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Um cabo, um pastor e uma porção de ladrões

A CPI da Covid continua com suas retumbantes revelações. Toscos per­sonagens que vão desde um cabo da Polícia Militar de Minas a um pastor, que chama a si mesmo de “reverendo”, todos se passando por vendedores e intermediários de vacinas. E pensar que tudo isso está na conta dos mais de 500 mil mortos que já vai colocando o Brasil como campeão do descaso pela vida humana. O negacionismo foi apenas o ponto de partida para uma sequência de crimes que, agora, envolve também denúncias de corrupção e malversação de dinheiro público.

A CPI parece ter se deparado com um gigantesco esquema de cor­rupção envolvendo a compra de vacinas contra o novo coronavírus. As suspeitas foram levantadas, após pressões atípicas, para o destrave das importações, exercidas sobre Luís Roberto Miranda, servidor concursado do Ministério da Saúde. Aliás, este Ministério, na gestão Pazuello, se trans­formou em um verdadeiro antro de ladrões! Chega a ser hilária a montagem de documentos oficiais com erros crassos para dar vazão à roubalheira. Na última semana já se ouviu voz de prisão, a primeira da CPI.

A trama gira em torno da Covaxin, imunizante produzido pela indiana BharatBiotech. Pelas denúncias, houve sobrepreço no contrato para aquisição da vacina, inicialmente oferecida por 1,34 dólar a dose, mas cujo valor final previa o pagamento de 15 dólares a unidade, totalizando 1,6 bilhão de reais para 20 milhões de doses. De forma diferente das negociações envolvendo a compra de outros imunizantes, para a Covaxin foi escolhida uma intermediária com direito a comissão na concretização do negócio, a Precisa Medicamentos.

Essa tal Precisa tem serviços já prestados ao Ministério da Saúde, inclu­sive com processos judiciais por suspeita de várias irregularidades. Entre as gritantes irregularidades, a compra de remédios que foram pagos antecipa­damente e não foram entregues. Nessa época, era Ministro da Saúde o atual líder do governo Bolsonaro no Congresso, o deputado Ricardo Barros, do PP do Paraná. Tutti buona gente! Este Ricardo Barros é o principal líder do Centrão, a base de apoio de Bolsonaro na Câmara dos Deputados.

Além da Precisa Medicamentos, também aparece na negociação uma em­presa cujas características sugerem ser uma offshore localizada em paraíso fiscal e destinada à lavagem de dinheiro: a Madison, de Cingapura. Em outras pala­vras, tudo indica que a CPI encontrou um esquema clássico de corrupção, que consiste na assinatura de contratos superfaturados para desvio de recursos públicos e uso de empresas de fachada no negócio. Tudo isso em um gover­no que se diz incorruptível. E, agora, corrupção em escala internacional!

Em depoimento à CPI, os Miranda, o servidor concursado e seu irmão deputado, detalharam as denúncias. Contaram que alertaram o Presidente da República sobre irregularidades envolvendo a aquisição da Covaxin. Re­ceberam como resposta, ainda de acordo com o depoimento, que o governo federal acionaria a Polícia Federal para investigar as denúncias. Entretanto, até a ida dos irmãos à CPI, nada havia sido feito. Isso é claramente crime de prevaricação cometido por Bolsonaro. Já chegou à Procuradoria Geral da República e ao Supremo Tribunal Federal.

A primeira reação do governo, quando essas suspeitas de irregularidades vieram a público, foi determinar que os denunciantes fossem investigados – e não as denúncias! Somente depois do depoimento dos irmãos Miranda à CPI, é que o governo federal determinou investigações, uma decisão tardia que só levantou uma suspeição geral sobre vários integrantes da Saúde e sobre o próprio presidente. Afinal, em janeiro e novamente em março, ele foi alertado pelos irmãos Miranda das pressões atípicas envolvendo o desemba­raço para importação da Covaxin.

As suspeitas de estarmos diante de um gigantesco esquema de cor­rupção são reforçadas na recusa sistemática anteriormente praticada pelo governo federal na aquisição de vacinas. Os exemplos vão desde as dezenas de e-mails da Pfizer sem resposta até a desautorizaçãopara aquisição da CoronaVac, ainda em outubro de 2020, sem falar no uso de intermediários para a negociação da Covaxin. Todo este enredo e as manifestações de rua contra o genocida recolocam o impeachment na ordem do dia, em um contexto de alta tensão política que marcou os últimos dias.

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