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Causos musicais e desejo dos músicos

Como já escrevi diversas vezes, fazer música é como pintar um quadro, ninguém pode imaginar o que passa pela cabeça do artista quando ele está produzindo. O processo de criatividade é coisa divinal, a letra de uma música muitas vezes nos leva a várias maneiras de entendê-la. Vou comentar uma delas. “Saigon” é uma composição de Paulo Cesar Feital. Quando a ouvi pela primeira vez na voz de Emilio Santiago, adorei, passei a mão no violão, tirei a harmonia e de imediato a coloquei no meu repertório.

Sempre que a cantava, ficava imaginando o porquê de “Saigon”. Perguntava a mim mesmo: “será que ele quis contar a história de alguém que tinha uma namorada e um aparta­mento em Saigon?” Essa cidade foi palco da maior guerra, ainda diz que ela se despediu, dizendo adeus no espelho com batom. Tudo isso me deixava cabreiro.

Certa noite, assistindo uma entrevista com Paulo Cesar Feital, fiquei ligado quando Jô Soares lhe fez a pergunta que eu queria fazer: “Paulo Cesar, conte pra gente a história desse apartamento em Saigon”. O compositor, rindo, disse que pen­saram as mais diversas situações dessa letra.

Mas o fato é que ele tinha uma namorada e um apartamento na Praça Saigon, no Rio de Janeiro. Um belo dia, ao chegar de uma boemia, a moça tinha vazado e no espelho do banheiro um enorme adeus caprichosamente escrito com batom. “Ela só não contava que esse adeus iria resultar na minha melhor composição”.

Manias e desejos de artistas
Quando trabalhei na Secretaria da Cultura, a Feira do Livro contratava cantores famosos para atrair público, eles passavam pra gente o que queriam no camarim, e eu quando recebia os pedidos tinha que correr atrás, ficava incrédulo com o que lia. Vamos lá, alguns nomes.

Rita Lee, além do que é normal que se coloque no cama­rim, ela pediu 300 toalhas de rosto brancas e da mesma mar­ca. O bicho pegou porque saímos à compra e nenhuma loja tinha essa quantidade e marca, tivemos que mandar alguém em Sampa. Daí fiquei de olho no lance pra ver o que ela ia fazer com tantas toalhas: jogou-as para a plateia.

Jorge Ben Jor pediu uma cesta de frutas. Detalhe: foi difícil conseguir algumas porque não encontrava as da qualidade que ele queria. Chegou, passou a mão na cesta e levou pra van. Milton Nascimento, não pediu nada, tomou água e café que é normal ter em todos camarins.

Elba Ramalho pediu uma cesta de frutas, não tocou em nenhuma e nem deixou que alguém botasse a mão. Pensei que poderia ser uma oferenda. Luiz Melodia, uma noite no Teatro de Arena, não exigiu nada além do normal. Depois do show fui jantar com ele, que lamentou o estado em que se encontrava os bastidores do teatro.

E disse: “Bueno, é a segunda vez que canto neste palco e te digo de coração, ele tem a melhor acústica que já ouvi, parece um sonho, mas o camarim não oferece nenhum conforto, banheiro catinguento, chuveiro não tem, que pena!”

Ed Mota, esse foi demais. Pediu 24 latinhas de cervejas importadas, sendo duas de cada marca, pediu pra não gelar. Embora estranhássemos o pedido, saímos na captura, deu o maior trampo, algumas marcas só encontramos em Sampa.

Fiquei de tocaia, queria ver se o caboclo ia tomar cerveja quente. Quando ele entrou no camarim, foi logo perguntan­do pelas bichinhas. Em seguida passou a mão no pacote e mandou seu empresário levar até a van. Tempos depois numa entrevista o vi mostrando sua coleção de latinha de cerveja e vi no meio uma alemã que nos deu a maior mão de obra… O cara era colecionador, é mole?

Sexta conto mais, abreijos amigos.

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