Não há pesquisas recentes sobre o número de dependentes químicos no Brasil. Em 2013 o Levantamento Nacional de Famílias dos Dependentes Químicos (Lenad Família), feito pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), mostrou que 28 milhões de pessoas no Brasil têm algum familiar que é dependente químico.
Há evidências que mostram que esses números tenham crescido na pandemia. De acordo com dados do Ministério da Saúde, os hospitais credenciados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) tiveram um aumento de 54% em 2020 no atendimento de dependentes químicos se compararmos a 2019.
A dependência química é uma doença multifatorial e que não está restrita a determinado grupo social, racial ou etário. Segundo o Ministério da Saúde, “as pessoas acometidas por esta doença têm garantido por lei o direito à assistência intersetorial, interdisciplinar e transversal, consentâneo às suas necessidades, o que implica em ter disponível uma rede de atenção psicossocial ampla, capaz de suprir as necessidades particulares de cada indivíduo, oferecendo-lhe o tratamento adequado”.
Mas nem sempre esse tratamento é ofertado e atende a demanda. É nessa hora que entram em ação clínicas particulares e entidades assistenciais. Uma delas, sem fins lucrativos, vinculação política ou religiosa, é a Caminho da Paz, que atende dependentes químicos, desde 2013 em Ribeirão Preto.
A entidade foi fundada pelo casal Isidoro Caldo Filho e Dora Salomão Caldo e consiste em ofertar gratuitamente, acolhimento para 52 pessoas do sexo masculino em ‘Comunidade Terapêutica’ e ‘Serviço de República’.
Comunidade Terapêutica
Localizada na Estrada Rural de Jardinópolis, é um serviço de acolhimento exclusivamente voluntário e transitório para dependentes químicos. O objetivo é promover a organização biopsicossocial do indivíduo, com garantia de direitos, qualidade de vida e autonomia.
Hoje a capacidade é de 30 vagas e todas gratuitas com período de até 180 dias de permanência conforme avalição e desenvolvimento individual do acolhido.
Serviço de República
Neste trabalho a Caminho da Paz oferece proteção, apoio e moradia subsidiada a homens adultos em processo de recuperação do uso de substâncias psicoativas. São pessoas com vínculos familiares rompidos ou extremamente fragilizados e sem condições de moradia.
O atendimento apoia a construção e o fortalecimento de vínculos comunitários, a integração e participação social e o desenvolvimento da autonomia das pessoas atendidas.
O público-alvo é de dependentes químicos do sexo masculino, maiores de 18 anos, que tenham concluído o processo de acolhimento em Comunidade Terapêutica, que no momento da alta não tenham residência fixa, em situação de rua e vínculos fragilizados ou inexistentes e que não apresente comorbidades psiquiátricas limitantes para o desenvolvimento de sua autonomia.
Hoje a República, localizada na rua Álvares Cabral, no Centro de Ribeirão Preto, tem 22 vagas gratuitas e com período de até 180 dias de permanência conforme avalição e desenvolvimento individual do acolhido.
A Associação Caminho da Paz realizou até o momento mais de 1000 acolhimentos de pessoas em situação de vulnerabilidade social. Atualmente a Instituição tem parcerias de convênios através do Programa Recomeço (SP) e com o SENAPRED (DF) que contribui com boa parte do orçamento para ofertar as vagas gratuitas à população de Ribeirão Preto e região.
Mais informações:
www.caminhodapaz.org e pelas redes sociais @ctcaminhodapaz
Prevenção ao uso abusivo de drogas
Um dos trabalhos da Associação Caminho da Paz é a realização de palestras sobre prevenção ao uso abusivo de drogas.
De acordo com Denis Munhol, coordenador técnico da Associação, diariamente vários trabalhadores são afastados do seu emprego em razão da dependência química e “isso acontece não apenas pela facilidade do acesso às substâncias, mas também pela falta de preparo das empresas para lidar com a dependência química”.
Denis explica que parte desse problema se deve aos tabus e à má-informação difundidas tanto sobre prevenção, quanto ao método de controle e combate ao abuso de drogas. “Uma informação importante, por exemplo, é que a dependência química normalmente não é provocada pela droga em si. Outras razões que existem por trás como transtornos psicológicos podem levar à compulsão do uso de substâncias e, por consequência, à dependência química”, diz.
Ele ressalta que a dependência química é uma doença incurável e que pode afetar diretamente as relações com o trabalho, com a família e demais círculos sociais. “Se não tratada ela é progressiva, ou seja, o consumo aumenta e pode gerar problemas ainda maiores como físicos, psicológicos e sociais. Mas é importante ressaltarmos que, apesar de incurável, ela pode ser tratada e o indivíduo pode ter uma vida normal.
Por falta de conhecimento, as empresas, ao invés de tratarem do assunto com procedimentos de cuidados com a saúde da pessoa, emitem decisões e preceitos que fogem das questões de prevenção e tratamento da dependência química. A falta de informação é a maior vilã, pois todos saem perdendo, tanto empregadores quanto os funcionários”, alerta.
O coordenador elenca as principais consequências da dependência química, são:
Absenteísmo: faltas contínuas não avisadas com antecedência, recorrente pedido de licenças por doenças, ausências durante o trabalho, atrasos etc.
Perda da produtividade: atraso e lentidão na execução de tarefas, dificuldades para autoanálise e reconhecer erros, perda de expectativa de produção, descuidos etc.
Dificuldades nas relações interpessoais: mudança de humor repentina, dificuldade de receber críticas e sugestões, nervosismo e agressividade etc.
Falta de autocuidado e problemas pessoais: problemas na autoestima, higiene e aparência pessoal, distúrbios do sono, mudança de hábitos alimentares, ansiedade, depressão, estresse etc.;
Acidentes de trabalho: precariedade no uso de equipamentos e instrumentos de trabalho.
Mais da metade da população já consumiu bebida alcoólica
O consumo de bebidas alcoólicas e de outras drogas lícitas ou ilícitas em muitas situações se tornam problemas de saúde pública, se relacionados com dependência química, ou seja, ir além do consumo recreativo ou moderado.
Se a bebida alcoólica é a porta de entrada para outras drogas, um dado alarmante deve ser considerado: mais da metade da população brasileira de 12 a 65 anos consumiu bebida alcóolica alguma vez na vida.
Os números foram divulgados em 2019, pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) numa pesquisa realizada com o objetivo de estimar e avaliar os parâmetros epidemiológicos do uso de drogas no Brasil.
Os dados revelaram que a substância ilícita mais consumida no Brasil é a maconha: 7,7% dos brasileiros de 12 a 65 anos já a usaram ao menos uma vez na vida. Em segundo lugar, fica a cocaína em pó: 3,1% já consumiram a substância.
Aproximadamente 1,4 milhão de pessoas entre 12 e 65 anos relataram ter feito uso de crack e similares alguma vez na vida. O relatório da pesquisa destaca, porém, que esses resultados devem ser observados com cautela, uma vez que o inquérito domiciliar não é capaz de captar as pessoas que são usuárias e não se encontram regularmente domiciliadas ou estão em situações especiais, como por exemplo, vivendo em abrigos ou em presídios. Ou seja, os números podem ser maiores.