João Camargo
Nessa última segunda-feira, 8 de março, comemorou-se o Dia Internacional da Mulher. Data que marca a luta das mulheres por melhores condições de vida e de trabalho. Melhores condições de vida, já que estimativas globais publicadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) indicam que aproximadamente uma em cada três mulheres (35%), em todo o mundo, sofreram violência física e/ou sexual por parte do parceiro ou de terceiros durante a vida.
No Brasil, a cada uma hora e meia, uma mulher morre por causas relacionadas à violência, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). De acordo com dados disponibilizados pelo Anexo da Violência Doméstica de Ribeirão Preto, é possível identificar que os casos de violência aumentaram por conta da pandemia da covid-19.
Em abril de 2020 — período em que se iniciou o isolamento social por conta da pandemia — houve uma redução no número de inquéritos policiais sobre esse tipo de crime. Os dados mostram que, naquele mês, foram registrados 89 casos, ante 124 dos registros de abril de 2019. Contudo, apesar da queda inicial, com o passar dos meses, estes números foram aumentando.
Ainda segundo informações do Anexo da Violência Doméstica, após passado período de dificuldade no acesso aos canais de denúncia e criação de meios alternativos para estas, os números dispararam. Em maio de 2020, foram registrados 230 inquéritos policiais, enquanto, no mesmo mês de 2019, haviam sido contabilizados 136 casos.
Neste período de pandemia, a artista visual e arte educadora Elaine Almeida, que é criadora e coordenadora do projeto Efêmera — que reúne e acolhe mulheres vítimas de violência desde 2019 — resolveu montar um grupo terapêutico online para debater e conversar sobre os traumas e dores dessas mulheres vítimas de violência.
Elaine conta que já passou por um processo de violência na infância e na vida adulta, e a criação desse projeto tem muito a ver com as buscas que fez para se redescobrir.
“Na minha infância, o meu pai era muito agressivo com a gente [filhos]. A gente apanhava muito. Já na minha adolescência, eu me descobri homossexual. O meu pai não aceitou, me espancou e me colocou para fora de casa quando eu tinha 18 anos. Como eu já passei por um processo de violência na minha infância e na minha vida adulta, eu fui fazer um tratamento para isso. Eu me encantei por esse processo e comecei a pintar sobre esse assunto. Eu desenvolvia as minhas artes sobre violência doméstica, violência de gênero e preconceito”, disse.
Por conta dessa trajetória, Elaine apresentou uma exposição no Fórum de Ribeirão Preto e despertou a atenção de uma juíza, que teve a ideia de iniciar uma uma oficina para as mulheres vítimas de violência. A artista visual foi, então, realizando essas oficinas até que criou o projeto Efêmera.
“Eu tinha um emprego e larguei tudo para trabalhar nesse projeto. Eu tive que entregar meu apartamento, pois não tenho renda, e voltei a morar com os meus pais. Eu me apaixonei por esse projeto. Hoje, eu vivo por conta disso. Minha vida mudou totalmente. Eu não consigo fazer outra coisa além disso”, comentou.
Quem também participa do projeto é a psicóloga Juliana Perdigão que, de maneira voluntária, ajuda na condução do grupo terapêutico, na organização e planejamento das atividades e atendimento individual em caso de necessidade. De acordo com ela, o objetivo de sua participação é de ajudar no acolhimento e no empoderamento pessoal de cada mulher, assim como na resiliência, para que elas consigam refazer suas vidas.
“O Efêmera tem ajudado as mulheres a se sentirem acolhidas e perceberem que não estão sozinhas, elas relatam que as palestras, as atividades e as reflexões realizadas são muito importantes para descobrirem as suas forças e os seus valores como mulheres”, comunicou a psicóloga.
Atualmente, o projeto conta com cinco psicólogas que trabalham de forma voluntária e atendem 25 mulheres. Porém, Elaine informa que, ao longo dos dois anos que atua na área, o grupo já atendeu cerca de 100 mulheres.
Uma dessas mulheres, que preferiu não se identificar, sofreu um trauma em sua vida, há quatro anos, após perder a filha, de 20 anos, assassinada por um ex-namorado em Passos (MG).
Em entrevista ao jornal Tribuna, ela contou que, na época do feminicídio, sua filha tinha uma menina, de 8 meses, que foi deixada com a madrinha após ela ter fugido para Ribeirão Preto, com medo de também ser morta pelo ex-namorado da filha.
“Peguei meus dois filhos e vim para Ribeirão só com a roupa do corpo. Eu fiquei muito doente, fui diagnosticada com diabetes, depressão, síndrome do pânico e pressão alta. Eu não consegui pegar a minha neta e deixei com a madrinha dela, porque eu não ia ter condições de cuidar dela. Graças a Deus não aconteceu nada com ela. Ela está viva. Está linda. Só que ela não me conhece como avó”, comentou.
