documento, elaborado pelo advogado Carlos Nicodemos, foi enviado ao relator especial da ONU sobre Independência de Juízes e Advogados, Diego García-Sayán. Uma reunião com o relator e outras entidades da sociedade civil também foi solicitada, afirmou o presidente da associação, Paulo Jeronimo. A ABI espera que o órgão inter­nacional se “posicione sobre as violações ocorridas com uma nota pública”.

A Justiça Federal do Rio de Ja­neiro deu 72 horas para a União explicar o perdão concedido pelo presidente Jair Bolsonaro a Daniel Silveira. O juiz federal substituto Carlos Ferreira de Aguiar respondeu a uma ação popular assinada pelos advoga­dos André Luiz Figueira Cardoso e Rodolfo Roberto Prando.

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