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Fernando de Noronha retoma turismo com infectados da covid-19

AGÊNCIABRASIL

O governo de Pernambuco e a administração de Fernando de Noronha autorizaram a retoma­da gradual da visitação turística ao arquipélago de Fernando de Noronha desde o primeiro dia de setembro. Contudo, apenas pessoas que provarem já terem sido infectadas pelo novo coro­navírus, e que estejam recupera­das, poderão ingressar no distri­to pernambucano.

A medida se insere na oi­tava etapa do Plano de Convi­vência com a doença, que tam­bém permitiu desde o último dia 31, a retomada do comércio de praia e a reabertura dos mu­seus e espaços de exposições de cidades da chamada Macrorre­gião de Saúde 1, que contempla a Região Metropolitana do Re­cife e a Zona da Mata.

Para visitar uma das 21 ilhas que formam o arquipélago de Fernando de Noronha, o turista terá que apresentar às autorida­des locais exames que indiquem a presença de anticorpos contra a covid-19. Anticorpos, ou imu­noglobinas, são proteínas que o sistema imunológico humano produz quando o organismo é alvo da ação dos chamados an­tígenos – substâncias estranhas ao organismo, tais como vírus e bactérias, às quais os anticorpos tentam neutralizar e eliminar.

DIVULGAÇÃO

Para comprovar a presen­ça de anticorpos, serão aceitos tanto os resultados do teste molecular (RT-PCR), desde que realizado há mais de 20 dias, quanto os dos exames so­rológicos (IgG), feitos menos de 90 dias antes da data do em­barque. Os exames deverão ser apresentados durante o proces­so de pagamento da Taxa de Preservação Ambiental (TPA), que agora só pode ser feito pela internet, até 72 horas antes do viajante embarcar com destino ao arquipélago. Anexado ao re­cibo de pagamento da taxa, o interessado deverá enviar o re­sultado do exame confirmando que já teve a covid-19.

A visitação turística ao ar­quipélago foi proibida no fim de março. A solução encontra­da para permitir a retomada da atividade, no entanto, divide opiniões, já que cientistas ainda tentam compreender por quan­to tempo o organismo de uma pessoa infectada pelo novo co­ronavírus consegue produzir anticorpos contra a doença.

Sucessivas pesquisas vêm apontando que os níveis de anticorpos encontrados em pacientes recuperados da co­vid-19 diminuem rapidamen­te entre dois e três meses após a infecção. Além disso, apesar de serem considerados raríssi­mos, casos de reinfecção já fo­ram confirmados em diferen­tes países – no último dia 26, o Ministério da Saúde negou a existência de qualquer caso de reinfecção no Brasil.

ALYSON DOS SANTOS ABREU/WIKIMEDIA

Infectologista
Consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), a médica Raquel Stucchi con­sidera que a exigência dos visi­tantes se submeterem a exames pode proteger os moradores do arquipélago, ao mesmo tempo que permitirá a retomada da principal atividade econômica local. “É preciso levar em conta que Fernando de Noronha sem­pre recebeu uma quantidade pré-determinada de visitantes. Logo, as aglomerações são con­troladas desde sempre. Partindo disso, acho que o turista se sub­meter ao PCR vinte dias antes de viajar pode sim proteger os moradores”, declarou.

Para ela, no entanto, o go­verno deveria exigir apenas testes RT-PCR, e não o IgG, menos confiável. E, adicional­mente, aplicar aos visitantes um questionário prévio como forma de identificar pacientes assintomáticos. “O PCR po­sitivo poderia estar atrelado a um questionário sobre sin­tomas da covid-19, como os sintomas respiratórios, a falta de olfato e de paladar recentes. Já o exame sorológico não é um bom critério para mostrar contato prévio [com o vírus], pois é um exame limitado, que apresenta muito falso-positivo [quando o teste acusa que o indivíduo tem anticorpos, em­bora, de fato, não tenha con­traído a doença]”, acrescentou a especialista, destacando a importância de que as reco­mendações de distanciamento social sejam respeitadas.

“Mostrar, com o PCR po­sitivo, que já teve a doença e responder, por meio de um questionário, que não está com nenhum dos sintomas da covid-19, dá uma certa tran­quilidade. E para proteger os moradores, é preciso manter os mesmos cuidados recomenda­dos para o restante da popula­ção, ou seja, manter o distan­ciamento, evitar aglomerações, usar máscaras e cuidar da hi­giene”, disse a infectologista.

CÁSSIO DINIZ/PIXABAY

OAB
Presidente da Comissão Especial de Bioética e Biodi­reito da Ordem dos Advoga­dos do Brasil, Henderson Fii­rst de Oliveira, disse ter ficado “assustado”. “O passaporte sanitário é usado em situações muito especiais, como forma de preservar uma comuni­dade ou grupo, quando há a certeza quanto à imunização definitiva. Isto funciona com uma série de doenças, mas nada indica que funciona com a covid-19”, disse Fiirst.

Para o advogado, a legislação brasileira não prevê a exigência da apresentação dos exames de saúde neste caso específico. “Os passaportes são instituídos por meio de leis, já que, além de restringirem a liberdade, afetam a privacidade das pessoas. No Brasil, a lei que trata das medi­das de enfrentamento ao novo coronavírus não prevê este tipo de ação”, ressaltou o especialista. “Me parece um equívoco ins­tituir um passaporte sanitário quando sua eficiência não está comprovada e sem que isto este­ja autorizado por lei. Um equí­voco ético, jurídico e sanitário que viola a Constituição Fede­ral e que pode ser questionada juridicamente”, ressaltou Fiirst, apontando o risco desta iniciati­va ser copiada em outras esferas.

“Este é um exercício de biopoder que normaliza não só a expansão do Estado para cima de direitos fundamen­tais, no caso, a privacidade, como também o fato de uma parte da população ser consi­derada melhor que outra por uma característica biológica”, concluiu advogado.

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