“Câmara Municipal de Ribeirão: a ‘grande família’ – Supersalários e muitas gratificações”. Foi com esta manchete que, em 17 de novembro de 2017, o Tribuna Ribeirão denunciou com exclusividade possíveis irregularidades existentes nos salários de vários servidores da Câmara de Ribeirão Preto.
A reportagem do já falecido jornalista Nicola Tornatori, embasada em farta documentação, desnudava pela primeira vez como servidores aprovados em concursos daquela casa de leis conseguiram aumentar seus salários de cerca de R$ 2 mil a R$ 3 mil para até R$ 35 mil, graças a leis aprovadas pelos vereadores de legislaturas passadas, como a Lei 3.181/1976, Lei 5.081/1987 e Lei 2.515/2012.
É preciso lembrar que, apesar dos servidores beneficiados terem nominalmente direito à remuneração de até R$ 35 mil e terem este valor descrito nos holerites, eles recebem efetivamente até R$ 23 mil. Isso porque, o teto dos salários dos servidores municipais é limitado por lei aos vencimentos do prefeito que, no caso de Ribeirão Preto, é de R$ 23 mil.
Desde a primeira reportagem e, nestes mais de três anos em que não foi decidido definitivamente pela Justiça se os supersalários são inconstitucionais ou não, o Tribuna já publicou 23 matérias sobre o assunto e tem acompanhado de perto os seus desdobramentos jurídicos.
Nelas é possível constatar os muitos vaivéns desta história que, esta semana, ganhou mais um capítulo e voltou a ser objeto da nova ação judicial. A ação anterior foi impetrada no ano de 2018 pelo professor Sandro Cunha dos Santos e na ocasião, a Justiça de Ribeirão chegou a determinar liminarmente a suspensão do pagamento dos supersalários por considerar que o amparo legal – leis municipais – dos benefícios era inconstitucional.
Incorporação reversa
A principal delas, a chamada lei da incorporação reversa, permitia que servidores aprovados em processos seletivos da Câmara começassem a trabalhar recebendo vencimentos muito superiores ao das funções para as quais foram aprovados. Isso porque se tivessem ocupado algum cargo em comissão ou função gratificada na Câmara de Vereadores ou na prefeitura, seus salários passariam a ser equivalentes ao do cargo anteriormente ocupado.
Vale lembrar que em na legislatura passada – 2017 a 2020 – a incorporação reversa foi revogada para os novos servidores concursados, mas ainda continua para os servidores que já estavam no serviço público antes da revogação da lei.
Entretanto, a primeira ação para acabar com o pagamento não foi adiante por um erro formal. Em 11 de março de 2019 o colegiado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ/SP) extinguiu a ação sem julgar o seu mérito por entender que o instrumento jurídico utilizado pelo impetrante, uma ação popular, não era o adequado juridicamente.
Na decisão, o TJ ressaltou ainda que a extinção do processo não impedia que se “pleiteasse ao Judiciário a declaração de inconstitucionalidade de lei e/ou a cessação de pagamentos das verbas que se reputem ilegais, desde que, evidentemente, pela via adequada”. Depois da decisão do TJ, o professor Sandro desistiu de impetrar uma nova ação.
Na mira do MP
Na semana passada – 19 de janeiro -, o Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP) fez uma representação pedindo que a Justiça considere inconstitucionais leis que permitiram os supersalários no poder público municipal de Ribeirão Preto, principalmente no Legislativo. Também pediu a interrupção imediata de pagamentos considerados “ilegais e imorais”.
A ação foi movida pelo Procurador-Geral de Justiça, Mário Luiz Sarrubbo, após representação oferecida pelos promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) de Ribeirão Preto.
O MP não estima, na ação, quantos funcionários tiveram aumento salarial irregular, nem o montante que deverá ser devolvido caso a ação seja julgada procedente. Em 2020, a Câmara gastou aproximadamente R$ 41 milhões com folha de pagamento.
Ao analisar a ação do MP, o desembargador do Tribunal de Justiça Evaristo dos Santos afirmou que “considerando a aparente violação aos princípios da razoabilidade, moralidade, interesse público e eficiência”, a Câmara e Prefeitura devem se manifestar em até dez dias. Ele determinou, ainda, que a tramitação do processo seja feita com celeridade. A Câmara de Vereadores informou ao Tribuna que ainda não foi comunicada sobre a ação.