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Adoniran Barbosa completaria 110 anos

REPRODUÇÃO/PORTALEDUCATIVA

Como não ter uma “bai­ta de uma reiva de ir em um samba quando não encontre­mo ninguém?” Ainda mais se esperava “tomar uma frecha­da do olhar” da pessoa ama­da. Um coração que vira uma “taubua de tiro ao álvaro, que não tem mais onde frechar”. Não adianta. Tem que ir embo­ra, “o último trem é agora às 11 horas”. Em ritmo de diversão e nostalgia, os versos e os batu­ques ternos de Adoniran Bar­bosa (nome artístico de João Rubinato), que nasceu em 6 de agosto de 1910 (há 110 anos, em Valinhos-SP), ousavam.

Ele criou um tipo de sam­ba paulistano que enaltecia a memória e o cotidiano de imigrantes pobres e seus des­cendentes. Gente de sotaque misturado e italianado, com as dificuldades dos operários que ajudavam a construir a maior cidade do Brasil. Canções que traziam temática social, como a falta de habitação, a saudade e as dores da maloca.

A música que fez o país identificar bairros como Brás, Mooca, Bixiga, Jaçanã e Casa Verde, por exemplo, é reconhe­cida como marco na história do samba, legado de um artista que brincava com os plurais e se consagrou como singular. Para quem estudou o sambis­ta, “tem outras coisa, vortemo” ao acervo e ao tempo. “Ói nois aqui traveiz”, como cantava. Adoniran morreu em 1982.

REPRODUÇÃO/ ALESP

Para o cineasta Pedro Ser­rano, que dirigiu o filme Ado­niran – Meu nome é João Rubi­nato, ainda hoje visitar e ouvir a obra do músico é reconhecer uma identidade nacional.

“É muito importante que pessoas que não tiveram con­tato (como os mais jovens) possam saber mais sobre quem foi o artista”, disse.

Serrano afirma que se apro­ximou da história de Adoniran ainda na infância. Inicialmen­te, realizou o curta metragem de ficção “Dá licença de con­tar”, baseado em personagens da música Saudosa Maloca.

O documentarista, de 33 anos, revela que tem um pro­jeto no forno para transformar esse curta em um longa, para explorar mais personagens e a riqueza da obra do sambista. “Tem que saber falar errado. Eu sempre gostei de samba. Ninguém queria nada com as minhas letras. Tem que saber falar errado”, dizia o artista.

O sucesso na música veio na década de 1950 quando o grupo Demônios da Garoa cantou Saudosa Maloca. Em 1964, Trem das Onze levou o grupo ao auge. Em 1980, a consagrada cantora Elis Regi­na emprestou nova interpreta­ção para Tiro ao Álvaro.

O programa Na trilha da história, da Rádio Nacional, traz trechos do acervo que des­tacam a irreverência e o pen­samento do artista. “Eu faço samba dos meus bairros”.

No mesmo programa, veiculado em fevereiro deste ano, o cineasta Pedro Serra­no, diretor do documentário sobre Adoniran, explicou as invenções como em Samba do Arnesto (1953). “Ernesto existiu mesmo, mas a história não foi como está na músi­ca”. Ernesto jura que nunca falhou com o compromisso com Adoniran. A história foi criada pelo sambista.

Serrano conta que Adoni­ran foi rejeitado inicialmente como cantor. “Ele entra na rádio como locutor de carna­val. Fazia de uma forma bem humorada e assim se destaca, se torna depois uma grande es­trela como radioator cômico”.

O cineasta detalhou tam­bém a importância da parce­ria com o grupo Demônios da Garoa, que ecoou as canções. “Eles fizeram com que Saudosa Maloca (música de 1951) ficas­se conhecida. Inicialmente, a música não fez sucesso algum. A interpretação diferente, que era gaiata, se tornou um suces­so”. A música, que conta a his­tória de um despejo, ganhou novo tom. O diretor afirma que Elis Regina (que morreu também em 1982) trouxe um olhar sensível e até melancóli­co para a música de Adoniran.

A obra de Adoniran tam­bém foi visitada pelo progra­mete História Hoje, da Rádio Nacional. Na edição, um dos destaques é que, em São Paulo, o músico participou de pro­gramas de calouros no rádio, quando escolheu o nome ar­tístico em homenagem ao seu melhor amigo e ao cantor Luis Barbosa, ídolo do sambista.

O caminho do sucesso co­meçou em 1934 com a música “Dona Boa”. Ele conquistou o pri­meiro lugar no concurso carnava­lesco promovido pela cidade de São Paulo. Em seguida, tra­balhou por mais de 30 anos na Rádio Record como ator cômi­co, discotecário e locutor.

Adoniran cantou a cidade de São Paulo como ninguém. “Prefiro falar peguemo do que pegamos. Prefiro falar fumo do que fomos”, apontou o sambista.

Por falar em história e nos­talgia, outra reportagem da TV Brasil destacou o que seria o “trem das 11”, imortalizado na canção de Adoniran. A estrada de ferro, que passa pelo bairro da Jaçanã, tinha um percur­so do centro de São Paulo até Guarulhos, na região metro­politana. O trajeto funcionou por mais de 50 anos. “Mas o trem das 11 não existia. O acer­to que Adoniran fez foi para a música”, diz Sylvio Bittencourt, que mantinha um museu no Jaçanã com a história do lugar.

Em 2018, Adoniran re­cebeu homenagem póstuma como Cidadão Paulistano. O compositor, que homenageou a cidade com letras trocadas e batuques em ritmo irreveren­te, inventava histórias e pala­vras. A ficção era a construção artística para falar “errado” e do que passava à sua volta. Manuel Bandeira, na década de 20, também enalteceu a linguagem das ruas: “A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros vinha da boca do povo, na língua errada do povo. Língua certa do povo”.

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