Nesta semana uma luz vermelha foi acessa em cada Unidade Básica de Saúde do Brasil e não era dos giroflex das viaturas do Resgate ou do Samu. Em pleno período eleitoral e, ainda, sob o impacto das milhares de mortes causadas pela covid-19, secretários de saúde, profissionais do setor e considerável parcela da população iniciaram uma mobilização para preservar o Sistema Único de Saúde. Tudo por conta de um decreto publicado pelo presidente da república e logo revogado.
Na administração pública e na vida privada, dois princípios sempre devem ser observados: oportunidade e conveniência. O caso citado é um típico exemplo de ausência de ambos. Que o SUS possui mazelas e problemas sérios que exigem soluções é inegável. Da mesma forma não dá para negar sua importância, especialmente para a população mais fragilizada.
Visto como deficitário e problemático, sempre despertou o interesse das operadoras e empresas do setor privado de saúde, nacional e internacional. Ocorre que, diferente de outros setores, existe uma legislação determinando que as decisões relativas ao SUS não sejam tomadas unilateralmente. É necessário um consenso tripartite (união, estados e municípios). O decreto publicado, além de desrespeitar a norma, excluiu o Ministério da Saúde da discussão.
O SUS completou 30 anos em setembro e garantiu o acesso à saúde como direito universal, de responsabilidade do Estado. Segundo dados do IBGE de 2019, sete em cada dez brasileiros, ou mais de 150 milhões de pessoas, dependem exclusivamente do SUS para tratamento. O índice tornou-se muito maior após a pandemia. Se a análise for por estado, vamos perceber que o número de pessoas com plano de saúde privado é mínimo: Maranhão (5,0%), Roraima (7,4%) e Acre (8,3%). Os números de atendimentos na rede pública são gigantescos, só de internações por mais de 24 horas foram 8,9 milhões de pessoas.
Segundo o questionado decreto as UBS, porta de entrada do SUS, seriam incluídas no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), criado em 2016. Para o governo seria uma forma de concluir obras paradas, já para o Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass) a proposta do governo “deixa sérias dúvidas quanto a seus reais propósitos”.
A saúde é uma das maiores preocupações dos brasileiros e está presente em quase todos os discursos políticos, porém poucos apresentam soluções concretas. Os profissionais da saúde perceberam o quanto a política interfere nas ações de saúde e neste ano, mais de 19 mil concorrentes ao executivo e legislativo declararam ter ocupações na área, como auxiliares e técnicos de enfermagem, fisioterapeutas e fonoaudiólogos.
A luta pelo fortalecimento do SUS deve ser de todos, especialmente os que viveram em um passado recente, quando somente quem possuía carteira profissional assinada tinha direito à assistência médica, pelo antigo INPS. A grande massa tinha duas opções: pagar pelo atendimento ou fazer fila na porta dos poucos hospitais públicos ou filantrópicos. Desempregados e informais eram tratados como indigentes. Nosso empenho é para que esse tempo não seja reproduzido nunca mais.
O SUS é um patrimônio do povo brasileiro e nenhum governo pode sonhar ementregá-lo ao setor privado. A sociedade não pode se omitir. É tempo de dialogar e conscientizar a todos sobre a grave ameaça que ronda.
Salvar vidas, sim! Privatizar o SUS, não!