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Rede ‘TERRORISTA’ de desinformação ecoa no Brasil

MARC NOZELL/WIKIMEDIA

Considerado ameaça do­méstica de terrorismo nos Es­tados Unidos pelo potencial de incentivar violência por parte de extremistas, o movimento QA­non (sigla para “Q Anônimo”) foi adaptado ao Brasil e ganha adeptos entre radicais nacionais.

A versão brasileira da teo­ria da conspiração criada pela extrema-direita americana tem sido cultivada em fóruns bolso­naristas e alimenta campanhas de “fake news”.

Uma reportagem especial sobre o tema foi realizado pelo jornalista da Agência Estado, Vi­nícius Valfré, na segunda-feira (31), e fez com que, na terça-fei­ra, o Facebook retirasse várias páginas do ar (ver abaixo).

São alvos das campanhas do QAnon, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e até es­tratégias sanitárias na pandemia, como o uso de máscaras de pro­teção e “termômetros de testa”.

Em síntese, os adeptos do QAnon acreditam que o presi­dente Donald Trump foi escolhi­do por um exército secreto para uma batalha contra governantes ocultos do mundo. É um herói patriota que aceitou enfrentar uma rede de tráfico humano e pedofilia que envolve desde políticos da esquerda, atores de Hollywood, o Vaticano e o bilio­nário húngaro George Soros.

A origem do movimento é obscura. Os adeptos seguem um anônimo que se identifica como “Q” para lançar mensagens ci­fradas em um fórum da deep web – parte da internet escondi­da de ferramentas de busca para preservação do anonimato.

A fonte primária da teoria jamais fez qualquer menção a Bolsonaro, mas apoiadores do presidente trataram de incluir o brasileiro entre os líderes mun­diais escolhidos pelo “Q” para “salvar o mundo”.

Em abril deste ano, por exemplo, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, postou nas redes uma foto ao lado do pai e dos irmãos comendo milho. Para adeptos do movimento QA­non, mais do que uma mera reunião de família, a imagem era uma prova de que Bolso­naro é o escolhido. Dias antes, o “Q” havia publicado a cena de uma plantação de milho. “Junte as peças do quebra-cabeça”, di­zia a mensagem postada pelo perfil “Revelação Total”.

Levantamento da Agência Estado identificou que, nos últimos 12 meses, ideias do movimento foram propaga­das em páginas, grupos e ca­nais de Facebook e YouTube que, juntos, somam cerca de 1,7 milhão de seguidores ou membros. Por meio da ferra­menta CrowdTangle, a pes­quisa considerou apenas as publicações em português.

Os “conspiracionistas” não estão restritos ao anonimato da internet. No ato de 21 de junho, na Esplanada dos Ministérios, apoiadores de Bolsonaro leva­ram cartazes ostentando a letra “Q” e também “wwg1wga”, sigla que identifica o movimento e re­presenta em inglês a frase “onde vai um vamos todos”.

Outra manifestante carrega­va os dizeres “Pizzagate é real”, em referência à conspiração que serviu de gatilho ao QAnon. Em 2016, trumpistas inventaram que Hillary Clinton, então ad­versária de Trump nas eleições americanas, e seus principais auxiliares controlavam um es­quema de tráfico de crianças de dentro de uma pizzaria, em Washington. Influenciado pela farsa, um homem foi ao local e disparou uma metralhadora.

O crescimento no território americano acendeu um aler­ta. Relatório do FBI que veio a público em agosto de 2019 apontou que ideias como as do QAnon “muito provavelmente” cresceriam e levariam grupos e indivíduos extremistas a co­meter atos criminosos ou vio­lentos”. A agência classificou o movimento como potencial ameaça interna de terrorismo.

Ataques
Integrantes do STF são alvos recorrentes dos fóruns conspira­tórios no Facebook com infor­mações caluniosas. Publicações buscaram ligar ministros a “or­gias com garotas” organizadas pelo médium conhecido como João de Deus, sustentam que a força de Trump é capaz de in­fluenciar decisões do Supremo e insinuam que o Judiciário cons­pira contra Bolsonaro.

