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Reynaldo Gianecchini: ‘Acho que hoje o Edu não seria cancelado’

Por Adriana Del Ré

Enquanto muitos artistas são vistos em lives ou compartilhando mais suas rotinas nas redes sociais nesta quarentena, Reynaldo Gianecchini tem preferido ficar “mais quietinho”, como o próprio ator paulista, de 47 anos, diz em entrevista, por Zoom, ao Estadão. “Nesta pandemia, tem de ser respeitado o momento de cada um, porque são várias as fases que a gente passa”, acredita ele, que participa da microficção Amor de Quarentena, disponível ao público pelo WhatsApp a partir do dia 14.

O nome do ator, no entanto, voltou a ganhar destaque com o anúncio da reprise da novela Laços de Família, de Manoel Carlos, exibida entre 2000 e 2001 e que vai ao ar no Vale a Pena Ver de Novo a partir de amanhã, 7, na Globo, juntamente com a última semana de Êta Mundo Bom! (e que entra no Globoplay dia 14). Sucesso no horário nobre, o folhetim rendeu momentos marcantes, como a cena de Camila (Carolina Dieckmann) raspando a cabeça durante seu tratamento contra leucemia, e alçou à fama Gianecchini, em seu primeiro papel na TV, como o personagem Edu, que vivia um triângulo amoroso com Camila e Helena (Vera Fischer), filha e mãe.

Você já disse em entrevistas que assistiu ao primeiro capítulo da novela sozinho, não queria ver com ninguém do lado (por não ter experiência na TV). Agora, 20 anos depois, você acha que terá um olhar mais benevolente para esse ator em início de carreira?

O tempo faz ter um olhar muito bom sobre as coisas, né? Na época, eu me machucava muito me assistindo, até porque é muito estranho você se ver pela primeira vez. Eu já consumia muito teatro, TV, cinema. Eu tinha supernoção do que era ser um bom ator. Então, eu tinha supernoção de que eu estava muito aquém, muito verde. Hoje, olho com muita complacência isso, porque sei que é muito difícil você não ter experiência. Eu me vejo, acima de tudo, muito corajoso por ter bancado esse desafio. Agora que tudo passou e estou mais maduro, acho importante os erros também Nada é absoluto. Tudo é um processo.

Na época, você fazia teatro, e a TV sempre foi uma grande exposição. Quais dilemas que enfrentou para aceitar fazer Edu?

Eu tinha acabado de voltar para o Brasil, porque eu queria estudar para ser ator, e de cara fui fazer curso. Passei num teste e ganhei meu primeiro papel profissional numa peça do Zé Celso, no Teatro Oficina. Fiz duas peças em seguida. Achei que minha vida era aquilo. Foi nesse contexto que o produtor de elenco, Luiz Antônio Rocha, foi me ver em Boca de Ouro e falou que tinha um papel que era a minha cara. Naquela época, eu não era ligado em televisão, muito menos em novela. Eu estava muito empolgado com o teatro. Falei para o Luiz Antônio: ‘Não vou nem ter tempo, é no Rio, estou aqui em São Paulo’. Aí ele falou: ‘É para fazer par com a Vera Fischer’. Parei e falei ‘oi?’. Eu cresci assistindo a Vera, admirando os trabalhos que ela fez, e achava ela linda. Fui para o Rio, fiz o teste – nem achei que fiz um grande teste. Depois viajei, era Réveillon, fui para fora do País. Quando voltei, fiz uma escala em Los Angeles, e vi um jornal brasileiro que falava que tinha sido definido o próximo papel da novela de Manoel Carlos: o papel do Edu seria do Rodrigo Faro. Voltei para o Brasil, (o diretor) Ricardo Waddington me ligou e disse: ‘O papel é seu’. Falei: ‘Você tem certeza? Nunca fiz nada na TV’. Ele, muito honestamente, disse: ‘Não tenho certeza de nada, mas o Manoel Carlos quer você de qualquer jeito’. O Manoel Carlos me contou que ele pegou todos os testes, chamou a filha, a mulher dele, as amigas, reuniu todas, passou o teste de todo mundo e ele disse que fui unanimidade. Foi aí que ele bateu o pé que seria eu.

Que memória tem dessa estreia?