Após procurar por ajuda, acabou encontrando o projeto Efêmera. Ela disse, ainda, que ganhou vários materiais e móveis para casa, já que não tinha condições para se manter com os filhos.
“Eles são pessoas muito boas [membros do grupo]. Eu não sei o que eu faço para agradecer. Eu não perco nenhuma reunião, porque me faz bem. Eu estava caída. Eu peço para as pessoas que estão precisando de apoio encontrem esse grupo. A gente é tipo uma família. Tudo que a gente precisa, eles nos ajudam”, completou.
Hoje, o projeto Efêmera acolhe mulheres que realizam denúncias e são encaminhadas ao Anexo da Violência Doméstica. Lá, é feita uma seleção, para ver quais mulheres se encaixam no grupo. As redes sociais também são outra forma de ingressar nas reuniões. Os meios para contato com os membros do Efêmera são pelo telefone (16) 99157-5041 ou pelo e-mail (elainedealmei[email protected]). Caso você também queira se voluntariar a ajudar essas mulheres é possível. Para mais informações, entre no site www.projetoefemera.com.br.
Atuação das DDMs
Diante do cenário que enfrentamos no Brasil em relação à violência contra as mulheres, a delegada e coordenadora das Delegacias de Defesa da Mulher de São Paulo, Jamila Ferrari, conversou com o Tribuna para esclarecer medidas tomadas pelas DDMs.
Segundo ela, em meio à pandemia, as medidas de isolamento social despertaram a atenção das autoridades no mundo todo pelo risco de aumento de violência doméstica. O convívio com os agressores e a dificuldade das vítimas em pedir ajuda aumentaram a vulnerabilidade e a possibilidade tanto de novos casos como de subnotificação. Em função disso, a coordenadora ressalta que, quando surgiram as primeiras notícias da pandemia, a Polícia Civil de São Paulo acelerou o processo de atualização dos serviços oferecidos pela Delegacia Eletrônica e, no início de abril do ano passado, ampliou o atendimento virtual, inclusive com a criação da DDM Online.
“Essa medida facilitou muito o acesso das mulheres aos serviços de segurança. Até o final de 2020, a DDM Online registrou mais de 16 mil ocorrências. Todas as delegacias de São Paulo, incluindo as DDMs, seguem funcionando normalmente para atender as vítimas de violência doméstica. É importante ressaltar que a Polícia Civil mantém protocolo único de atendimento para melhor acolher as vítimas em todas as delegacias, não apenas nas DDMs. Além disso, as mulheres podem registrar ocorrências pela internet (www.delegaciaeletronica.policiacivil.sp.gov.br). O serviço tem possibilitado que a Justiça conceda medidas protetivas para as vítimas de violência em tempo recorde. E a medida protetiva permite acesso a ferramentas como o SOS Mulher. Por meio do aplicativo, é possível acionar a polícia apertando apenas um botão no celular”, completou Jamila.
A delegada informa que a violência doméstica gera consequências psicológicas e econômicas nas vítimas, e não atinge apenas os indivíduos envolvidos em agressões. Ainda segundo Jamila, a violência doméstica afeta famílias, muitas vezes com filhos pequenos.
“São traumas levados por toda a vida. Por isso são muito importantes os serviços de acolhimento oferecidos em São Paulo, tanto para as mulheres quanto para os filhos. Eles visam justamente reduzir os efeitos e ajudar as vítimas a superar esses episódios da melhor maneira possível”, finalizou.
R$ 5 milhões para mulheres microempreendedoras
A Sociedade de Crédito Direto e o Conselho da Mulher Empreendedora e da Cultura da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) e da Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo (Facesp) apresentaram esta semana o Programa Accredito Mulher Empreendedora, que vai disponibilizar R$ 5 milhões em crédito disponível para as mulheres microempreendedoras individuais (MEIs) de todo o estado.
As mulheres poderão solicitar empréstimos de R$ 1 mil a R$ 8 mil com juros partir de 1,62% ao mês para financiar aquisições de mobiliários, equipamentos, ferramentas, insumos e para utilização de capital de giro.
Os empréstimos serão concedidos com muito mais facilidades que os disponibilizados por instituições financeiras tradicionais. A solicitação é 100% online, os juros são baixos se comparados aos praticados pelos bancos, não há exigências de garantias físicas e as parcelas do financiamento são divididas em até 36 meses, com carência de até nove meses para pagar.
Para solicitar o crédito, a empreendedora precisa acessar o endereço https://www.accreditodigital.com.br/ mulherempreendedora/ e preencher o formulário com seus dados pessoais. Quando aprovada, a liberação do crédito é imediata.