Professora e ativista feminista Judeti Zilli iniciou sua formação política nas Comunidades Eclesiais de Base, da Teologia da Libertação, na região Norte da cidade, na década de 1980. Foi conselheira tutelar por sete anos, militou em pastorais e movimentos sociais a atualmente é a cara do Mandato Coletivo que leva seu nome na Câmara de Vereadores de Ribeirão Preto. O Coletivo foi eleito com 1.614 votos nas eleições municipais do ano passado.
Junto com seus co-parlamentares: Sílvia Diogo (assistente social), Ádria Maria (professora), Danilo Valentim (professor), e Paulo Honório (fotógrafo/editor), Judeti tem sido uma voz questionadora na atual Câmara – 2021 a 2024 – em relação a atual administração municipal.
Tribuna Ribeirão – Vocês estão em seu primeiro mandato parlamentar. Como avalia a eleição nas eleições municipais do ano passado?
Coletivo Judeti Zilli – Consideramos as eleições municipais do ano passado um reflexo da conjuntura nacional, estadual e municipal do país desde 2016. Destacamos a intensificação no uso da internet e redes sociais no alcance da população como forma de tentar o diálogo e informá-la. Esse uso das mesmas se aprofundou no município e país devido ao contexto de pandemia da covid-19, servindo para informar a população, apresentando as propostas, projetos e a nossa história, utilizada também como disseminação de calúnias e fake news. Foi um divisor de águas em relação aos desafios democráticos do processo de constituição do mandato coletivo visando efetiva participação e representatividade.
Tribuna Ribeirão – A pandemia do coronavírus mudou o jeito de se fazer campanha em função do distanciamento social. Como vocês fizeram para chegar ao seu eleitorado?
Coletivo Judeti Zilli – O contexto de pandemia oportunizou um aprofundamento no uso das redes sociais na forma de se fazer campanha e se comunicar com a população. Porém, as formas tradicionais e amplamente conhecidas e vivenciadas por nós, se fizeram presentes nas eleições de 2020 em menor escala como, a propaganda eleitoral na televisão, panfletagem, e o diálogo presencial com a população (embora reduzido), respeitando os protocolos de segurança no combate a covid-19, como o distanciamento social de um metro e meio, o uso de máscaras e álcool em gel.
Tribuna Ribeirão – Qual o perfil do eleitorado do Coletivo?
Coletivo Judeti Zilli – Pensando em termos de eleitorado não temos um perfil único e definido, justamente porque o Coletivo Popular Judeti Zilli é a soma de uma construção histórica que envolve diversas representações da cidade e dos movimentos sociais, em que primamos pelo compromisso e necessidade de representar a classe trabalhadora, pessoas vulneráveis, mulheres (lgbtqia+), negros, servidores públicos. Nosso eleitorado se define dentro do espectro da centro esquerda progressista.
Tribuna Ribeirão – A pandemia tem atrapalhado o trabalho parlamentar do Coletivo?
Coletivo Judeti Zilli – A pandemia tem dificultado imensamente o trabalho do Coletivo Popular. O primeiro motivo é porque diante das funções obrigatórias de um mandato legislativo coloca algumas barreiras no papel fiscalizador. O segundo, e que é inerente a característica do CP tem relação com o perfil político que é de atuação histórica nos movimentos sociais, entidades e conselhos da cidade. É um grupo que possui como perfil a interlocução com os munícipes e está cumprindo e sofrendo, como toda a sociedade as devidas restrições sanitárias.
Tribuna Ribeirão – O Partido dos Trabalhadores aumentou o número de vereadores de um para dois em relação à legislatura anterior. A que vocês atribuem este aumento?
Coletivo Judeti Zilli – O nosso entendimento referente ao aumento dessa representatividade no legislativo é porque o grupo político ao qual pertence o Coletivo Popular e o construiu por décadas, tenha relação com as bases sociais e a população. Vive as suas demandas. Está no cotidiano do munícipe. Há uma ânsia social e política por novos paradigmas de políticos (as) coerentes com as narrativas e modos de vidas territoriais, de fato e direito representativos, plurais, não centralista e nem personalista, que seja interlocutor direto com os grupos minoritários e excluídos que mais necessitam da presença do estado de bem estar social.
Tribuna Ribeirão – O PT teve várias lideranças nacionais acusadas e condenadas por corrupção. Isso dificulta o trabalho de vocês junto ao eleitor?
Coletivo Judeti Zilli – Infelizmente, a corrupção é estrutural, ancorada na dominação colonialista, capitalista racial e patriarcal, sustentadas pela síndrome do vira-latas e do povo cordial, social, cultural e historicamente construídas e reproduzidas pela elite dominante. Logo, todos os partidos, vivenciaram no exercício do poder algum tipo de corrupção. Tais denúncias, apurações e processo legal devem seguir o devido ordenamento jurídico. Que se apure, investigue e tome as providências cabíveis quando comprovados tais irregularidades e corrupções sempre dentro dos trâmites legais. O trabalho do Coletivo Popular consiste exatamente no esclarecimento, na desmistificação maniqueísta da política, do potencial de reconhecimento e sentimento de pertença, das pessoas, da classe trabalhadora, elucidando as regras e jogo político de grupos e classes dominantes que se perpetuam no poder. Logo, vislumbra colocar luz nos meandros e exercício do poder político em sua complexidade, acima de tudo democrática.