Estreei muito nervoso, muito inseguro. Foi o ano mais turbulento da minha vida. Eram horas e horas de trabalho. Fora isso, tinha a minha cobrança, eu me machucava muito, e mais difícil ainda era a perda da privacidade, porque tenho uma natureza muito reservada. De repente, você está em todo lugar da mídia, as pessoas falando de tudo a seu respeito, te criticando e falando da sua vida pessoal. Sinto que nesse ano vivi dez anos. Acho que saí ganhando muita coisa, mas que não foi fácil, não foi.

Carolina Dieckmann e você já falaram que, a princípio, não houve empatia entre os dois, mas isso mudou com o tempo, não?

Cheguei com muita vontade de trocar, muito humildemente, e acho que a Carol, de cara, talvez não acreditou. Depois, ela me falou que esperava chegar um cara moreno, musculoso, Rio de Janeiro, e aí chegou um paulista, magrelo, branquelo e de São Paulo. Ela, muito franca, olhou para mim e falou: ‘É ele?’ (risos). A gente já riu muito disso. A gente teve uma história linda junto, de troca. Mas foi engraçado. Na hora, realmente não me senti acolhido tanto por ela. Mas logo em seguida já quebramos isso, e fomos que fomos.

Há temas tratados na novela que repercutiriam se houvesse redes sociais na época – e talvez isso aconteça agora. O que acha que vai repercutir após 20 anos?

A novela não é datada. Tenho a impressão de que nada ficou velho, a gente continua discutindo as mesmas coisas, até essa questão do social, de falar da leucemia. Vai continuar sendo importante ainda falar do transplante, de doação de medula.

E em relação ao triângulo amoroso que se formou entre filha, mãe e Edu? Carolina disse recentemente que, se fosse hoje, ela seria cancelada nas redes sociais. Você acha que o Edu também seria cancelado?

A Carol fala isso porque na época tinha muita gente que achava a personagem chatinha. E hoje em dia tem o cancelamento. Acho que o Edu não seria cancelado, mas também sabe por quê? As pessoas, geralmente, põem muito mais a culpa na mulher. Isso é uma coisa a ser discutida. Quando envolve traições, não sei o que: ‘ah é feio para a mulher’. E, para o homem, não fica tão feio. A gente já viu vários casos. Tenho essa sensação que é mais cruel com a mulher.

Uma das cenas mais emblemáticas da novela, e que deve ser comentada novamente quando for ao ar, foi da personagem Camila raspando o cabelo. Como se lembra dessa repercussão?

Acho que parou o Brasil. Nessa época, vale lembrar que, como não tinham outras plataformas nem muita internet, as novelas tinham audiência absoluta. Então, vários capítulos batiam recordes em cima de recordes. Essa foi uma cena que parou o Brasil, porque era muito emocionante. É um assunto delicado, a possibilidade da morte. Sempre é muito comovente, porque ainda não entendemos a morte. Muita gente não aceita, parece aniquilamento, porque se acredita que a gente é isso aqui: essa mente e esse corpo. E aí o que vai acontecer depois que isso acabar? As pessoas não sabem lidar. Então, toda vez que a possibilidade da morte surge, parece um golpe do destino, quando não é. A única certeza que se pode contar é que a gente vai morrer. A gente age sempre como se foi pego de calça curta. Sei de experiência própria, vivi isso.

A batalha contra o câncer é tratada na novela, e anos depois você enfrentou isso na sua vida. Em algum momento, você fez conexão com a personagem de Carolina?

Muito. Quando começou a cair meu cabelo e resolvi raspar, na hora, só vinha a Carol na minha cabeça. E a primeira coisa que fiz foi pegar o telefone e deixar uma mensagem para ela falando: Carol, estou vivendo aquela cena que você fez tão lindamente e, ao contrário de você, não estou chorando, me olhei no espelho e achei que tenho cara de guerreiro. Não tinha como não associar com ela. E lembro que o recado que ela me deixou de volta me fez chorar muito, fiquei muito emocionado com o amor que senti vindo dela. Porque, no meu tratamento, o que me emocionava sempre era a manifestação do amor, eu só chorava quando via isso. Não chorava de medo, de sofrimento por nada. Eu estava muito aberto para receber e dar amor.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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