A semana de Ymanitu Silva iniciou da mesma forma que a anterior. Décimo colocado do ranking da Federação Internacional de Tênis (ITF) na categoria quad (atletas com deficiência nos membros inferiores e superiores), o catarinense de 38 anos conquistou o título do Kemal Sahin Open, primeiro de dois torneios em Antalya (Turquia), ao bater o sul-coreano Kyu-Seung Kim (14º) por 2 sets a 0, com duplo 6/2.
No último dia 9, o tenista em cadeira de rodas mais bem colocado do país nos rankings mundiais da ITF já tinha vencido o Aberto de Vilamoura (Portugal), derrotando o turco Ugur Altinel (22º) por 2 sets a 0 (6/1 e 6/0) na decisão. Ele ainda foi campeão nas duplas ao lado do compatriota Leandro Pena (431º). Os dois títulos em solo português deram início a uma gira de competições na Europa. A lista dos classificados à Paralimpíada de Tóquio (Japão) fecha em 8 de junho. Na quad, os 12 primeiros do ranking garantem vaga nos Jogos.
“Por conta da pandemia [da covid-19], estão havendo poucos torneios, então, são oportunidades para conseguir a pontuação necessária e ver o nível que realmente estou perante meus adversários. Em 2020, consegui disputar duas competições na França, mas ficamos quase o ano todo parados”, conta Ymanitu Silva à Agência Brasil.
Entre o Aberto de Vilamoura e a viagem para Antalya, o catarinense representou o Brasil, ao lado de Leandro e do número dois do país na quad, Augusto Fernandes (31º), no torneio classificatório para o Mundial por equipes. As vitórias nos confrontos contra Suécia e Alemanha, também realizados em Portugal, garantiram vaga à seleção da categoria na competição que será disputada entre 27 de setembro e 3 de outubro, na Sardenha (Itália).
“A gente sabia que seria difícil. Eram cinco países para duas vagas. Mas sabíamos do potencial da equipe. Os duelos com Suécia e Alemanha foram definidos no último jogo [duplas], o que aumentava a tensão. O bom trabalho dos atletas que participaram comigo e do técnico Vinícius [Cyrillo] foi muito importante. Estar classificado para o Mundial é colocar o Brasil junto dos melhores do mundo e mostrar que o país tem uma força nova, por ser uma categoria recente no país”, destaca Many, como é conhecido o tenista.
A segunda competição em Antalya, o Sahin Kirbiyik Open, começa nesta quarta-feira (19) e segue até sábado (22). Na sequência, Ymanitu disputa três torneios na França e um na Itália. Ele ainda competiria em Israel entre os dias 24 e 28 deste mês, em Ramat-Hasharon, mas o evento foi suspenso devido aos conflitos no país. As constantes mudanças de local em meio à pandemia obrigam o catarinense, que sofreu um acidente de carro em 2007 e ficou paraplégico, a reforçar os cuidados diários.
“Nos voos internacionais, há pouca gente, mas as conexões [na Europa] estão como nos voos internos no Brasil, lotados. A gente toma os cuidados. Sempre de máscara, [utiliza] álcool em gel toda vida e faz testes de PCR antes de competir e viajar. Durante os torneios, respondemos a um questionário diário para detectar sintomas. A gente fica preocupado mesmo assim, mas segue firme para não perder o foco”, descreve.
Segunda chance
Caso confirme a vaga paralímpica, será a segunda participação de Ymanitu nos Jogos. A estreia foi em 2016, no Rio de Janeiro, quando foi às quartas de final, sendo superado pelo sul-africano Lucas Sithole, à época número três do mundo. Na partida, Many teve duas chances para fechar o primeiro set, quando vencia por 5 a 4, mas o adversário reagiu e conseguiu a virada. Apesar da eliminação, o brasileiro tem as melhores recordações possíveis.
“Joguei na quadra central, com seis a oito mil pessoas na torcida, que gritava ‘Silva, Silva’, sem nunca ter me conhecido. Foi sensacional. Na hora que fui cumprimentar meu adversário, amigo do circuito, ele disse que se eu tivesse vencido aquele primeiro set, levaria o jogo, pois a energia [do público] estava muito forte e ele não estava aguentando a pressão. Outra lembrança é de quando fui levar minha namorada na saída do estádio, coisa de 200, 300 metros, e demorei uma hora para fazer o trajeto, pois a multidão veio agradecer o empenho, bater foto e mostrar carinho. Foi a sensação de que é possível realizar sonhos”, conta o catarinense, que treina na academia da ADK Tennis, no Itamirim Clube de Campo, em Itajaí (SC).
Na ocasião, Many competia internacionalmente há menos de dois anos, pois foi submetido à classificação funcional (processo que categoriza o atleta, conforme a deficiência) em 2014. Desta vez, ele participou de todo o ciclo paralímpico. Em 2019, tornou-se o primeiro brasileiro a disputar um Grand Slam no tênis em cadeira de rodas, em Roland Garros (França).
“Tenho hoje uma estrutura de treino que eu não tinha há quatro anos. Com certeza, estou mais confiante. Durante o ciclo, nós, atletas brasileiros, principalmente eu e o Daniel Rodrigues [número 11 do mundo na classe open masculina, para jogadores com deficiência nos membros inferiores], conseguimos nos firmar no circuito, obtendo boas vitórias. Os adversários nos enfrentam sabendo que têm que dar o máximo, pois estamos na cola. O ciclo nos mostrou que o trabalho tem sido bem-feito e que nosso nível de tênis cresceu”, afirma Ymanitu Silva.
“A expectativa [para Tóquio] é muito alta. É a dedicação de uma vida. Tudo que a gente faz é pensando na Paralimpíada. E com todo o apoio que há por trás. Durante a pandemia, meus patrocinadores se mantiveram firmes. Conseguir a vaga e brigar pela medalha é algo que te deixa ansioso para chegar logo dia 8 [de junho, um dia após fechar do ranking] e ver o nome na lista, com o passaporte carimbado”, conclui o tenista.
Cenário paralímpico
Na classe open, se o ranking fechasse hoje, o Brasil teria dois atletas confirmados entre os homens, onde se classificam os 40 primeiros: Daniel Rodrigues e Gustavo Carneiro (39º). No feminino, as 22 tenistas mais bem colocadas vão a Tóquio. A brasileira melhor posicionada é Meirycoll Duval, que está em 28º. No Aberto de Vilamoura, ela foi semifinalista em simples e vice-campeã nas duplas, jogando com a compatriota Ana Caldeira, 39ª do mundo. No Kemal Sahin Open, caiu na primeira rodada do torneio individual e foi à semi nas duplas, formando parceria com a turca Busra Un (36ª).
Meirycoll ainda ajudou a seleção feminina a se qualificar para o Mundial da Itália na classe open, ao lado de Ana Caldeira, Luciamaria Nascimento (56ª) e Maria Fernanda Alves (111ª). O classificatório, assim como o do quad, foi realizado em Vilamoura. As brasileiras estrearam superando a Bulgária, mas caíram para a Alemanha na semifinal. A vitória sobre a Turquia, na disputa pelo terceiro lugar, assegurou vaga à competição na Sardenha.
Edição: Fábio Lisboa