Uma das questões mais difíceis de serem respondidas, no contexto de “como” e “quando” retornar às atividades presenciais escolares, refere-se em saber se as crianças são super disseminadores do vírus da Covid-19 ou não. Obviamente, no início da pandemia, ou no início de qualquer outra doença infecciosa, não há estudos completos, clínica e experimentalmente bem controlados que forneçam evidências sólidas para responder a esta complexa e importante questão. Todavia, em função da continuidade do surto pandêmico em vários países do globo, pesquisadores sistematicamente foram revelando evidências acerca da associação entre transmissão do vírus e de sua letalidade em crianças, e adultos, comparando ambientes escolástics e não escolásticos.
Os pesquisadores primeiramente notaram que a Covid-19 não era um outro, e qualquer, vírus respiratório em crianças. Havia uma grande discrepância na incidência de casos e prognósticos entre crianças e adultos mais idosos, fato, este, que causou surpresa não só aos cientistas como, também, aos pais e aos governantes e educadores em geral. Inúmeros estudos publicados nos primeiros meses da pandemia, em 2020, sugeriam que crianças e jovens (de 18 anos e mais jovens) estavam em baixo risco para consequências sérias e duradouras, ou mesmo morte, resultantes de contraírem a Covid-19. Todavia, houve insuficiência de evidências que permitisse determinar o quão facilmente crianças e jovens contraíam o vírus e o quão contagioso ambos eram quando se infeccionavam. Ao lado disso, testagem comunitária demonstrou um número significativo de crianças com nenhum sintoma subclínico, o que levantou outras questões que precisavam urgentemente serem respondidas. Seriam as taxas baixas de infecção confirmada em crianças que indicavam o porquê de as crianças ainda não estarem infectadas ou seria a Covid-19 em crianças uma doença do trato respiratório que usualmente nem mesmo requereria a necessidade de admissão hospitalar das crianças infectadas? Por adição, no caso de crianças serem infectadas, elas se infeccionariam mutuamente e aos adultos? Em caso afirmativo, por quanto tempo?
Em função de haver mais questões que respostas a este assunto, governos de diferentes nações do mundo fecharam suas escolas baseando-se quase que exclusivamente no conhecimento adquirido de outras pandemias, especialmente da pandemia da influenza (gripe) que, neste caso, apresentava maior incidência em crianças. Passados alguns meses, o mundo já se encontra na segunda onda e os cientistas continuam incansáveis. Em janeiro de 2021, alguns estudos, veiculados em revistas especializadas, demonstraram baixo risco de infecção pela Covid-19 e também baixa disseminação da mesma nas escolas, incluindo limitadíssima transmissão da doença nas escolas na Carolina do Norte (EUA), poucos casos da associação entre Covid-19 e Síndrome Inflamatória em Multissistemas nas escolas suecas, além de uma disseminação mínima do vírus nos estudantes de escolas primárias na Noruega. Um destes estudos sumariaremos abaixo.
O estudo publicado na revista Pediatrics (8 jan 2021) traz que foram analisados, entre 15 de agosto e 23 de outubro de 2020, 11 de 53 distritos escolares, nos quais tinha sido implementado ensino presencial por 9 semanas do primeiro quadrimestre do referido ano. Na ocasião, as escolas concordaram sem erem monitoradas em relação à incidência e transmissão secundárias da Covid-19. Os resultados desse estudo mostraram-se interessantes e relevantes para a retomada das aulas presenciais nos ambientes escolares, indicando que, ao longo das 9 semanas, os 11 distritos participantes tiveram mais do que 90 mil estudantes e funcionários atendendo às escolas presencialmente; neste total houve 773 infecções de Covid adquirida na comunidade, devidamente documentadas por testagem molecular. Através de rastreamento de contatos foi determinado 32 casos de infecções adicionais, adquiridos dentro da escola. Nenhum caso de transmissão de Covid-19 de crianças para adultos foi registrado nas escolas. De acordo com os autores, as medidas de saúde pública adotadas pelas escolas foram exitosas em mitigar a disseminação da Covid-19. Quais foram essas medidas? Foram medidas que incluíram triagem contínua dos alunos e funcionários, aderência ao uso de máscaras por estudantes e adultos, registro público dos casos da Covid-19, rastreamento de contato eficiente, colaboração com os departamentos de saúde locais, atualização regular de dados sobre a pandemia aos envolvidos, encorajamento a todos por parte do diretor da escola para aderirem às medidas sanitárias e para registrarem violações do protocolo, além de detalhar o cronograma escolar diariamente para todos os envolvidos. Por adição, definir o planejamento para estudantes com necessidades especiais e, finalmente, abrir o sistema híbrido de aprendizagem (remoto e presencial).
Os pesquisadores, em função de todos os dados obtidos, concluíram categoricamente que estes indicavam que as escolas poderiam abrir com segurança se elas desenvolvessem e aderissem às políticas específicas de prevenção à Covid-19. As evidências desse estudo que ora emerge na segunda onda da pandemia revela um ponto muito importante sobre a temática aqui estudada: as crianças podem ser significativamente menos prováveis de serem infectadas que os adultos. A partir disso, governos e dirigentes escolares poderiam permitir a volta presencial às escolas desde que, como recomendado pelo consenso intitulado “Reopening K-12 Schools During the COVID-19 Pandemic Consensus Study Report from the National Academies of Sciences, Engineering, and Medicine (2020)”, publicado nos Estados Unidos, estratégias para limitar a transmissão do Corona Vírus dentro das escolas, quando professores, alunos e demais funcionários estejam todos presentes, sejam implementadas, monitoras e imediatamente modificadas, se necessário, em função da incidência de casos, se estes ocorrerem.