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Aos 91 anos, Clint Eastwood encanta e surpreende com ‘Cry Macho’

Por Luiz Carlos Merten, especial para o Estadão

Talvez, para falar sobre o novo filme de Clint Eastwood, se deva pegar carona no que sobre ele disse o britânico The Guardian. Cry Macho – O Caminho para Redenção poderá não ser o último filme de Clint. Aos 91 anos, ele segue como impávido colosso. Mas talvez seja o “ultimate”, o definitivo. Todo filme de Clint poderia se chamar Cry Macho. O macho sensível, emotivo. Pense em Os Imperdoáveis, Gran Torino, Menina de Ouro, A Conquista da Honra, A Mula. Todos poderiam chamar-se Cry Macho.

Há dois ou três anos, Clint chegou a aventar a hipótese de aposentadoria, não do diretor, mas do ator. Disse que seguiria dirigindo, mas não tinha muito mais interesse em interpretar. O livro de N. Richard Nash, que coescreveu o roteiro, fez com que ele mudasse de opinião. O começo não poderia ser mais econômico. Clint faz um ex-campeão de rodeio. Perde o posto sumariamente – fim da linha para ele. Mas logo é chamado para uma missão. O homem que lhe estendeu a mão quando ele estava na pior quer que Clint o ajude a resgatar o filho que está no México. Um curto flash-back mostra o acidente que ele sofreu durante uma apresentação. Mais tarde, uma fala do diálogo informa que sua mulher e o filho morreram num acidente. Tudo isso abala, pode destruir um homem.

O empregador lhe diz: “Você me deve isso”. E ele aceita. Velhos códigos de honra. No México, onde o garoto de 13 anos deveria estar vivendo com a mãe, a surpresa. Ela se refere ao próprio filho como “monstro”. É rica, vive cercada de seguranças e, quando se encontram, está dando uma festa. O macho solta uma piada machista – quando uma mulher está rindo de felicidade, como ela, em geral o homem está com a braguilha aberta. Alguma feminista de carteirinha poderia citar o #MeToo para enquadrar o velho Clint. É pouco provável que alguém o faça. Tudo ocorre rapidamente.

Ele acha o garoto, bebendo tequila e metido nas brigas de galo. Caem na estrada, de volta aos EUA, mais exatamente ao Texas. O galo se chama Macho. Clint – o personagem – dá uma lição de vida ao garoto. Esse negócio de “macho” não tem nada a ver. Quase sempre quem se esconde por trás dessa fachada está tentando mascarar a própria fraqueza. A estrada é cheia de percalços – federales, o capanga amante violento da mãe do fugitivo. A dupla chega a uma pequena cidade. É acolhida por uma viúva que possui uma cantina. O garoto flagra a atração mútua que se estabelece entre os idosos. O caminho para (a) redenção passa pelo afeto.

O dever cede espaço para outros temas clintianos – a confiança, e a quebra dela.

O garoto, que se ligou a Clint, vai se sentir traído por ele. Tudo simples e direto. Em filmes como Menina de Ouro e Gran Torino, Clint, como autor, colocou na tela histórias de sacrifício, no sentido cristão. O personagem que o próprio Clint interpreta está sempre tentando se redimir – de uma vida de excessos, de violência, de desamor. Esse Clint “cristão” está longe de ser uma novidade, mas nunca, como aqui, o garoto e ele encontram guarida numa igreja consagrada à Virgem. A viúva reclama – igreja não é hotel. E os chama para sua casa. A jornada será de transformação para o trio de protagonistas, Clint, o garoto e a viúva.

É uma regra básica. O crítico francês Michel Mourlet já disse que, no cinema, tout est, tudo se constrói, na mise-en-scène. E mais – o cinema começa e se dilata na epiderme dos atores. Clint, aos 91 anos, começa a ficar um pouco encurvado – o peso da existência? Mas segue rijo como encarnação do macho sensível. Sua ligação com o western vem desde o começo de sua carreira. Nesse sentido, Cry Macho é pródigo em referências. A paisagem é parte da aventura, e do drama. O personagem dorme no chão de terra, como velho caubói que é. Apesar da idade, não perdeu o jeito com os animais e doma cavalos. Doma o garoto? O jovem aprende a dominar seus impulsos. No lombo do corcel, adquire segurança.

Cry Macho é, definitivamente – e sem preconceito -, um grande filme de velho. Os valores, o classicismo, tudo tem a marca de Clint. Ele não tenta enganar seu público, nem conquistar o público mais jovem, com fricotes de modernidade. Clint teve seus mestres, Don Siegel formado na montagem da velha escola de Hollywood, Sergio Leone estendendo o tempo nas cenas de longa duração de seus spaghetti westerns, que viravam ópera com as trilhas de Ennio Morricone. Justamente a trilha de Cry Macho. Clint sempre foi um reputado conhecedor de jazz. Dessa vez, ele oferece um regalo. Eydie Gormé e Trio Los Panchos. Eydie quem?

Eydie foi uma cantora norte-americana de jazz e pop. Aventurou-se pelos ritmos latinos, o improvável, mas bem-sucedido casamento entre jazz e bolero. Los Panchos foi um trio musical mexicano. Ajudou a transformar o bolero, nascido em Cuba, num gênero musical predominantemente romântico, e de sucesso internacional. Em 1964, o trio e Eydie lançaram o álbum Amor, com canções como História de Un Amor, Piel de Canela, Nosotros, Caminito, Noche de Ronda. Tinha também Sabor a Mí. “Tanto tiempo disfrutamos de este amor/ Nuestras almas se acercaron tanto así/ Que yo guardo tu sabor, pero tu llevas también sabor a mí/ Si negaras mi presencia em tu vivir/ Bastaria con abrazarte y conversar/ tanta vida yo te di, que por fuerza tienes ya/ Sabor a mí.” É como uma viagem no tempo. Clint e a viúva dançam Sabor a Mí. O tempo do afeto. Perdido e reencontrado. Clint, quase centenário, não cessa de surpreender e maravilhar.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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