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Anvisa vê falhas e barra Sputnik V

REUTERS

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) negou na segunda-feira, 26 de abril, a autorização para a importação da vacina russa Sputnik V por dez Estados. Em reunião extraordinária, a diretoria colegiada da agência rejeitou por unanimidade o pedido e embasou sua decisão na falta de dados básicos para análise do produto e em falhas identificadas pela área técnica da Anvisa que podem com­prometer eficácia, segurança e qualidade do produto.

A reunião foi convoca­da frente ao fim do prazo de 30 dias definido pela lei 14.124/2021 e confirmado pelo Supremo Tribunal Fede­ral para que a Anvisa avaliasse os pedidos de importação de vacinas contra a covid-19 fei­tos por governos estaduais e municipais. Ao menos 14 Es­tados e dois municípios solici­taram a importação.

Mas a análise feita pela agência referiu-se ao pedido de importação de 29,6 milhões de doses por dez Estados: Bahia, Acre, Rio Grande do Norte, Maranhão, Mato Grosso, Piauí, Ceará, Sergipe, Pernambuco e Rondônia. Os cinco diretores seguiram a recomendação das três áreas técnicas envolvidas na avaliação: as gerências de medi­camentos/produtos biológicos, fiscalização e monitoramento, que defenderam a não autoriza­ção da importação.

Os servidores apontaram a falta do relatório técnico da va­cina e uma série de falhas nos estudos e processos produtivos do imunizante. Sem receber dos Estados os dados básicos do imunizante, a agência brasileira pediu informações às autorida­des russas e de países que já utili­zam a vacina, como Argentina e México, e encontraram irregula­ridades no produto.

Um dos problemas mais gra­ves apontados foi a identificação em lotes da vacina de adenoví­rus que podem se replicar nas células humanas. O adenovírus é usado como um vetor que leva o material genético do co­ronavírus ao indivíduo vacina­do, mas deve estar “inativado”, sem a capacidade de se replicar e provocar doença.

“Verificamos a presença de adenovírus replicante em todos os lotes. Isso é uma não­-conformidade grave e está em desacordo com o desenvolvi­mento de qualquer vacina de vetor viral. A presença de um adenovírus pode ter impacto na nossa segurança quando utilizamos a vacina”, destaca Gustavo Mendes, gerente-ge­ral de medicamentos e produ­tos biológicos da agência.

Ele apresentou ainda outros problemas da Sputnik, como falhas no protocolo dos estudos clínicos. O especialista afirmou que, pelos dados disponíveis, não foi possível verificar de que forma os participantes dos tes­tes clínicos reportavam eventos adversos e eram monitorados quanto a eventuais reações. Também foram encontradas falhas nas análises que investiga­ram se eventos adversos graves tinham relação com a vacina.

Mendes destaca ainda que não foi apresentado perfil de se­gurança da vacina por faixa etá­ria ou por presença de comor­bidades. Diz que outras vacinas que usam a mesma tecnologia de vetor viral (como a de Ox­ford/AstraZeneca) podem pro­vocar efeitos colaterais, como trombose, e essas reações, ainda que raras, precisam ser conheci­das para que a informação esteja detalhada na bula.

O gerente-geral de medica­mentos frisou ainda que os es­tudos clínicos foram realizados com lotes produzidos em escala laboratorial, e não industrial, o que compromete a análise do comportamento do produto fa­bricado em larga escala. O ser­vidor também destacou que os dados apresentados para a revis­ta científica The Lancet, onde o artigo sobre o estudo da Sputnik V foi publicado, não são sufi­cientes para uma aprovação por agência regulatória.

No campo da fiscalização das fábricas do produto, a geren­te-geral da área, Ana Carolina Marino, disse que a inspeção in loco na Rússia não ocorreu de forma ideal porque os servido­res da Anvisa foram impedidos de entrar em algumas instala­ções, como no Instituto Gama­leya, desenvolvedor do produto.

A inspeção foi feita apenas em duas plantas terceirizadas pela Rússia para produção da vacina pronta e do ingredien­te farmacêutico ativo (IFA) e, de acordo com a diretora, não foi possível garantir a qualida­de do processo produtivo nes­ses espaços.

Por fim, a gerente-geral de monitoramento, Suzie Marie Gomes, ressalta que análises das informações de estudos clínicos, do processo produti­vo e de países que já utilizam a Sputnik, como a Argentina, mostraram problemas em vá­rios aspectos do desenvolvi­mento e fabricação do imuni­zante e no monitoramento da aplicação do imunizante após a aprovação. Para a servidora, os problemas “não permitem ga­rantir que o produto seja segu­ro para a população brasileira”.

O diretor relator do caso, Alex Machado, acolheu os ar­gumentos das áreas técnicas e manifestou especial preocu­pação com a identificação do adenovírus replicante na vaci­na. “A própria vacina foi desen­volvida para que o adenovírus não se replique. A presença de adenovírus replicante diverge do perfil de qualidade das va­cinas de vetor viral”, emenda.

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