Chamou-me a atenção um artigo da CartaCapital do último 13 de maio. De autoria de Ana Flavia Gussen, o artigo tem o título “O céu de Damares: como a ministra dos Direitos Humanos aparelha sua pasta”. O texto não explora somente o affair da ministra para esquadrinhar como está ocorrendo o aparelhamento do Estado pelos grupos mais conservadores da sociedade. Vai além. De qualquer forma, destacamos Damares, lembrando da vereadora de Ribeirão Preto que pretende lhe dar um título de cidadania. Aliás, a vereadora resolveu subir de vez na goiabeira, mas isso já não é novidade.
O maior campo de batalha escolhido por Bolsonaro foi justamente Educação, Cultura, Direitos Humanos e Relações Exteriores. O núcleo ideológico estava encastelado nessas pastas, mas já sofreu baixas consideráveis. O ex-ministro da Educação e o ex-chanceler, ambos da linha de frente da tropa de choque, foram defenestrados depois de inúmeras confusões. No entanto, uma generala de alta patente continua firme e prestigiada pelo bolsonarismo e seu duce. Damares Alves, ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, anda meio calada ultimamente, mas não abandonou a missão. Sorrateiramente, vai levando para o governo figuras do conservadorismo religioso.
Não é à toa que a vereadora quer lhe dar o título de cidadã ribeirão-pretana. Por aqui, também vicejam vários tipos de fundamentalismo que estão na raiz do movimento que levou Bolsonaro ao governo. Damares já esteve na cidade, anos atrás, em uma igreja evangélica. Vinha acompanhando um deputado do Acre, filiado à época ao PV, mas já transladado pelo PT e pelo PCdoB, de onde fora expulso (!). O assunto da visita era o aborto. Aliás, sempre me pergunto como essa gente tem uma facilidade enorme de se mobilizar por questões que consideram exclusivamente morais, mas passam longe de problemas sociais e ambientais. Só Deus explica!
Mas voltemos ao artigo da CartaCapital. Um mapa, obtido com exclusividade pela revista, descobriu que dos 46 cargos mais importantes do ministério de Damares, 30 estão ocupados por representantes de igrejas evangélicas, católicos ortodoxos, movimentos internacionais e nacionais da direita cristã e até do Integralismo, de inspiração fascista. Segundo o artigo, 17 desses cargos são ocupados por pessoas ligadas às igrejas Batista, Assembleia de Deus, Quadrangular, Presbiteriana e Universal. Outros 8, por representantes de movimentos católicos como a União dos Juristas Católicos de São Paulo, Regnun Christi, Mission Network e Brasil sem Aborto.
O projeto defendido por Damares é bastante claro: liberdade religiosa (mais ou menos na mesma concepção de “liberdade de expressão” dos bolsonaristas), defesa da família (é bom que se acrescente logo: “só a tradicional”), movimentos antiaborto e contra direitos LGBTQIA+, homeschooling e “escola sem partido”. Ana Flavia Gussen, autora do artigo, destaca que “há uma conexão clara com movimentos reacionários dos EUA”. E é bom lembrar que estes movimentos estavam no balaio de apoio a Donald Trump, invadiram o Capitólio para impedir a posse de Joe Biden e foram responsáveis por 6 mortos. Terrorismo interno.
“O cargo de secretária nacional da Família de Damares é ocupado pela advogada Ângela Vidal Gandra. Ela é filha do advogado Ives Gandra Martins, destacado integrante do Opus Dei (organização católica de direita). Martins foi padrinho de casamento de Carla Zambelli, a mais fanática aliada de Bolsonaro na Câmara dos Deputados, a quem Ângela chama de “irmã”. Olavete de carteirinha, Eduardo Miranda Freire de Melo foi nomeado em fevereiro para compor o Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura. Intendente da Marinha, Melo minimizou a tortura em entrevistas e não tem nenhuma experiência em Direitos Humanos”, nos informa a autora do artigo.
O Bolsonarismo é um câncer e, como tal, tem de ser extirpado antes que nos leve a todos para a vala da morte. Ele é o agente principal, atualmente entre nós, do que se convencionou chamar de necropolítica, em uma concepção mais ampla. Damares com sua tropa é uma das expressões mais estúpidas e agressivas desse movimento. Tomara mesmo que a vereadora tenha desistido ou que ainda desista desse projeto insano. Homenagear pessoas desse naipe não revela apenas simpatia e esperteza eleitoral. Revela muito mais. Revela a adesão a uma agenda que pretende impor o fundamentalismo religioso sobre toda a sociedade. Quem te viu, quem te vê, hein vereadora?! Triste.