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Entre achismos, certezas e incertezas

Recentemente lendo uma entrevista concedida por um respeitado economista, sobre os reflexos da crise do Coronavírus na Economia, a primeira coisa que me veio à cabeça foi Sócrates. Não o nosso saudoso jogador e craque de futebol, mas sim o filósofo que faleceu em 399 a.C. Uma de suas frases mais emblemáticas é a que resume como estou me sentindo em meio a esta pandemia: Só sei que nada sei.

Por isso, quando leio entrevistas como essa, fico intrigado e, confesso, até com uma certa inveja, de quem tem certezas nesse período. Interessante como algumas pessoas têm uma tendência a achar que não existe pandemia. Outras, que existe a pandemia, que ela causa mortes e para salvar vidas é preciso fazer o isolamento, que causa o mesmo número de mortes, mas de maneira mais lenta, ou seja, o isolamento social só serve para achatar a curva e não evitar mortes. Mas essas mesmas dizem que as pessoas têm que se infectar para passar a pandemia. Então vem a dúvida de muitos, não seria melhor que todos já pegassem logo para ela acabar mais rápido? E a resposta vem com outra pergunta. E depois disso não pode vir uma outra onda?

Então, no meu entendimento, o problema não é isolar ou não isolar para diminuir o número de mortos ou contagiados, o isolamento foi proposto para que o País se preparasse (ampliasse o número de leitos, comprasse mais respiradores, contratasse mais profissionais da saúde etc.) para receber os pacientes mais graves e tratá-los com dignidade, podendo, assim, ter mais chances de vidas serem salvas. Nesse período, também, os profissionais de saúde, verdadeiros guerreiros neste cenário crítico, também puderam se preparar mais, conhecer melhor a doença e alguns estudos evoluíram com tratamentos mais eficazes.

Graças a Deus, até hoje, principalmente em nossa região, não ouvimos falar de pes­soas que morreram por falta de atendimento ou eventual falta de leitos. Mas já ouvimos falar que o isolamento prolongado (quase 90 dias em Ribeirão Preto) está causando um grande número de mortos-vivos, talvez maior do que o de mortos-mortos. Pessoas sem emprego, sem condições de comprar o básico, aumento de moradores de rua, empresas tradicionais fechando as portas, pessoas morrendo em casa de outras doenças porque têm medo de ir até um centro de saúde, tratamentos e diagnóstico de câncer interrom­pidos, aumento de pessoas com doenças psiquiátricas. Enfim, isso dá uma discussão enorme. Se o isolamento fosse a solução única, seria maravilhoso. Isolaríamos todos e quem saísse na rua seria levado de volta à força para casa, o lockdown.

Mas existem alguns exemplos de locais que não adotaram o isolamento e os índices não foram ruins e outros que adotaram com maior rigidez e os números cresceram. Parece a história do ovo e da galinha. Eu não estou dizendo que um ou outro estejam certos, mas sim que todo mundo fala como se fosse uma verdade absoluta: o isolamento salva vidas. Tem gente falando que já salvou mais de 100 mil vidas, mas foi o lugar que mais morreu gente… E aí, o que você acha disso tudo? Eu repito, não acho uma coisa nem outra, acho que é muito achismo, inclusive o que estou fazendo agora.

Afirmações contundentes de que o isolamento é a melhor forma de prevenção e que falta conscientização da população me preocupam. Como é possível toda a população fazer isolamento em um país tão desigual como o nosso? O isolamento da forma como está sendo exigido pelas autoridades só é possível para algumas pessoas que podem. Todos os gráficos e estudos mostram o aceleramento da pandemia, isso é absolutamente inexorável, nós vamos ter gráficos mostrando isso até que eles come­cem a baixar com ou sem isolamento.

Outra questão abordada nesta entrevista, mais especificamente sobre economia, foi a possibilidade ou não de uma catástrofe econômica. Para mim ela já existe e vai se agra­var muito. E que providências você pode tomar para que ela não ocorra? O Estado vai fazer um aporte. Não é o Estado quem vai pagar, somos nós, aliás, já pagamos, porque pagamos adiantado.

Quem manda ficar em casa, fazer isolamento, é quem tem que pagar a conta: o Esta­do. Mas o Estado não tem condições de pagar esta conta sozinho e todo mundo sabe que não tem. Falar da capacidade do governo para sair da crise é outra coisa que vale à pena discutir, mas rende outro artigo. Também vale uma discussão mais aprofundada, como a politização da pandemia atingiu em cheio o nosso país e agravou ainda mais a nossa crise.

Apesar de todas as minhas incertezas e as certezas alheias, e até de me sentir ridículo, às vezes, foi bom ler esta entrevista. Além de incitar a uma reflexão interna e até um desa­bafo, me fez viajar por séculos, antes de Cristo, e perceber que Sócrates ainda é tão atual!

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