Tribuna Ribeirão – Qual a diferença fundamental entre um mandato coletivo e um mandato tradicional em que o vereador é eleito sozinho?
Coletivo Judeti Zilli – A centralidade de um mandato coletivo é a descentralização do poder, com relações efetivamente dialógicas, horizontais, plurais e representativas. Não existe salvador ou salvadora da pátria e um povo só se salvará, por si. O movimento é de baixo para cima, é circular e sistêmico e isso é a tônica fundamental, que ao, nosso ver, apesar de não trazer novidades teóricas e conceituais, inauguram novos ventos na política brasileira.
Tribuna Ribeirão – Quais são as prioridades do Coletivo Judeti neste mandato?
Coletivo Judeti Zilli – Nossa prioridade é promover a ampliação da participação social na gestão da cidade e práticas cidadãs no legislativo, através de plataformas de interação com o CP. Organizar os trabalhadores de setores excluídos, minorias políticas e vulneráveis e possibilitar o acesso efetivo aos direitos humanos fundamentais na busca incessante da redução das desigualdades sociais. Nossos projetos visam discutir e atender demandas da educação, movimento de mulheres, lgbttqi+, movimento negro, moradia, crianças e adolescentes.
Tribuna Ribeirão – Em relação ao combate ao coronavírus que avaliação o Coletivo faz da administração municipal?
Coletivo Judeti Zilli – O Executivo e a administração municipal não possuem um comitê que reúna diferentes atores sociais, para além do corpo técnico do governo e representantes do comércio e empresários, com um plano claro e transparente. A pandemia exige diálogo e pactos constantes com toda a população, sobretudo, em relação aos cumprimentos sanitários e de isolamento social, tão difíceis de serem atingidos, pela minimização e negacionismo do colapso sanitário. O Plano São Paulo não atende a urgência veracidade dos fatos atuais. Não há um plano de ações pautadas em políticas públicas para proteger a vida da população no município. Desde de março de 2020 não houve um programa de testagem em massa como prevê os protocolos de segurança elaborados por cientistas e recomendações da Organização Mundial da Saúde, sequer a implementação de um programa municipal de renda básica, ainda ocorreu. O debate da pandemia e o cumprimento de protocolos de segurança passam por uma política econômica, também, no sentido de dar proteção e segurança as famílias que precisam trabalhar para gerar o seu sustento, bem como, de ampla e maciça campanha educativa em todos os âmbitos. É necessário desconstruir a falsa dicotomia entre saúde e economia.
Diante disso, nós do Coletivo Popular juntamente com outros mandatos, entidades, sindicatos, autoridades, movimentos sociais, cientistas, jornalistas, professores, presidentes de bairros, e uma parcela importante da sociedade civil decidimos construir um Comitê de Combate à Pandemia no Município de Ribeirão Preto. Ele é aberto a toda população. Estamos construindo um programa, planejamento e ações para o município no combate à pandemia baseado em dados, experiências de outros municípios e países que foram bem-sucedidos no combate a covid-19 e na ciência. Temos um programa de combate a covid-19 para a cidade, e é de extrema urgência que o secretário da saúde e o prefeito Duarte Nogueira abram o diálogo e ouça o Comitê. O que está em jogo são vidas e a saúde de toda a população. Vidas estão sendo ceifadas e poderiam ser evitadas.
Tribuna Ribeirão – E que avaliação vocês fazem do presidente Bolsonaro e do governador João Doria na condução das ações contra ao coronavírus?
Coletivo Judeti Zilli – Em relação ao governo Bolsonaro estamos lidando com um governo negacionista, suas ações são pautadas em subestimar e menosprezar os impactos da pandemia covid-19. Promove o descumprimento das medidas de segurança e protocolos sanitários, recomendadas pela comunidade científica e Organização Mundial da Saúde.
Sua postura é monocrática, antidemocráticas e irresponsáveis, fundamentadas no negacionismo, demonstrando desumanidade e despreocupação em salvar vidas e cuidar da saúde das pessoas, negando a compra de vacinas no ano passado, o que impactou diretamente na morte de milhares de brasileiros, e na morosidade na campanha de vacinação que está em andamento, evidenciadas na CPI da Covid. Neste momento, a vacina para todos e todas é a única solução sanitária, para minimizar esta situação de pandemia colapsada que nos encontramos, cujas sequelas ficarão e exigirão ser tratadas nos próximos anos.
Sobre o governador João Dória, o Plano São Paulo do governo, não atende as reais necessidades e avaliações quanto à disseminação, testagem, rastreamento e isolamento social. As ações das fases classificatórias e restritivas, resultantes em lockdows, sem projetos de proteção social, baseadas preferencialmente, na implantação de leitos de UTIs, são questões que referendam a certo modo, a negação à ciência. Faz uso político e eleitoral do Butantan. Uma batalha política visando às eleições 2022 norteia e camufla a realidade sanitária, política e econômica do país há meses. Vivemos de longe a maior tragédia da história do Brasil, com exceção do genocídio indígena e da escravidão.
Enfim, Jair Bolsonaro e João Dória são negacionistas. A diferença é que o presidente assume isso publicamente enquanto o governador Dória se esconde atrás de um discurso hipócrita de preocupação com a população. Ambos não implementaram políticas públicas sociais e econômicas de combate a covid-19, por isso são faces da mesma moeda.