Fantasma da meia noite no Cemitério da Saudade
Os jovens dos Campos Elíseos, que eles chamavam de “Campão”, sempre que participavam das brincadeiras dançantes nas casas das moçoilas namoradeiras da época, no retorno se encontravam na Praça Santo Antônio, defronte à igreja e ao lado de um relógio que desapareceu daquele logradouro há muito tempo (com destino incerto e não sabido). Os jovens compareciam às referidas brincadeiras regadas á cuba libre e salgadinhos comprados na vaquinha das mesadas mirradas da época. Cada um contava a sua proeza tendo dançado ao som do “Besame Mucho”, de Ray Conniff com esta ou com aquela colega de classe e que “ela chegou a ficar com o rosto colado ao seu”, sinal de que poderia dar namoro. Nada além disso. Todos ficavam a divagar, a fazer versos para as musas inspiradoras e a projetar futuras investidas nas mais “paqueradas”. Todos “arrotavam” coragem e disposição. Poucos tinham a audácia de nas brincadeiras dançantes tirar as suas escolhidas, preferindo ficar bebericando no barzinho ou junto ao séquito de jovens em grupos , grupo do “Bolinha”, onde mulher não se aventurava. O clube da “Luluzinha” era perto do alpendre.
Na pracinha
Quando os jovens voltavam, ficavam nos bancos da Praça Santo Antônio em volta de um não tão jovem que tocava violão, mas entoava algumas músicas da época do romantismo que enlevava os pensamentos da garotada. Certa feita, um deles contou a história da “Loira do Cemitério”, garantindo que um conhecido seu havia acompanhado uma jovem loira e linda e que ao passar pelo Cemitério da Saudade havia dito que teria que se despedir na avenida, pois sua casa era ali. Claro que o menino desapareceu nos trinta e ela teria entrado no campo santo no final da avenida da Saudade. Havia ainda naquele local diante do portal da morada da loira a entrada do Educandário. Os presentes na praça desafiaram aos que lá se encontravam de entrar no cemitério a meia noite. Faltava pouco. Todos devidamente paramentados de paletós e gravatas se dirigiram a pé para o local da morada da ‘loira fantasma’. O violonista e seu instrumento e os demais acompanhando. Na rua Flávio Uchoa havia um dos muros daquele local mais baixo e todos se aventuraram a pular a barreira por ali, subindo em uma pilha de tijolos.
Noite alta, céu risonho
Todos estavam alegres pela peraltice, mas temerosos pela história contada pelo menino que namorou a loira. O violonista cantava “Noite Cheia de Estrelas” e emendou outras músicas de Nelson Gonçalves. Quando ele encerrou a sequência a meninada bateu palmas e estavam quase todos alegres, pois era hora de voltar. Eis que senão quando surgiram de dentro de uma capela aplausos frenéticos e um muito bem… Não sobrou um. Mesmo de paletó e gravata cada um se escafedeu como pode. Saíram pelas ruas Paraíba, Luiz Barreto e adjacências sem olhar para trás. Novamente se encontraram ao pé do relógio da pracinha. Ofegantes cada um afirmava ter visto a tal loira de um jeito ou de outro.
Mistério desvendado
No dia seguinte, um mais corajoso foi até a administração do campo santo e perguntou ao pessoal se realmente morava uma loira naquela capela. Souberam ao depois que um bêbado se abrigava naquele local depois das carraspanas. Fora o bêbado, e não a loira, que aplaudiu aos corajosos meninos do Campão. Teve gente que rasgou calça, camisa e paletó. As línguas se sobrepunham às gravatas. Cenas da meia noite nos Campos Elíseos de outrora quando as brincadeiras dos jovens eram inocentes e os cigarros fumados eram com papéis adocicados ou bucha de chuchu.