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SEGURANÇA – Os riscos de pedalar

ALFREDO RISK

Por: Adalberto Luque

A história de Sérgio Buo­narotti não foi a primeira. Mas foi das mais marcantes para quem pratica ciclismo em Ri­beirão Preto. Em uma manhã de agosto de 2011, ele pedalava com um grupo de amigos no Anel Viário Sul (Rodovia An­tônio Duarte Nogueira), quan­do oito assaltantes armados pararam o grupo. Ninguém reagiu. Um dos ciclistas con­seguiu fugir. Outro entregou a bicicleta e Sérgio caiu no chão. Ele havia sido atingido por um tiro e foi levado com urgência para a Unidade de Emergência do Hospital das Clínicas (HC). Ficou três meses em coma.

Nesse período, passou por 64 cirurgias – 63 delas feitas no próprio HC. Perdeu um dos rins, o baço e parte do estô­mago. Quando saiu do coma, lutou e conseguiu voltar a praticar esportes. Contrarian­do as previsões, finalizou um Ironman – prova de triathlon que consiste em 3.800m de natação, 180km de ciclismo e 42km de corrida de rua).

A luta de Serginho se trans­formou em exemplo de supe­ração. A história foi contada no documentário “1538º – The Iron Human”, produzido pelos jornalistas Lucas Bretas e Sa­muel Prisco. Mas Sérgio não foi o último a passar por isso.

Pablo chegou a pensar que seria assaltado por motoqueiro que pediu informação

Crescimento de crimes na pandemia
Com o isolamento social adotado no início da pande­mia de covid-19, o ciclismo cresceu exponencialmente, a ponto de haver fila de espera para comprar uma bicicleta nova nas revendedoras.

Isso, todavia, despertou o in­teresse de criminosos, que viram no aumento do número de bici­cletas circulando a possibilidade de praticar assaltos e abastecer o mercado de peças e até de bikes revendidas a quem não se preo­cupa com procedência.

O prazer de praticar uma atividade física, seja sozinho ou em grupo, foi substituído pela cautela, medo e gerou pânico em ciclistas que foram alvo de marginais. O Tribuna Ribeirão ouviu o drama de alguns ciclis­tas que entraram nas estatísticas como vítimas ou que passaram verdadeiros sufocos.

Ciclovia da Via Norte
Pablo pedala há quase um ano. Optou pelo ciclismo para ter uma atividade física e ter o prazer de estar com os amigos para, quase sempre, “tomar uma gelada no final”. Nunca foi assaltado durante o pedal, mas isso não significa que não tenha medo.

“Sempre tenho medo de pe­dalar em Ribeirão, um dos mo­tivos que nunca pedalo sozinho. Até às vezes dá vontade, mas o medo fala mais alto. Já tive e te­nho medo de pedalar, por ouvir, em várias regiões, pessoas falan­do de roubo. Cheguei a desistir de um pedal com amigos na ci­clovia da Via Norte”, revela.

Ele lembra de um pedal que fazia com amigos no Recreio Anhanguera há cerca de um mês. Estavam em quatro, quan­do uma moto com duas pessoas se aproximou em uma rua erma. Todos acharam que seriam as­saltados. “Graças a Deus eles só queriam informação sobre uma quadra de esportes”.

Tiros para o alto
Para Serginho, porém, a situação, além de dramática, não teve desfecho feliz. No dia 06 de dezembro, ele fazia um pedal com outras quatro pes­soas – uma delas, seu filho de 14 anos. O grupo seguia pela terra entre Sertãozinho e Du­mont, numa trilha que começa a cerca de 1,5 km do pedágio.

Os criminosos estavam escondidos em um arbusto e, quando os ciclistas se aproxi­maram, saíram e anunciaram o assalto. A ação foi extrema­mente violenta.

Paulo Henrique, o Paty, alerta que existem vários pontos perigosos, seja no asfalto ou na terra

“Saíram atirando para o alto, xingando e repetindo a palavra ‘perdeu’. Um amigo foi agredido com um chute na boca, cortou o lábio. Minha maior aflição foi quando vi ele apontando a arma para a cabeça do meu filho e fa­zendo ameaças”, lamenta.

Além dos momentos de terror, com todos achando que fossem morrer, o grupo amar­gou o prejuízo. Levaram bikes, celulares, alianças, enfim, o que julgaram ser de valor. Um grande prejuízo.

Apesar disso, a paixão pelo ciclismo falou mais alto. De­pois de um mês, ele voltou a pedalar, mas andando em tur­mas maiores. Os amigos ras­trearam seus celulares e apon­taram que estavam na região do Jardim Progresso. Informa­ram à polícia, mas até agora nada foi recuperado.

Ribeirão é a 20ª no ranking de roubos de bike
Ribeirão Preto ocupa a 20ª posição num ranking nada louvável: o de número de rou­bos de bicicleta. Através do site www.bicicletasroubadas.com.br é possível registrar os dados de uma bike roubada para, ao me­nos, impedir que ela seja reven­dida. É neste site que Ribeirão ocupa a posição nada honrosa, à frente de várias capitais.

