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Almanaque do biotônico

Os dias varavam a metade do século XX e a Segunda Grande Guerra já estava terminando. Poucos automóveis e caminhões rodavam pelas ruas que, na verdade, eram quase todas ocupadas por carroças puxadas por cavalos, que semanalmente eram levados pelos seus donos para tomar banho no córrego da estação, num local conhecido como “lavador”. A molecada fugia das aulas e usava o “lavador” para seus mergulhos.

O automóvel mais famoso da cidade era o carro da polícia que pintado de preto e branco era batizado como “pinguim”. Não era tocado a gasolina, mas, sim, por gasogênio, tendo em conta a quase total ausência de gasolina no Brasil, sofrendo ainda a consequência da Segunda Grande Guerra.

Muitos homens, mulheres e crianças caminhavam pelas ruas sem sapato, pisando nos restos das urinas dos cavalos, contraindo doen­ças como o mijacão. O mijacão era tratado pelo farmacêutico Princivalli que receitava para sua cura a “pomada de basilicão”. Muitos anos mais tarde a população descobriu que a pomada era assim preparada com o “manjericão”, tempero das pizzas: basilicão era e é o manjericão.

Outra gravíssima doença da época era a poliomielite, conhecida usualmente como “paralisia infantil” que atacava as crianças ou matando-as ou tornando-as aleijadas. A poliomielite atingia um número enorme e desconhecido de crianças fossem elas brasileiras ou estrangeiras.

Naqueles remotos dias foi lançado o almanaque Biotônico Fontoura que era distribuído gratuitamente nas farmácias. Nele o grande escritor Monteiro Lobato, com seus textos, lutou no sentido de se dar sapatos aos brasileiros. Os brasileiros não podiam andar descalços, segundo ele. Monteiro Lobato era então atacado pelas boas famílias, acusado de estar ligado às ideologias políticas criminosas.

Surgiu um sapato baratíssimo chamado “kedis”. A sola era feita de um recorte de pneu. Baratíssimo. Quase toda a população passou a usar o sapato e o mijacão sumiu. Mesmo assim o grande escritor Monteiro Lobato foi preso por defender a existência de petróleo sob o solo brasileiro. Hoje o Brasil é um dos maiores produtores de pe­tróleo do mundo. Monteiro Lobato, fazendeiro, promotor de Justiça, escritor, acima de tudo foi o grande profeta da Pátria.

A poliomielite ou “paralisia infantil” passou a ser atacada por vacinas que, como sempre, sofreram oposições absurdas. O Ro­tary Clube Internacional tomou a defesa da vacina e da vacinação, passando a trabalhar arduamente contra a propagação do mal e pela defesa das crianças por ele atingidas, levadas à morte, ou tornando­-as aleijadas. O trabalho foi desenvolvido internacionalmente.

Desnecessário acrescentar que o grande trabalho realizado pelo advogado e também promotor de Justiça Monteiro Lobato em favor do uso de sapatos pelos brasileiros representou um grande passo para o nosso progresso.

No mesmo sentido, o projeto desenvolvido na época pelo Rotary Clube Internacional contra a paralisia infantil, foi muito critica­do por aqueles que não acreditavam na eficácia da vacinação.
No entanto, levou a doença ao seu desaparecimento em todo mundo. Enquanto no passado muitas eram as crianças mortas ou aleijadas pela poliomielite, nos dias de hoje raríssimas são aquelas atingidas por tão gravíssima doença.

O mundo real muitas vezes ou quase sempre é imperceptível pela visão do homem comum. Neste contexto, todos nós temos enorme necessidade daqueles profetas que, como Princivalli, Monteiro Lobato e os rotarianos viram o que até então não era enxergado.

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