Fabiano Ribeiro
Quem passa pela avenida Saudade, na altura do número 200, verá um cenário de demolição e uma resistente igrejinha. Construída no século XIX, entre os anos de 1892 e 1898, e fundada em 13 de junho de 1903, pelo Padre Euclides Carneiro, a Igreja Santo Antônio, Pão dos Pobres ou a Santo Antoninho, como é conhecida, é um dos monumentos mais antigos da cidade – é a mais antiga igreja, em pé, de Ribeirão Preto.
Visivelmente, o prédio pede socorro e restauro para manter viva parte da história da cidade. Mas o tombamento do edifício, necessário para essa proteção histórica e cultural, pode ser também uma dificuldade nesse processo, que se arrasta há anos.
Prova disso é que o edifício ao lado da Igreja, a Casa da Amizade, que foi sede da Academia Ribeirão-pretana de Letras Jurídicas, fundada pelo escritor, jornalista, advogado e historiador Rubem Cione, que morreu em 2007, aos 89 anos, e que também era tombado, hoje não existe mais. Depois de um incêndio em 2019, sua estrutura foi comprometida. Recentemente foi demolida irregularmente.

Defensor do restauro, o padre Gilberto Kasper disse que o prédio sofre problemas e sérios riscos estruturais. Reitor da Igreja desde 2008, Kasper sonha em transformar o local em um espaço cultural ecumênico de espiritualidade. Mas se diz “muito cansado, pois são muitos anos de promessas não cumpridas”.
Tombamento
A Igreja de Santo Antoninho e a Casa da Amizade foram tombadas pelo Conselho de Preservação do Patrimônio Cultural – CONPPAC, em 2009. Kasper diz que nunca foi comunicado e que o tombamento foi provisório.
“Fiquei sabendo do tombamento por acaso numa reunião de casais. Comecei, então, a procurar o CONPPAC e participei de incontáveis reuniões, seja na Casa da Cultura, seja na própria Igreja”, lembra Kasper alegando que as tentativas foram infrutíferas.
“A estrutura da igreja precisa de reformas. O engenheiro José Roberto Romero já levantou o que precisa ser reformado ou reparado nas paredes, como rachaduras e infiltrações. Nossa preocupação é o destino do terreno onde era a Casa da Amizade [demolido]: o que construirão lá? Dependendo da construção, as estruturas da Igreja ficarão comprometidas?”, indaga o padre.
Articulista do Tribuna Ribeirão, o padre escreveu três artigos em fevereiro passado, nos quais conta o imbróglio, a burocracia, história e situação da Igreja e suas dificuldades.
“Faz 14 anos que tento, sem êxito, restaurar a Igreja Santo Antoninho. Hoje o cenário e o paisagismo visto de todos os lados do Templo são deprimentes. Não tenho a pretensão de transferir responsabilidades. Porém, a burocracia e certa dificuldade de mais sérias políticas públicas, em nada contribuiu para que as obras da Santo Antoninho, roubada 24 vezes nesses 14 anos, se concretizassem”, diz Kasper em uma das partes no primeiro da série de três artigos publicados no Tribuna Ribeirão, que podem ser acessados na íntegra pelo www. tribunaribeirao.com.br.
“Penso que se a Igreja fosse destombada, já que a Casa da Amizade sumiu, poderíamos colocar nosso projeto de restauro em prática”, finaliza Kasper.
Procurado pela reportagem do Tribuna Ribeirão, o engenheiro José Roberto Romero disse que um projeto de restauro foi enviado para análise do CONPPAC, “porém sem retorno do que é possível ou não de restauração”. “Em reunião com nosso grupo técnico concluímos que também aceitamos um projeto do CONPACC, para restauração, após análise técnica e econômica”.
Ministério Público denunciou abandono em 2018
Em fevereiro de 2018, portanto antes do incêndio, o promotor do Meio Ambiente, Ramos Lopes Neto, apresentou uma Ação Civil Pública questionando na Justiça a falta de manutenção nos prédios da Casa da Amizade e Igreja Santo Antoninho.
Denunciou ainda que a prefeitura era omissa no dever constitucional de preservar o patrimônio cultural local, além de não ter procedido ao tombamento definitivo do imóvel e que a situação não poderia continuar, pois implicaria no agravamento da degradação de importante patrimônio histórico e cultural de Ribeirão Preto.
O padre Gilberto Kasper diz que a Arquidiocese de Ribeirão Preto se defendeu no referido processo. “A igreja está aberta e realiza trabalhos com a população. Eles cobram intervenções nas edificações, mas o tombamento provisório me impede”, alega, apontando incoerência.
Prefeitura
Questionada sobre o assunto a prefeitura de Ribeirão Preto comunicou por meio de sua assessoria que “a Secretaria de Infraestrutura informa que o local é uma área particular. Informa ainda que já implantou medidas protetivas, porém para demais restauros e obras cabe [sic] ao proprietário a execução”.
Presidente do CONPPAC revela que todo o quarteirão está embargado na Justiça
Procurado pelo Tribuna Ribeirão, o presidente do Conselho de Preservação do Patrimônio Cultural – CONPPAC, o arquiteto Cláudio Bauso, disse que o prédio da Igreja de Santo Antoninho está tombado no órgão desde 2012.
Bauso disse ainda que a demolição na Casa da Amizade, que foi a sede da Academia Ribeirão-pretana de Letras, foi criminosa. “Não houve autorização da prefeitura e nem do CONPPAC”. Mas, responsabiliza a prefeitura por falta de fiscalização e omissão.
Bauso afirmou ainda que na última semana foi notificado pela Justiça que o quarteirão inteiro, onde está localizada a igreja, está embargado para obras. “Não é só o tombamento da Casa e da Igreja. Os prédios vizinhos estão em área de ambiência e não poderiam ser demolidos. Uma juíza viu a situação, abriu inquérito e pediu informações ao CONPPAC. A Secretaria da Cultura foi notificada pelo CONPPAC dessa decisão de embargo. Nada pode ser feito lá”, ressaltou.
Ao ser indagado sobre sua posição quanto ao restauro, o presidente diz que é favorável. “Lógico que o CONPPAC é favorável ao restauro, para proteger e cessar qualquer tipo de degradação que o edifício possa estar sofrendo… mas até essa data não houve nenhum projeto, solicitação ou contato, nem por telefone, com o Conselho”. Quanto a possíveis riscos estruturais do prédio, Bauso disse que isso depende de um laudo de engenheiros e que o CONPPAC não presta esse tipo de serviço.