Entre as páginas que repro­duzem conteúdo QAnon estão algumas que se apresentam como “Aliança com o Brasil”, “Brasil Acima de Tudo” e “Bol­sonaro direitista”.

Em vídeos com “explica­ções” sobre a teoria é comum a defesa da “hidroxibolsonaro” no combate à covid-19. As páginas costumam ser mantidas por perfis falsos ou apócrifos.

A reportagem pediu entre­vistas a quatro pessoas que são identificadas nas redes sociais como referências ao QAnon no Brasil, mas não obteve resposta. Em seus perfis, eles alegam que a “mídia mainstream” trabalha contra a “verdade secreta”.

O movimento é político, mas não só. Reportagem de junho da revista The Atlantic classificou o fenômeno como “uma nova religião”. No Brasil, o QAnon é disseminado em grupos que discutem temas esotéricos e místicos.

O psicanalista e professor da Universidade de São Paulo (USP) Christian Dunker afirma que teorias conspiratórias bus­cam a simplificação de fenôme­nos que as pessoas não conse­guem explicar com o repertório que detêm. “A paranoia resolve as coisas porque ela vai dizer que existe um plano maior, um sen­tido. E diz indiretamente para a pessoa que ela é muito impor­tante porque passou a saber que o mundo se divide, por exemplo, no combate entre as trevas e o bem. Esse efeito de relevância, de protagonismo, é muito tenta­dor”, disse o psicanalista.

Facebook derruba páginas
O Facebook removeu da rede social alguns dos principais grupos e páginas que promoviam o movimento conspiratório QAnon no Brasil. As suspen­sões ocorreram após a reportagem do Estadão, na segunda-feira, revelar a adesão à versão tupiniquim da teoria da conspiração norte-americana.

Ao todo, a reportagem constatou que saíram do ar grupos e páginas que promoviam a conspiração e tinham, juntos, 572 mil membros ou seguidores.

Somente o maior grupo de adeptos da QAnon reunia mais de 22 mil membros. Páginas identificadas como “oficiais” e dedicadas à publicação de conteúdos agressivos ou falsos também foram encerradas.

O Facebook aceita os conteúdos conspiratórios, desde que não celebrem ou incentivem comportamentos violentos. A empresa não detalhou os motivos específicos que provocaram os banimentos, mas confirmou a ação a partir da reportagem.

“O Facebook removeu cinco Páginas e Grupos por violações de suas políticas. Reforçamos, ainda, que conteúdos associados com o movimento QAnon serão removidos quando identificadas discussões de potencial violência. Agradecemos ao Estadão por ter sinalizado os conteúdos violadores”, disse a rede social, em nota.

A empresa não informou os links atingidos. Entre as páginas que promoviam a farsa até a semana passada e agora estão indis­poníveis, estão “Brasil o País Do Futuro”, “O Vetor Oculto”, “Q Anon Brasil”, “Revelação Total” e “Marcos Mendes”.

Nesses fóruns havia compartilhamento de campanhas que inven­tavam ameaças à vida dos que usam máscaras de proteção facial e dos que se submetem à aferição de temperatura com termômetros de infravermelho. Além disso, diversas publicações buscavam associar ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) a “orgias com garotas”.

Em 19 de agosto, o Facebook havia anunciado a remoção de 790 grupos ligados ao movimento nos Estados Unidos. As páginas brasileiras que agora foram retiradas do ar não haviam sido alcan­çadas pela decisão anterior. Com o impacto, extremistas passaram a reconvocar adeptos para redes no Instagram e Telegram.

YouTube atualiza política de discurso do ódio
O YouTube declarou que desde que atualizou sua política de discurso de ódio, em junho de 2019, removeu “dezenas de milhares” de vídeos relacionados ao QAnon e encerrou “centenas” de canais com conteú­do sobre o tema por violarem diretrizes de comunidade.

“Além disso, quando os usuários vêm ao YouTube e pesquisam tópicos sujeitos a desinformação, fornecemos contexto adicional e destacamos vídeos de especialistas ou fontes de notícias confiáveis.” Procurado, o Palácio do Planalto não se manifestou ao jornal O Estado de S. Paulo.

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