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POUCO EFETIVO: Investigações criminais estão comprometidas na região

ALFREDO RISK

Por Adalberto Luque

“Infelizmente hoje, pela falta de investigadores e pela quantidade de casos, temos que escolher qual crime va­mos investigar. É impossível fazer um bom trabalho e dar uma resposta às vítimas”. O desabafo é de um investigador que está há mais de duas dé­cadas na Polícia Civil, quase todo este tempo atuando em Ribeirão Preto, mas que pre­feriu não se identificar.

A afirmação pode ser constatada, inclusive pelos índices de criminalidade di­vulgados mensalmente pela Secretaria de Segurança Pú­blica do Estado de São Paulo (SSP/SP). Um dos índices que mais subiram foi o que baliza os casos de furtos e roubos de veículos na cidade.

Durante todo o ano de 2021, segundo números da SSP, foram furtados ou rou­bados 2.115 veículos, contra 1.506 em 2020, um aumento de 40,5% dos casos. Só em de­zembro do ano passado foram 223 furtos registrados, um nú­mero 83% superior ao mesmo período de 2020.

Apenas 30% foram recu­perados. “A Polícia Civil não investiga porque não tem gen­te. Antes tínhamos até equipe especializada, a de Patrimônio na DIG. Hoje só se recupe­ra um carro se tiver um bom rastreador ou se a Polícia Mi­litar trombar com ele nas ruas. Não tem investigador”, dispa­ra o presidente do Sindicato dos Policiais Civis (Sinpol), Célio Antônio Santiago.

Célio Antônio Santiago, presidente do Sinpol: “A Polícia Civil não investiga simplesmente porque não tem gente” – FOTO: HUGO LUQUE

Célio explica que o gover­no alega não ter dinheiro para criar novas vagas. Mas ele aponta que essas vagas exis­tem. São policiais civis que se aposentaram, faleceram ou se desligaram da instituição, mas não foram repostas. “Antes, no começo da década de 1990, tínhamos quase 45 mil poli­ciais civis no Estado. Hoje não temos 20 mil na ativa”, aponta.

Conta não fecha
Num levantamento feito pelo Sinpol, entre janeiro de 2020 até março de 2022, apo­sentaram-se 65 policiais civis somente na área da Seccional de Ribeirão Preto, composta por 14 cidades. A SSP nomeou somente 33 policiais civis nes­te período. Praticamente 50% das vagas abertas nestes últi­mos dois anos deixaram de ser preenchidas.

Aposentaram-se 12 dele­gados, mas apenas quatro vie­ram para as vagas. Saíram 26 investigadores e somente 13 chegaram. No caso de carce­reiros, a situação é mais preo­cupante, pois 10 se aposenta­ram, mas como a carreira de carcereiro foi extinta, não veio nenhum para Ribeirão Preto.

No entanto, a região tem cadeias administradas pela Polícia Civil, como Santa Rosa de Viterbo. O ideal seria que a Secretaria de Administração Penitenciária (SAP) assumis­se todas as carceragens, pois em Santa Rosa, por exemplo, estão todos os carcereiros da Seccional. Ao se aposentarem, sem reposição.

“A conta não fecha. Se não houver contratação em núme­ro suficiente, não só a investi­gação vai parar por completo, mas a Polícia Civil vai fechar as portas”, prevê Célio.

700 inquéritos por escrivão
Para a escrivã recém-apo­sentada e diretora do Sinpol, Fátima Aparecida Silva, a si­tuação é bastante crítica. Ela trabalhou por vários anos no plantão, até o início des­te ano, quando finalmente se aposentou.

A escrivã Fátima revela que cada escrivão tem, em média, 700 inquéritos simultâneos – FOTO: ALFREDO RISK

Fátima acredita que o quadro esteja caminhando para uma situação irrever­sível. Ela explica que cada escrivão tem sob sua res­ponsabilidade cerca de 700 inquéritos. Alguns escrivães chegam a ter até 1.000. Esses inquéritos têm que ser rela­tados para encaminhamento às varas criminais.

Além do prazo ser dimi­nuto diante de tamanha quan­tidade de inquéritos, muitas vezes, por inconsistência em sua elaboração ou até mesmo na investigação, acaba sendo devolvido. Perde-se prazo, protela tudo e nada de resol­ver a situação das vítimas, que acabam vivendo uma eterna angústia pela falta de efetivo.

A matemática tem sido cruel. “Diariamente entram, só na CPJ que é o plantão per­manente, entre 20 e 30 novos registros. E todos os dias es­ses boletins de ocorrência são distribuídos para os DPs, acu­mulando ainda mais trabalho para a investigação”, explica.

O problema começa jus­tamente aí. Com a distribui­ção, surgem a cada dia mais casos para serem investiga­dos. Mas o Sinpol fez um le­vantamento junto ao prédio onde funcionam, de forma unificada, os oito DPs da ci­dade, localizado na avenida Independência. Trabalhan­do nos oito DPs estão so­mente 10 investigadores.

