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A brilhante Elis Regina

A Pimentinha é nada mais nada menos, que uma das maiores cantoras brasileiras, Elis Regina, que ganhou esse apelido de Vinícius de Moraes, alusi­vo provavelmente ao seu gênio forte e braveza.

Elis Regina só era Regina porque, em 1945, os cartórios de Porto Alegre se recusavam a batizar com nomes que poderiam servir tanto para homem quanto para mulher, exigindo um complemento menos andrógino.
Elis Regina nasceu na capital do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, onde começou a carreira como cantora aos onze anos de idade em um programa de rádio para crianças.

Em 1967, lançou “Dois na Bossa”, primeiro disco brasileiro a vender um milhão de cópias. Ela teve o maior cachê do show business. Elis Regina usou e abusou deste posto. Ela criticou muitas vezes a ditadura brasileira, nos difíceis Anos de Chumbo, quando muitos músicos foram perseguidos e exilados. A críti­ca tornava-se pública em meio às declarações ou nas canções que interpretava.

Elis Regina era uma grande pedra no sapato da ditadura. Este aspecto na história da Elis foi lembrado num trecho do “Falso Brilhante”, quando ela fica “presa” a uma barra e ajoelhada (como que sendo torturada) e canta “Agnus Sei” de maneira incisiva: “ah, como é difícil tornar-se herói / só quem tentou sabe como dói / vencer satã só com orações…” Satã era a ditadura. Vencê-la só com orações (representando as canções, livros, peças da época) não era tão fácil como poderiam imaginar aqueles que pegaram em armas e partiram para a clandestinidade.

O documento do Ministério do Exército, datado de 01.12.1971, com o assunto Elis Regina:
Procedidos os levantamentos necessários, constatou-se que:

– a cantora esteve na Holanda no início de 1969, ocasião em que concedeu entrevista coletiva à imprensa, em ambiente formal e seguindo as normas desse tipo de relacionamento;

– viajou para a Itália e Inglaterra no princípio de 1971, não tendo feito declarações à imprensa;

– no Brasil, jamais concedeu entrevista a qualquer órgão de imprensa estrangeiro;

– nos anos de 1966-1967 atuou ao lado de alguns cantores de esquerda considerados subversivos após as agitações de 1968, destacando-se, entre eles, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Geraldo Vandré e Edu Lobo.

Faziam parte do “Grupo Paulo Machado de Carvalho”, da TV Record, Canal 7, de São Paulo e da Rádio Jovem Pan. Na época, anos de 1966/67, esse grupo foi considerado de orientação filo-comunista;

– é muito afeita a gravar músicas de protesto, inclusive ligadas ao movi­mento do Poder Negro norte-americano, apesar de não demonstrar ligação com o mesmo;

– possui contrato firmado com a rede Globo de Televisão a terminar em 30/06/72 e com a gravadora PHILIPS com término em dezembro de 1973;

– atravessa, no momento, uma fase bastante difícil na sua vida parti­cular – o marido, o compositor e produtor de TV, Ronaldo Bôscoli, doente, necessitando de tratamento psiquiátrico; seu genitor tornou-se inimigo do marido, chegando ao ponto de ameaçar a vida do genro; certa imprensa, chamada “marrom”, tem noticiado calúnias sobre o seu comportamento, além de difundir assuntos de sua vida privada;

– mostra-se retraída, não participando de grupos, mesmo em festas ou reuniões sociais;
– cumpre seus contratos e compromissos corretamente, aceitando pro­gramas não remunerados, quando para fins filantrópicos, ou solicitados por órgãos públicos.

O documento mostra um pouco da perseguição absurda que os artistas sofriam na época, como se fossem criminosos.

Ironicamente, essa mesma Elis engajada e militante, foi massacrada pela imprensa de esquerda em 1972, após cantar o “Hino Nacional” num show nas Olimpíadas do Exército.

Elis participou de uma série de movimentos de renovação política e cultu­ral brasileira, com voz ativa da campanha pela Anistia de exilados brasileiros. O despertar de uma postura artística engajada e com excelente repercussão acompanharia toda a carreira, sendo enfatizada por interpretações consagra­das de “O bêbado e a equilibrista” (João Bosco e Aldir Blanc), a qual vibrava como o hino da anistia. A canção coroou a volta de personalidades brasileiras do exílio, a partir de 1979. Um deles, citado na canção, era o irmão do Henfil, o Betinho, importante sociólogo brasileiro.

Outra questão importante se refere ao direito dos músicos brasileiros, po­lêmica que Elis encabeçou, participando de muitas reuniões em Brasília. Além disso, foi presidente da Assim, Associação de Intérpretes e de Músicos.

Causando grande comoção nacional, faleceu aos 36 anos de idade em 19 de janeiro de 1982, devido a complicações decorrentes de uma overdose de cocaína, tranquilizantes e bebida alcoólica. Foi sepultada no Cemitério do Morumbi.

Salve Elis Regina, grande mulher engajada e intérprete maravilhosa, que ousou se posicionar contra o regime, em plenos anos de chumbo.

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