Tribuna Ribeirão
Política

Bolsonaro não explica depósito para a mulher

Foto: Rovena Rosa/ Arquivo/Agência Brasil

Jornalistas, artistas, políti­cos e outros usuários do Twit­ter repetiram a pergunta feita pelo jornalista de O Globo ao presidente da República, Jair Bolsonaro, na tarde de domin­go, 23 de agosto, em Brasília. O repórter questionou por que a primeira-dama Michelle Bol­sonaro recebeu R$ 89 mil de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro (Republi­canos-RJ), ambos investigados no “escândalo da rachadinha”.

Em resposta, o presidente da República falou que tem “vontade de encher de porra­da” o jornalista. A frase “Presi­dente @jairbolsonaro, por que sua esposa Michelle recebeu R$ 89 mil de Fabrício Quei­roz?”, acompanhada da hashtag #RespondeBolsonaro, começou a ser compartilhada por jorna­listas na rede social e logo teve a adesão de outros usuários, de artistas, como Caetano Veloso, e políticos, como o vereador Eduardo Suplicy (PT).

Os termos “Fabrício Quei­roz” e “Michelle” estavam en­tre os mais comentados do Twitter no final da noite de domingo. O presidente não se manifestou sobre o assun­to. A resposta agressiva de Bolsonaro ao jornalista foi dada na tarde do domingo, enquanto o presidente visita­va uma feirinha de artesanato em frente à Catedral Metro­politana de Brasília.

Jornalistas que acompa­nhavam a visita questiona­ram se a declaração era uma ameaça, mas o chefe do Exe­cutivo não respondeu mais e seguiu com a visita. O Palácio do Planalto foi questionado pela reportagem sobre o teor da frase, mas respondeu que não iria comentar.

Entidades de imprensa re­pudiaram a ameaça e cobra­ram uma “reação contunden­te” dos Poderes Legislativo e Judiciário. Lideranças do Con­gresso Nacional, dirigentes partidários e representantes do Poder Judiciário criticaram o militar da reserva.

Nas manifestações, as au­toridades consideraram a fala do presidente um atentado contra a liberdade de impren­sa. O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirma que a liber­dade de imprensa é um valor inegociável na democracia e disse esperar que o presidente “retome a postura mais mode­rada que vinha mantendo nos últimos 66 dias”.

No Twitter, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes consi­derou “inadmissível” a censura de jornalistas pelo “mero des­contentamento do conteúdo veiculado”, pontuando que a liberdade de imprensa é uma das bases da democracia.

Líder da oposição no Se­nado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) afirmou que vai apresentar uma denúncia à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organi­zação dos Estados Americanos (OEA) sobre a violência contra a liberdade de expressão.

Ele também repetiu a per­gunta feita pelo repórter em suas redes sociais, marcando o presidente, aderindo a um mo­vimento iniciado por jornalistas. O líder do PSB na Câmara, o de­putado federal Alessandro Mo­lon, criticou Bolsonaro e afir­mou que “o que se espera de um presidente é que ele se comporte à altura do cargo que ocupa”.

Molon ainda disse que as ameaças à imprensa são ame­aças à própria democracia. “Além disso, Bolsonaro tenta esconder o que aos poucos está vindo à tona: seu envolvi­mento num esquema crimino­so.” A deputada federal Natália Bonavides (PT-RN) afirmou ter protocolado no STF uma denúncia contra Bolsonaro por constrangimento ilegal pela ameaça.

Ela também questionou o presidente sobre o depósito de Queiroz a Michelle e chamou o presidente de “delinquente contumaz”. Ex-presidente do Partido Novo, João Amoêdo também entrou na corrente e questionou o presidente sobre o pagamento de Queiroz a Mi­chelle pelas redes sociais.

Amoêdo também cobrou que “todos os mandatários e futuros candidatos” do partido questionassem o presidente. Pelas redes sociais, o MDB do ribeirão-pretano Baleia Rossi (SP) cobrou uma retratação do presidente da República ao re­pórter do jornal carioca.

O partido também afirmou defender a liberdade de im­prensa e o respeito aos jorna­listas profissionais. Já o PSDB afirmou que o presidente “volta a mostrar apreço por posturas agressivas e antide­mocráticas” e que a atitude não condiz com o cargo ocu­pado por Bolsonaro.

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), também classificou a ameaça como uma atitude “lamentável” e “triste”. “Nem o senhor nem ninguém vai ameaçar a demo­cracia do Brasil. A democracia, presidente Bolsonaro, é mais forte que o senhor”, afirmou.

No momento em que o Brasil registra quase 115 mil mortes decorrentes do novo coronavírus, o presidente Jair Bolsonaro participou do even­to “vencendo a covid-19”, no Palácio do Planalto, na manhã desta segunda-feira (24). Mas, ao invés de fazer menção às ví­timas ou a seus familiares, lem­brou que foi já contaminado e voltou a atacar jornalistas.

“Quando pega num bun­dão de vocês a chance de sobre­viver é bem menor”, insinuou, em uma ofensa velada a quem morreu devido a complicações provocadas pela covid-19. Em mais um gesto covarde (a mar­ca deste governo), porém, não respondeu por que sua mulher recebeu dinheiro de Queiroz.

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