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A Pimentinha

A Pimentinha é nada mais nada menos, que uma das maio­res cantoras brasileiras, Elis Regina, que ganhou esse apelido de Vinícius de Moraes, alusivo provavelmente ao seu gênio forte e braveza.

Elis Regina só era Regina porque, em 1945, os cartórios de Porto Alegre se recusavam a batizar com nomes que poderiam servir tanto para homem quanto para mulher, exigindo um complemento menos andrógino.

Elis Regina nasceu na capital do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, onde começou a carreira como cantora aos onze anos de idade em um programa de rádio para crianças.

Em 1967, lançou Dois na Bossa, primeiro disco brasileiro a vender um milhão de cópias. Ela teve o maior cachê do show business. Elis Regina usou e abusou deste posto. Ela criticou muitas vezes a ditadura brasileira, nos difíceis Anos de Chum­bo, quando muitos músicos foram perseguidos e exilados. A crítica tornava-se pública em meio às declarações ou nas canções que interpretava.

Elis Regina era uma grande pedra no sapato da ditadura. Este aspecto na história da Elis foi lembrado num trecho do “Falso Brilhante”, quando ela fica “presa” a uma barra e ajo­elhada (como que sendo torturada) e canta “Agnus Sei” de maneira incisiva: “ah, como é difícil tornar-se herói / só quem tentou sabe como dói / vencer satã só com orações…” Satã era a ditadura. Vencê-la só com orações (representando as can­ções, livros, peças da época) não era tão fácil como poderiam imaginar aqueles que pegaram em armas e partiram para a clandestinidade.

Ironicamente, essa mesma Elis engajada e militante, foi massacrada pela imprensa de esquerda em 1972, após cantar o “Hino Nacional” num show nas Olimpíadas do Exército. O cartunista Henfil tratou de enterrá-la imediatamente no cemitério do Cabôco Mamadô, personagem seu que mandava para a cova apenas pessoas vivas, acusadas de colaborar com o regime. Na tira dedicada ao funeral de Elis, a cantora surgia ao lado de outros defuntos condenados pelo tribunal do cartunis­ta: Wilson Simonal, Roberto Carlos, Pelé.

Elis participou de uma série de movimentos de renovação política e cultural brasileira, com voz ativa da campanha pela Anistia de exilados brasileiros. O despertar de uma postura artística engajada e com excelente repercussão acompanharia toda a carreira, sendo enfatizada por interpretações consagra­das de O bêbado e o Equilibrista (João Bosco e Aldir Blanc), a qual vibrava como o hino da anistia. A canção coroou a volta de personalidades brasileiras do exílio, a partir de 1979. Um deles, citado na canção, era o irmão do Henfil, o Betinho, im­portante sociólogo brasileiro.

Outra questão importante se refere ao direito dos músicos brasileiros, polêmica que Elis encabeçou, participando de mui­tas reuniões em Brasília. Além disso, foi presidente da Assim, Associação de Intérpretes e de Músicos.

Causando grande comoção nacional, faleceu aos 36 anos de idade em 19 de janeiro de 1982, devido a complicações decor­rentes de uma overdose de cocaína, tranquilizantes e bebida alcoólica. Foi sepultada no Cemitério do Morumbi.

Salve Elis Regina, grande mulher engajada e intérprete ma­ravilhosa, que ousou se posicionar contra o regime, em plenos anos de chumbo.

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