Astrônomos de todo o planeta estão de olho no Asteroide Apophis, um dos mais temidos pela humanidade. Eles estão aproveitando sua aproximação da Terra para estudar a gigantesca rocha espacial. E essa será a melhor oportunidade de observação desse asteroide antes de 2029, quando o Apophis fará uma passagem de arrepiar.
Descoberto em junho de 2004, o Apophis fez uma aproximação da Terra, nos últimos dias daquele ano, que deixou a comunidade internacional em polvorosa. Percebeu-se que havia uma chance dele atingir nosso planeta em abril de 2029, curiosamente em uma sexta-feira, 13. Naquela época, à medida que novas observações eram adicionadas aos cálculos, a possibilidade de impacto aumentava. As chances de impacto chegaram aos 2,7%, o que causou certa apreensão em todo o planeta.
Esse asteroide tem cerca de 340 metros de diâmetro médio (450 metros de comprimento), 41 milhões de toneladas e energia equivalente a 60 mil bombas de Hiroshima. Se ele atingisse a Terra, seria capaz de devastar milhares de quilômetros quadrados e causar dezenas de milhões de mortes. Fica fácil entender porque ele recebeu o nome de Apophis, o Deus egípcio do caos e da destruição.
Felizmente, com o refinamento dos cálculos orbitais ainda em 2004, concluiu-se que não há chances de impacto em 2029. Entretanto, ele fará uma aproximação da Terra de arrepiar, passando perigosamente próximo do cinturão de satélites geoestacionários e a cerca de 32 mil km da superfície do nosso planeta. Tão perto que poderá ser visto a olho nu de alguns locais do planeta, incluindo parte do Brasil.
Após o susto inicial, alguns astrônomos passaram a se preocupar com a possibilidade de que um desvio orbital, provocado nessa aproximação em 2029, pudesse colocar o Apophis em rota de colisão com a Terra em 2036 ou 2068. Mas um estudo publicado em 2013 afastou a chance de impacto em 2036 e reduziu para quase zero as possibilidades em 2068. Só que não dá pra relaxar com um asteroide tão perigoso rondando nossa vizinhança.
Recentemente, um novo estudo, publicado por astrônomos da Universidade do Hawaii, mediu a influência do Efeito Yarkovsky na órbita do Apophis. O Efeito Yarkovsky é uma pequena força provocada pela radiação térmica de pequenos corpos em rotação no espaço. Dependendo do sentido e velocidade de rotação, da temperatura média e do albedo, o índice de refletividade do asteroide, o Efeito Yarkovisky pode empurrar ou puxar o objeto em direção ao Sol.
O estudo foi chefiado por David Tholen, que foi um dos descobridores do Apophis em 2004. Analisando novas medições, feitas a partir do Telescópio Subaru, de 8,2 metros, no Hawaii, Tholen e sua equipe concluíram que o Efeito Yarkovisky está provocando um deslocamento de 170 metros na órbita do Apophis a cada ano. Parece pouca coisa, mas para um asteroide com órbita tão próxima da Terra, esse pequeno deslocamento acumulado ao longo dos anos pode ser a diferença entre uma aproximação muito próxima e um impacto catastrófico.
Considerando o desvio cumulativo na órbita do asteroide, a equipe revisou para cima as chances de impacto em 2068. Apesar da possibilidade ser muito baixa ainda, cerca de 0,00067%, o estudo reforça a necessidade de acompanharmos de perto o Asteroide Apophis.
E é justamente isso que vários astrônomos de todo o planeta estão fazendo. Nesse momento, o Apophis está passando a cerca de 17 milhões de quilômetros da Terra, o que não é tão próximo, mas cria uma excelente janela de observação. Por isso, a IWAN – Rede Internacional de Alerta de Asteroides criou a “Campanha de Observação do Apophis 2021”, que visa aprender o máximo possível a respeito dessa rocha espacial antes de sua maior aproximação em 2029.
Em um dos exercícios dessa campanha, o Apophis foi “redescoberto” e reportado como um novo asteroide. E a partir dessas novas observações, os astrônomos estão seguindo todos os processos, recalculando sua órbita, riscos de impacto com a Terra, prováveis locais afetados e até mesmo discutindo possíveis medidas para redução de danos. O curioso desse exercício é que, até o momento, utilizando as medições feitas desde dezembro, as chances de impacto foram calculadas em cerca de 10%. Isso significa que, se tivéssemos realmente descoberto o Apophis somente agora, estaríamos todos bastante preocupados, já teríamos bares e igrejas lotados e algumas pessoas pelas ruas vestindo placas alertando que “o fim está próximo”.
Obviamente, essas chances devem ser reduzidas à medida que novas observações forem adicionadas aos cálculos, tornando a órbita do asteroide mais precisa, confiável e semelhante à órbita real, calculada a partir de mais de 15 anos de observação.
Grandes telescópios e radares, dos principais observatórios do mundo que trabalham na pesquisa de asteroides, estão aproveitando essa janela de observação para coletar dados mais precisos a respeito da órbita e das características físicas do Apophis. Tudo isso servirá como uma preparação para 2029, quando será necessário medir, com a maior precisão possível, os efeitos desta aproximação na órbita do asteroide. Qualquer mínima variação inesperada pode afastar definitivamente o risco de impacto, ou colocar o Apophis em rota de colisão com a Terra em 2068.
Somando-se a esse esforço, a NASA cogita a possibilidade de enviar para o Apophis a sonda espacial Osiris-Rex, que atualmente está visitando o Asteroide Bennu. Em setembro de 2023, a sonda trará para a Terra uma cápsula com amostras do Bennu. A partir de então, ela estaria disponível para uma missão adicional, e um dos destinos considerados é justamente o Apophis. Se isso for confirmado, a sonda deve alcançar o asteroide apenas em abril de 2029, pouco depois de sua máxima aproximação com a Terra.
Seria mais uma coincidência interessante, ver Osíris, o deus egípcio da vida após a morte, encontrar Apophis, o deus do caos e da destruição justamente após seu encontro com a Terra que causou tanta preocupação por aqui.
Informações mais detalhadas a respeito do Apophis e da Campanha de Observação de 2021 serão apresentadas durante uma Live, organizada por Cristóvão Jacques no Canal AstroNEOS. Cristóvão é um dos astrônomos do Observatório SONEAR, que participa da campanha, e um dos principais brasileiros envolvidos na busca por novos asteroides próximos à Terra. O evento está marcado para o sábado, 06 de março, a partir das 20:30.
* Marcelo Zurita é presidente da Associação Paraibana de Astronomia – APA; membro da SAB – Sociedade Astronômica Brasileira; diretor técnico da Bramon – Rede Brasileira de Observação de Meteoros – e coordenador regional (Nordeste) do Asteroid Day Brasil
Via Olhardigital