Tribuna Ribeirão
Cultura

Os 250 anos de Ludwig van Beethoven

JOSEPH KARL STIELER/DOMÍNIO PÚBLICO

João Marcos Coelho
Especial para a Agência Estado

Há 250 anos, em 17 de de­zembro de 1770, nascia, na ci­dade de Bonn, na Alemanha, um dos maiores nomes da his­tória da música: Ludwig van Beethoven. Ele não só revolu­cionou a música clássica, como também deixou um legado que até hoje influencia composito­res dos mais diversos estilos musicais. O compositor mor­reu em 26 de março de 1827, aos 56 anos.

A dramaturga inglesa Enid Bagnold (1889-1981) perguntou a uma feminis­ta que conselho ela daria a uma dona de casa de 23 anos de idade que, tendo perdido quatro filhos, engravidasse outra vez de um marido al­coólatra e violento. “Eu insis­tiria para que ela interrom­pesse a gravidez”, respondeu a feminista. “Neste caso”, concluiu Bagnold, “você teria abortado Beethoven”.

O menino nasceu, de fato, em família musical. E apanhou muito do pai Johann, seu pri­meiro professor de música, para estudar piano: eram ra­ros os dias em que não levava chicotadas ou ficava trancado no porão de castigo por não estudar direito piano, violino ou teoria musical. Ou então era acordado à meia-noite e obrigado a estudar durante a madrugada.

Pois é, a vida era duríssima para o menino Ludwig Beetho­ven (o van, signo de nobreza, foi por ele acrescentado para frequentar com mais facilida­de os círculos da elite vienense, farsa desmontada quando teve de lutar na justiça pela adoção do sobrinho). Mesmo assim, ele fez história.

Em pouco mais de três décadas vivendo em Viena – entre 1792 e 1827 –, o com­positor transformou-se não só no mais celebrado e pres­tigiado músico da Europa, como alterou radicalmente o modo como se compõe e se ouve música. Adorou Napo­leão Bonaparte (1769-‘1821) em “Sinfonia Eroica” e depois o odiou quando autocoroou­-se imperador da França.

Permaneceu fiel aos ideais da Revolução Francesa. Mas, aos poucos, o ardor militante deu lugar a mensagens utópi­cas que abraçou ao incorporar os versos de Friedrich Schiller (1759-1805) ao movimento fi­nal de sua “Nona Sinfonia” – a mais celebrada obra orquestral de todos os tempos.

Beethoven nasceu há 250 anos. A cada efeméri­de, um novo músico surgia. No centenário, em 1870, por exemplo, Richard Wagner (1813-1883) transformou o que seria uma deficiência, sua surdez, na razão de sua genialidade: “Um músico pri­vado do sentido do ouvido! Pode-se imaginar um pintor cego? Mas conhecemos um espectador que ficou cego. Tirésias que, a partir de sua cegueira, percebe com seu olho interior o fundamento de toda aparência! (…)

Beethoven se parece com ele, este músico que não se aborrece com os ruídos da vida e escuta apenas as harmonias de seu foro íntimo”. Palavras impactantes. O filósofo Peter Szendy considera que ali Wagner ungiu a interpre­tação da surdez de Beethoven como “divina”: Beethoven tem clarividência auditiva, ou me­lhor, “clariaudiência”.

Saltamos um século e, em 1970, no bicentenário, um emérito especialista em Bee­thoven, o pianista Friedrich Gulda (1930-2000), apare­ceu nu para tocar sonatas do compositor em recital come­morativo na majestosa Musi­kverein de Viena.

Naquele mesmo 1970, o compositor Mauricio Kagel (1931-2008) concebeu Ludwig van, um filme em branco e preto que denuncia a comercialização de Beethoven, transforma­do em produto de consumo, como os bonequinhos do “gê­nio furioso” feitos de marzipã, ao lado de pastéis Schiller. Ka­gel usou a palavra “musealiza­ção” para bradar contra a escu­ta banalizada de sua obra.

Ora, com ou sem efemé­rides, a música de Beethoven é sempre a mais tocada no mundo inteiro. Assim, Kagel propôs que sua música não seja tocada durante um ano inteiro, “porque só assim, de­pois de certo tempo, voltando às salas de concerto, os nervos acústicos conseguirão de novo reagir a ela”. Não era um ata­que ao compositor, mas ape­nas uma defesa de Beethoven contra seus admiradores (pa­rafraseando o célebre artigo de “Adorno sobre Bach”, em 1950, no bicentenário de sua morte).

No segundo semestre de 2019, a regente Marin Alsop encerrava seu ciclo à frente da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp) dando a largada ao projeto “Global Bee­thoven”, viabilizado pela Fun­dação Weill do Carnegie Hall de Nova York. Alsop regeria a Nona em nove países, com os corais entoando a Ode à Ale­gria em suas línguas. O projeto abortou logo após a largada.

Cruel ironia – A pandemia transformou em realidade o desejo de Kagel. Uma ou outra sinfonia do compositor foi to­cada para meia dúzia de gatos pingados na Sala São Paulo e em outras espalhadas pelo Bra­sil. Nossos “nervos acústicos” foram obrigados a descansar este ano, não só de Beethoven, mas de toda música ao vivo.
Beethoven transformou-se não só no mais celebrado e prestigiado músico da Europa, como alterou radicalmente o modo como se compõe e se ouve música

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