Recente estudo produzido e divulgado pelo Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades da Universidade de São Paulo (Made-USP) aponta que a taxação dos mais ricos e a transferência de renda como forma de reduzir as desigualdades pode contribuir para o país sair da crise econômica a partir de medidas tributárias mais justas e progressivas.
Os pesquisadores constataram que uma política de proteção social financiada a partir da tributação da população mais rica e com a transferência de R$ 125 por mês para os mais pobres pode ter um impacto positivo de 2,4% no Produto Interno Bruto (PIB). O percentual da população considerada a mais rica do país que seria tributada corresponderia a 1% do total de brasileiros.
“É perfeitamente possível desenhar um programa que combine redução da desigualdade com aumento do ritmo de crescimento econômico. Esses objetivos não são contraditórios”, atesta a economista e professora da USP, Laura Carvalho, autora do estudo juntamente com Rodrigo Toneto e Theo Ribas.
Segundo o estudo, como a maior parte do ganho adicional dos mais pobres vai para o consumo, uma tributação de R$ 1,00 sobre o 1% mais ricos e em que estes recursos seriam destinados aos 10% mais pobres elevaria o consumo agregado em R$ 0,63, reduzindo a desigualdade com crescimento econômico.
Campanha
As conclusões do estudo vão ao encontro das ações propostas pela campanha nacional Tributar os Super-Ricos, articulada pelo Instituo de Justiça Fiscal e outras setenta organizações sociais brasileiras.
Esta frente de entidades defende oito projetos de lei para aumentar a arrecadação em R$ 300 bilhões ao ano, taxando apenas 0,03% mais ricos do país: ou seja, 59 mil pessoas entre os 210 milhões de brasileiros.
Segundo estas entidades, as pessoas físicas que ganham mais de R$ 70 mil mensais, com mais de R$ 10 milhões de patrimônio, ou que tenham recebido heranças e doações historicamente subtributadas, que passam de geração em geração estão entre os que podem fazer uma contribuição fiscal mais justa.
Congresso pode promover igualdade
Os articuladores da campanha estão em tratativas com o Congresso Nacional para que essas medidas, apresentadas em agosto de 2020, sejam pautadas naquela casa de leis, como forma de sair da crise investindo em políticas sociais. Segundo especialistas, a pandemia do coronavírus acentuou a vulnerabilidade social, jogando 60 milhões na pobreza e 14 milhões no desemprego.
Entre as propostas da campanha está o fim da isenção dos lucros e dividendos distribuídos nas pessoas físicas e da dedução dos juros sobre capital próprio, mudança nas alíquotas do IRPF, isentando os mais baixos rendimentos e ampliando a taxação para altas rendas, além do aumento da alíquota da contribuição social para os setores financeiro e extrativo mineral, entre outras medidas que também foram sugeridas no pacote.
Campanha tem mascote
Niara é o nome da personagem criada pelo cartunista Aroeira para fortalecer a campanha “Tributar os Super-ricos”, lançada por setenta organizações brasileiras. Em quadrinhos, ao estilo dos famosos personagens de cartuns dos anos oitenta, Armandinho e Mafalda, a pré-adolescente negra Niara foi criada pra explicar as distorções na cobrança de impostos no Brasil.
Niara, no idioma suaíli, falado no leste da África e significa “aquela que tem grandes propósitos”. Aroeira é chargista com trabalhos para os principais jornais do Rio de Janeiro, como O Globo e O Dia, além de outros veículos, como a revista IstoÉ.
Em 2019, chegou a responder processo devido a uma charge, publicada durante as eleições de 2018, que retratava o então candidato à presidência Jair Bolsonaro e o premiê israelense Benjami- Netanyahu formando o símbolo da suástica com os braços. Entretanto, a 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça (TJ) do Rio de Janeiro definiu que a referência ao nazismo possuía propósito satírico e não causaria danos morais.
Conheça as oito propostas da campanha
– Correção das distorções do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) – revogação da isenção dos lucros e dividendos distribuídos, fim da dedução de juros sobre o capital próprio, elevação do limite de isenção para baixas rendas, e criação de nova tabela de alíquotas progressivas.
– Instituição do Imposto Sobre Grandes Fortunas (IGF) sobre as riquezas das pessoas físicas que tenham patrimônio superior a R$ 10 milhões.
– Elevação da alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) dos setores financeiro e extrativo mineral.
– Criação da Contribuição sobre Altas Rendas das Pessoas Físicas (CSAR), incidindo sobre rendas anuais acima de R$ 720 mil.
– Mudança nas regras do Imposto sobre Heranças e Doações (ITCMD), com ampliação da alíquota máxima de 8% para 30%.
– Novas regras de repartição de receitas da União com Estados e Municípios. A previsão é de acréscimos de aproximadamente R$ 83 bilhões para os Estados e R$ 54 bilhões para os Municípios.
– Regras para disciplinar a concessão de benefícios fiscais e para combater a sonegação.