Talvez demorasse um pouco mais para a batata quente cair no colo do Arthur Lira (PP/AL). Mas não demorou nada e já estamos diante de mais uma crise política provocada pela milícia de ódio do presidente. A prisão, na última terça feira, do deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ), determinada pelo Ministro Alexandre de Moraes, imediatamente chancelada pelo pleno do Supremo, indica que a guerra bolsonarista à democracia será longa, como afirmou o colunista do UOL, Leonardo Sakamoto. Moraes deu um passo acertado, pois há uma coleção de crimes cometidos por este militar deputado que devem ser processados, julgados e punidos sob risco da percepção de que isso virou a Casa do Pai Jair.
Quando dá errado, a turma adota o padrão de sempre: apela para um conceito distorcido de direito à liberdade de expressão, como faz agora o advogado do deputado e os bolsonaristas de raiz. Todas as vezes que a sociedade e os outros poderes da República fizeram pouco caso com os ataques às instituições, a sanha bolsonarista avançou. E assim foi solapando instituições importantes como a Receita Federal, o Coaf, a Polícia Federal, o Ibama, o Incra, o Instituto Chico Mendes, a Procuradoria-Geral da República e outras mais. Temos exemplos históricos dessa tática insana comoa complacência das democracias europeias frente o expansionismo da Alemanha hitlerista.
‘Ficaram mundialmente famosos os testes dos limites da República que Bolsonaro fez ao apoiar, no ano passado, as manifestações que defendiam o fechamento do STF e do Congresso Nacional e a volta da ditadura. Ele discursou nesses atos em mais de uma ocasião, uma delas em frente ao quartel-general do Exército”, escreve Sakamoto. E até hoje não foi punido por estes crimes gravíssimos. Essa gente já mostrou a que veio. Eles querem a Ditadura. Este Silveira, policial militar com 26 dias de prisão, 54 de detenção, 14 repreensões e duas advertências, “até quando abusarás da nossa paciência?”, chamo aqui o grande orador romano em nosso socorro.A democracia tem de tolerar os intolerantes?
O deputado Daniel Silveira tornou-se conhecido ao destruir, em uma atividade de campanha eleitoral, uma placa de rua em homenagem aMarielle Franco, vereadora covardemente assassinada em março de 2018 no Rio de Janeiro. A investigação apontou para a participação de milicianos, que devem ser julgados brevemente, apesar dos mandantes não terem ainda sido apanhados. Os milicianos veem no deputado um porta-voz. É um dos seus iguais. Desde então, ele continua demonstrando seu desprezo pelas instituições democráticas, vem atacando políticos e jornalistas que lhe reagem e produzindo todo tipo de desinformação.
O que se percebe até agora foi uma reação praticamente unânime das instituições em defesa da Democracia, da Constituição e do STF. E assim deve ser. Mesmo as dúvidas sobre fragrante delito e crime inafiançável caíram por terra. Foi muito rápida a reação da Procuradoria Geral da República com a denúncia ao STF contra Silveira. A OAB assinou em baixo a decisão do ministro Moraes. A própria Mesa da Câmara encaminhou o caso ao Conselho de Ética e a maioria dos parlamentares referendou a decisão unânime do Supremo. Afinal, o próprio centrão já percebeu que, para o seu come-quieto, é preciso que reine a paz nas estratosferas do poder.
O que aconteceu foi muito sério, ainda mais que esta crise vem na esteira da polêmica entre o general Villas-Boas e o ministro Fachin. A covardia de dois anos atrás provocou agora consequências indigestas. “A construção de limites democráticos é uma atividade cotidiana. Bolas de neve gigantescas começam bem pequenas e, quando você percebe, já nos soterraram. O bolsonarismo começou pequeno. Já existia antes de Bolsonaro chegar ao poder[e acrescento: na cabeça de muitos idiotas] e continuará vivo depois que ele se for. Ou seja, conter seus impactos será um trabalho de Sísifo, ainda mais se for feito dentro da lei”, conclui Sakamoto.