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A mentira como álibi da verdade

O ditado popular diz: “a mentira tem perna curta”, e que por conta disso não vai muito longe. No entanto, no Brasil a mentira adquiriu pernas longas e velocidade, e com isso alon­gou sua longevidade – agora o horizonte é o seu limite. Em algumas sociedades, os costumes muitas vezes têm força de lei, já ouve tempo em que a palavra empenhada valia como se fosse uma lei, e que o fio do bigode era a chancela do homem honrado, mas toda essa honradez não incluíam os direitos humanos – era só mercadológico.

O tempo passou, e estas regras rígidas foram se amenizando, e aquele fio do bigode que era garantidor da palavra empenhada se perdeu no fio de uma lamina ou de um barbeador elétrico; foi para o ralo. Nada melhor que o tempo para desmascarar uma falsa premissa, e o cotidiano mostrou a realidade cruel. A mentira ganhou status linguísticos, agora só fala em inglês. A frase “fake news” substituiu a notícia falsa, no entanto na língua portuguesa a força da palavra mentira continua forte.

Segundo a neurociência, o cérebro humano cria modelos de realidades, de acordo com o modo de vida, e interpreta­ções difusas da realidade. Os depoimentos dos representantes do governo federal na CPI da Covid mostram como a realida­de funciona no cérebro de gente que se locupletam no poder. A mentira que no passado era relegada ao patamar mais vil do ser humano, no entanto foi trabalhando sorrateiramente construindo pontes e caminhos, e chegou ao estrelato pelas mãos dessa gente de “bem”.

Aquele falso rigor, que premiava a verdade como algo a ser alcançado por todos foi uma construção deliberada. A verdadeira intenção era não permitir que uma sociedade mais igualitária fosse alicerçada, aonde a miséria não fizesse parte do cotidiano. E esse sofisma aliado ao dom de iludir, que essa gente de “bem”, e “bem formada” é especialista, materializou a Parábola do camelo e o fundo da agulha, e com isso o confor­mismo dos pobres com a sua condição de pobreza e miserabi­lidade se fez real.

Não permitir que a ascensão social aconteça, e que a se­gregação seja a marca da nossa sociedade, é um projeto que se perpetua. O conhecimento liberta o ser humano, e em socieda­des desiguais como a nossa, os donos do poder trabalham para que os conhecimentos fiquem restritos aos seus, e com a exper­tise adquirida em malandragem e safadeza limitam através da educação básica, o compartilhamento dos conhecimentos, e com isso fecham os caminhos dos filhos dos seus serviçais.

O desejo é uma força que vem do âmago do ser humano, e que muitas vezes se contrapõe a realidade, e essa força que uma parcela, mesmo que pequena da população brasileira nutre por uma educação básica autônoma, que saiba lidar com o contradi­tório, pois são premissas que alicerçam qualquer regime demo­crático – e com isso mudamos o Brasil. A verdade e a mentira assumem conotações diferentes de acordo com a origem e cor da pele. A palavra que sai da boca de alguém branco e da elite é tida como verdade absoluta, mas a palavra do pobre e preto é sempre contestada e criminalizada, pois na visão das autoridades são criminosos até que se prove o contrário.

Mudar a direção do País é imprescindível, não podemos mais admitir que haja leis que pegam e leis que não pegam, e que a Constituição seja aviltada o tempo todo, onde os direitos huma­nos são segmentados entre a elite branca protegida pela lei, e as periferias pobres de maioria preta sejam aviltadas o tempo todo. A Constituição é uma só, e vale para todos.

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