80% de casos eram escla­recidos
“No final da década de 1990, tínhamos 10 investiga­dores somente no 8º DP. Hoje são 10 para todos os DPs. Na época das investigações, tí­nhamos 10 boletins de ocor­rência por equipe, éramos em três equipes. O índice de esclarecimento era de 80%. Porque estávamos na rua, in­vestigando, recebendo infor­mações. Hoje o esclarecimen­to não chega a 20% dos casos porque não tem gente para investigar”, lamenta Célio.

Reflexo da falta de investi­gadores, isso se agrava com a falta de delegados e de escri­vães e tem favorecido, inclusi­ve, o acúmulo de função. Não é incomum encontrar delega­cias onde o agente policial, o auxiliar de papiloscopista, ou o carcereiro, façam o trabalho do investigador – sem receber nada a mais por isso.

Além disso, faltam delega­dos. De acordo com o sindica­to, em Ribeirão Preto o 1º, o 4º e o 7º DPs, além da DIJU e do NECRIM estão sem delegado. Em nenhum DP da cidade, há sequer delegado assistente.

Nas 14 cidades que inte­gram a Seccional de Ribeirão Preto, oito não têm delegado. Pior: várias cidades estão sem escrivão. Algumas não têm investigador. Diante disso, foi criada pela Sec­cional uma nova CPJ, para os flagrantes da região. Fica em Santa Rosa de Viterbo. E, quando esta segunda CPJ está fechada, aos finais de semana e durante a noi­te, os casos seguem para Ri­beirão Preto.

No caso de um flagrante, dependendo da complexi­dade, pode levar horas para o trabalho ser concluído. E quando o flagrante é atendi­do pela PM, viatura e poli­ciais ficam à disposição du­rante elaboração do boletim e saem das ruas. Se for uma viatura de Santo Antônio da Alegria, por exemplo, a cida­de acaba ficando desguarne­cida, porque a equipe vem para Ribeirão Preto, roda mais de 100 quilômetros, gasta combustível e deixa a cidade sem policiamento.

Sem efeito
Por muitos anos, havia um planejamento, onde uma resolução norteava o núme­ro necessário de policiais civis por unidade. A Reso­lução SSP 105, de 2013, foi a última emitida. Na gestão de Geraldo Alckmin, em 2016, um magistrado de Leme de­terminou a contratação ime­diata de policiais civis para suprir o número expresso em tal portaria, mediante multa por descumprimento.

Ao invés de contratar, Al­ckmin tornou sem efeito essa resolução. Desde então, não há um número específico para cada unidade, o que dá um certo conforto ao governo.

Se fosse cumprir essa de­terminação de 2013, os DPs de primeira classe, 1º, 2º, 3º, 4º e 8º deveriam ter oito investi­gadores cada. Hoje os oito têm, como já citado, 10 no total. Pela mesma resolução, a DIG e a DISE deveriam ter, juntas, 14 investigadores. Em 2020, quando a Divisão Espe­cial de Investigações Crimi­nais (DEIC) foi criada, juntos eram 26 investigadores. Ape­nas dois anos depois, as duas especializadas têm 10 investi­gadores no total, segundo le­
vantamento feito pelo Sinpol.

Concurso
Recentemente o governo divulgou a realização de dois concursos. Mas de quase 3 mil vagas, virão para o Deinter-3, que reúne 93 ci­dades da região de Ribeirão Preto, apenas 54 investiga­dores e 96 escrivães. Insufi­cientes para essa demanda. De acordo com o Sinpol, são necessários somente na Seccional de Ribeirão Preto 300 escrivães, 250 investi­gadores e 70 delegados.

O que diz o Deinter-3
O diretor em exercício do Deinter-3, delegado Marcus Camargo de Lacerda, preferiu se pronunciar através de nota enviada ao Tribuna Ribeirão. Confira:

“Em resposta à solicitação de V. Sa. informo que, as atividades de polícia judiciária (investigação criminal) no âmbito do Departamento (Deinter-3 de Ribeirão Preto) não vêm sofrendo prejuízos uma vez que várias medidas administrativas foram adotadas para melhor distribuição do efetivo e do serviço policial, como exemplo a concentração de unidades policiais em único local, implementação das centrais de Polícia Judiciária e de flagrantes nas Seccionais, instalação de unidade especializa­da (DEIC), delegacia eletrônica etc.

Demonstração da eficiência das atividades de investigação criminal são as constantes operações realiza­das pelas Delegacias Seccionais da região e da DEIC, conforme se vê das notícias amplamente divulgadas pelos órgãos de imprensa.

Mesmo assim, com vistas ao efetivo policial, há concursos públicos para contratação de mais polícias civis em andamento, com vagas específicas para as unidades do departamento (escrivães, investigadores e médicos legistas), afora concurso para delegados de polícia.

Importante destacar, os avanços tecnológicos com implemento de novas ferramentas para a investiga­ção foram disponibilizados à toda Polícia Civil do Estado, propiciando o emprego de técnicas de inteligên­cia para elucidação dos crimes e descoberta de autoria, o que otimiza os trabalhos sem necessidade de grandes quantidades de contingentes; dando mais qualidade e eficiência aos serviços.

Nesse aspecto, de se destacar que inúmeros cursos estão sendo disponibilizados para treinamento do efetivo existente, visando contínua melhora dos trabalhos policiais em prol da comunidade”.

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