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O Bem Viver

Acabo de ler “O Bem Viver”, do economista e pensador equatoriano Alberto Acosta. Poderia ter lido antes, pois o livro estava dormindo em pé na minha estante há pelo menos três anos. É um divisor de águas. A edição que tenho, preparada pelas editoras Autonomia Literária e Ele­fante, é de 2016. A capa e contra capa trazem ilustrações de pinturas ru­pestres da Serra da Capivara (PI) num papel rústico que lembra papelão. Muito simpática! O subtítulo, “uma oportunidade para imaginar outros mundos”, revela a busca que precisamos fazer nesta curva da História.

No Equador, el Buen Vivir; na Bolívia, el Vivir Bien, se tornaram preceitos constitucionais. O objetivo é a transformação do mundo a partir dos Direitos Humanos e dos Direitos da Natureza. A Constituição de Montecristi, aprovada em 2008 no Equador, traz em parte de seus artigos, pressupostos que se apresentam como alternativa ao desenvolvimento e a intenção de superaçãodo capitalismo. Não se trata de um desenvolvimento alternativo, pois refuta-se o crescimento econômico. Propõe-se que a vida prospere alicerçada na solidariedade e na sustentabilidade.

À Natureza, local onde a vida acontece, é garantido o direito integral de sua existência e regeneração. Isso se dá com o conhecimento e a proteção de seus ciclos vitais, suas funções e seus processos evolutivos. A economia deve submeter-se à ecologia e reaproximar-se de sua base biofísica, pois é esta que garante a permanência das atividades produ­tivas. Não há economia que floresça em regiões onde as pessoas e seu meio estejam agonizando. Não se pode levaras fontes básicas da vida à exaustão! O Bem Viver propõe a substituição da ordem antropocêntrica para a sociobiocêntrica.

Nos capítulos centrais do livro são apontadas mudanças a serem encaradas na difícil tarefa de fazer a transição energética, econômica e ecológica. Cita-se a seguir algumas delas.
Apregoa-se a construção de estados plurinacionais. Para descolo­nizar é necessária outra concepção de nação. O Estado “moderno” e liberal, herdeiro de esquemas oligárquicos, embranquecido e patriar­cal, que apaga diversidades, que ignora e reprime culturas e línguas de comunidades locais, deve ser substituído por um conjunto de direitos coletivos que afirmem distintas formas de pertencimento ao território. A plurinacionalidade se constrói com democracia inclusiva, práticas de interculturalidade e declaração pública do desejo de incorporar perspec­tivas distintas de sociedade.

O Bem Viver recomenda o decrescimento planejado do extrativismo. A megamineração, o agronegócio e a extração de combustíveis fósseis, são modalidades coloniais que mantém muitos países dependentes e subdesenvolvidos. As commodities devem ceder lugar às manufaturas, à agroecologia, ao turismo, ao conhecimento, às tecnologias sociais e à conservação e recuperação do ambiente. O Brasil, por exemplo, é um país rico com milhões de pobres. A exclusão causa sofrimentos constan­tes e inimagináveis a milhões de brasileiros.

O contrapoder se dá na diversificação da economia. As necessidades e as satisfações devem se pautar pela suficiência e não pela eficiência a serviço da acumulação. Faz-se necessário a valorização das capacidades humanas e recursos produtivos locais. A via autocentrada é a construção de níveis crescentes de influência no âmbito local. Os acordos comerciais intercontinentais são profundamente insustentáveis e excludentes.

O Bem Viver surge de experiências de vida dos povos andinos e ama­zônicos em conjunto com vários pensadores latino-americanos. Alberto Acosta, que também foi ministro de Energia e Minas do Equador, é o autor das ideias e propostas aqui relatadas de modo muito breve. Ele é um dos protagonistas desse movimento. Há muitas outras publicações que se somam a esta que acabo de compartilhar com vocês. No Brasil, a Fundação Rosa Luxemburgo é um espaço permanente de debate sobre o Buen Vivir.

A próxima leitura sobre o tema será “La osadia de lo nuevo: alternativas de política econômica”. E fecho com Mahatma Gandhi: “Primeiro, eles te ig­noram. Depois, riem de você. Depois, lutam contra você. Então, você vence”.

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