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A gerência espiritual e a CLT

Foi matéria de disputa jurisprudencial, na área da Justiça do Trabalho, durante largo tempo, definir se pastor ou padre ou qualquer outro intermediário, entre o humano e o divino, é protegido pela lei trabalhista.

O trabalho jurídico de Roberto Garcia, veiculado no Miga­lhas, no dia 10 de maio de 2018, é densamente rico na revelação dessa matéria, em razão da qual se baseia esse mero destaque.

Uma premissa para tal análise é a distinção entre o obreiro que se dedica à propagação da fé daquele que pratica atos especí­ficos de um empregado de organização empresarial. Tal diferen­ça já sugere que atos de natureza mercantis sejam executados por terceiros contratados, que nada tenham com o ofício da fé.

A preparação do “gerente espiritual” além da divulgação da bíblia e do que possa enriquecê-la mediante à teologia e a filosofia, em regra ministrados em cursos universitários, inspira claramente a divisão entre o que é material e imaterial, entre a finitude do ter e a imagem e semelhança do ser, na perspectiva do infinito.

É um pacto claríssimo entre o humano e o divino, interme­diado por um ser marcado pela vulnerabilidade do comum na natureza humana, seja pastor, padre, ou qualquer outra pessoa de qualquer confissão ou crença que exerça essa função nobre, que magnetiza frequentemente tantas pessoas.

Mas, coube à Justiça do Trabalho, na procura de se saber do eventual vínculo empregatício, procurar e identificar a relação empresa-empregado, no seio do trabalho espiritual que não é só espiritual. E, aí define um desvio de finalidade que chega, formida­velmente, a natureza de organização empresarial, que em si, como empresa, tem função social, mas tem uma finalidade de lucro.

O lucro, no caso, do desvio de finalidade existencial da igreja, torna-se extravagantemente imperativo, já que a contraposição entre o espiritual e o não espiritual, atinge às vezes o padrão do inacreditável.

Mas, a percuciência no campo do direito, no exame do fato, e o contrato de trabalho, que é um contrato eminentemente de fato, fez com que a Justiça do Trabalho, para decidir, em nível de última instância, ou seja, o Tribunal Superior do Trabalho, elencasse as atividades executadas, dentre outras, pelo “gerente espiritual”, que as qualificam como empregado protegido pela lei trabalhista, a saber:

“a) os pastores precisavam estar presentes a reuniões habitu­ais, em que eram doutrinados, treinados para as campanhas de arrecadação de receitas; b) havia horário diário definido para o exercício desse trabalho, sujeito a fiscalização e com folga semanal; c) os depoimentos revelaram a vinculação à (Igreja) Central onde ocorriam reuniões periódicas, com definição de diretrizes a serem seguidas, e para onde o autor deveria se reportar caso houvesse al­gum problema administrativo; d) trabalho de natureza não eventual, destinado ao atendimento das necessidades da instituição, consistia na gerenciamento da igreja, e na participação obrigatória em cultos e programas de rádio e televisão, cujo fim não era a divulgação da ideologia da instituição religiosa, mas sim de arrecadação de dinheiro, servindo a religião de meio de convencimento dos fiéis; e e) os pastores trabalhavam, na verdade, pela remuneração mensal, como vendedores da ideologia religiosa da entidade, com obrigação de atingir quotas obrigatórias de venda de revistas e jornais com subordinação a metas de arrecadação, sob pena de despedida”.

Portanto, se o obreiro se dedicar somente à propagação da fé, ele não é empregado, mas se estiver vinculado a uma igreja que o obrigue ao desvio de função, equiparando-se a uma or­ganização empresarial, empregado ele o será, protegido pela Consolidação das Leis Trabalhistas.

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