Uma saída para se pedalar com mais segurança é em gru­po. Vários deles foram criados e reúnem dezenas, até centenas de praticantes. Durante a semana, vários pedais noturnos podem ser vistos pelas ruas da cidade. O fato é que dificilmente há re­gistros de assaltos a ciclistas em grandes grupos.

Mas aí existe outro risco. Com o fim do isolamento social, muita gente desistiu de pedalar, mas segue nos grupos formados em aplicativos de mensagens, como o WhatsApp.

“Acho que os aplicativos ajudam bem os caras acharem bikes para roubar. Muita foto e trajeto. Tem que ensinar o pes­soal a deixar os pedais restritos a quem você tem na lista. Estava num grupo que pedalava. Tinha mais de 100 pessoas no grupo e só 10 iam aos pedais. O resto fi­cava vendo foto, trajeto, horário de saída, ponto de encontro. E quando o pedal acaba, cada um posta seu mapa, dá pra saber aonde a pessoa vai passar”, sa­lienta o ciclista Evandro.

Ele não posta nada e evita grupos onde há muitos partici­pantes e poucos praticantes.

Outro que também desistiu das postagens foi Kiko. Hoje ele tem um aplicativo solo, ne­nhum seguidor. Tomou essa medida depois de passar mo­mentos de terror no dia 5 de fevereiro deste ano.

Estava com outras quatro pessoas, entre elas seu irmão. Vinham de Cravinhos para Ribeirão, passando ao largo de Bonfim Paulista, próximo ao Pesqueiro Paineiras. Um homem pulou na sua frente a menos de um metro de onde pedalava. Os três que iam à frente foram rendidos. Os ou­tros dois vinham mais atrás e pararam. Kiko ficou quase todo o tempo com uma arma apontada para a cabeça. Um dos assaltantes foi até os dois amigos que haviam parado e pegou as bicicletas, celulares, alianças e mandaram que en­trassem na mata e não saíssem.

Serginho ficou em pânico ao ver o filho ameaçado por uma arma de fogo

“Estavam com uma cami­nhonete e pelo menos duas motos. Colocaram três bikes na caminhonete e levaram duas numa das motos. Levei um chute na costela e manda­ram ir para o meio da mata, só sair quando estivessem longe. Pareceu durar meia hora. Um amigo disse que foi dois minu­tos”, revelou. “Não importa o tempo, o terror é imenso”.

Kiko voltou a pedalar, mas não sai mais por Ribeirão. Ele e os amigos colocam as bikes nos carros e vão a cidades mais distantes, onde não há regis­tros de roubo de ciclistas.

Paulo Henrique, conheci­do como Paty adora pedalar na terra. Sempre com amigos. Mas sente muito medo. E, assim como Kiko, ele procura pedalar mais longe de Ribeirão Preto. Conheceu vários ciclistas que foram assaltados e acredita que, pedalar em grupo em outras ci­dades diminui os riscos.

“Temos vários pontos ne­vrálgicos, seja no asfalto, seja na terra. Avenida Adelmo Perdizza, trilha do Zé Goleiro, Anel Viário próximo ao Jardim Progresso, Via Norte. Até no Castelinho, rumo a Cravinhos ficou perigoso”, avalia.

Sozinho ou em grupo, o ide­al é ter cautela. Não reagir aos as­saltos, registrar boletim de ocor­rência, evitar locais divulgados como perigosos são algumas das dicas para um bom pedal. Se possível, sempre em grupos mais numerosos. “Tem ainda que pegar quem compra pe­ças, senão não adianta muito, afinal é muito menor de idade roubando”, conclui Evandro.

Roubos registrados pela PM
Segundo a Polícia Militar, de novembro de 2021 a março de 2022, 17 bicicletas foram roubadas somente na área do 51º Batalhão da PM, que patrulha as Zonas Sul, Oeste e Centro de Ribeirão Preto e algumas cidades vizinhas. Em nota, a PM afirma que 14 delas foram recuperadas, seis delas foram somente em março. Em três destas recuperações, houve flagrantes. Ainda segun­do a PM, somente em março foram 17 prisões de pessoas responsabilizadas por roubo a ciclistas.

PM diz que realiza policiamento ostensivo
Em nota, a Polícia Militar esclarece que executa diu­turnamente o policiamento ostensivo e preventivo em toda a cidade de Ribeirão Preto de forma proativa e também prevenir os delitos nos bairros Jardim Progresso, Manoel Pen­na, Adelmo Perdizza, Via Norte, Av. Henri Nestlé e Rodovia Antônio Machado Sant’Anna.

“Cumpre destacar que a exe­cução é realizada por meio do policiamento estratégico, que elenca locais, horários, dias da semana, ‘modus operandi’, dentre outros fatores, de maior incidência criminal”, diz a nota.

A PM também traz algumas dicas: “evite levar celulares, relógios, joias (corretes, pin­gentes, pulseiras etc.); quando estiver em via pública, lembre­-se sempre de levar somente o necessário e não manuseie dinheiro em público; com sua bicicleta: evite andar sozi­nho em lugares desertos, se possível, esteja com amigos, caso precise deixá-la sozinha, use cadeados ou trancas, mesmo que seja só por alguns instantes; em caso de furto ou roubo, ligue para a polícia e forneça todos os dados e as características do bem”. A nota conclui com a mais importante dica: “nunca reaja”.

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