Por João Luiz Sampaio, especial para o Estado
Morreu na madrugada desta terça-feira, aos 71 anos, o diretor e iluminador Iacov Hillel. Atuando tanto no teatro adulto como no infantil, além de dirigir espetáculos de dança, musicais e óperas, que ocupa um papel especial em seu trabalho como encenador, ele teve uma trajetória marcada pela diversidade O artista tratava um câncer no fígado.
Não havia como ser diferente: sua formação foi feita à luz de um olhar multidisciplinar, o que deu a seu trabalho um olhar amplo, no qual cabia do cuidado com os intérpretes à compreensão da música ou da luz em diálogo com o mundo psicológico das personagens.
Nascido em Haifa, Israel, em 1949, Hillel mudou-se para o Brasil ainda na infância, em 1955. “Quando eu tinha uns 8 ou 9 anos, havia uma programação no Teatro Municipal de São Paulo chamada Concertos Mercedes-Benz, todos os domingos às 10 horas da manhã, que era transmitida ao vivo pela extinta TV Tupi Canal 3. Era a programação que o teatro apresentava durante a semana – com ingressos gratuitos aos domingos – meu pai me levava a todos eles e portanto os grandes concertos, as grandes operas, os grandes balés… Assisti a tudo isto muito jovem e isto veio a ser a minha iniciação artística e cada um deles ficou impregnado em minha memória. E forjou meu gosto”, contou ele em entrevista de 2011 ao site da SP Escola de Teatro
Em 1964, tendo já estudado piano, ele começou a cursar artes plásticas na Faap. Mas na mesma época seu interesse pelo teatro já estava claro: no Tuca e no Teatro de Arena, foi orientado entre 1965 e 1969 por Eugenio Kusnet. Nos anos 1970, estudou expressão corporal com Maria Esther Stockler; balé com Marilena Ansaldi; e dança moderna com Ricardo Ordoñez. E, no início dos anos 1980, terminou o curso de direção teatral na Escola de Comunicações e Artes da USP.
“Não tive padrinhos mas tive grandes mestres – Eugenio Kusnet, com quem tive aulas dos 16 aos 21 anos, Flávio Rangel, de quem fui assistente em A Capital Federal, Fernado Arrabal, com quem trabalhei em Torre de Babel, Jacó Guinsburg, meu professor na ECA junto de Sábato Magaldi, Marilena Ansaldi, grande mestra de dança, que dirigi anos depois, Myriam Muniz, amiga de muitos anos.”
Durante todo esse período, já atuava como ator, em montagens históricas do teatro nacional, como Morte e vida Severina, baseada no texto de João Cabral de Melo Neto, em 1965, no Tuca, sob direção de Silnei Siqueira. A estreia na direção foi em 1971, com Assunta do 21, de Nery Gomide. Em 1977, fez história com a produção de A Filosofia na Alcova, do Marquês de Sade. E não parou mais, participando de montagens importantes, como Os Lusíadas, baseada em Camões, e trazendo ao Brasil textos marcantes como Angels in America, de Tony Kushner.
José e Seu Manto Technicolor, de Tim Rice e Andrew Lloyd Weber, marca sua estreia como diretor de musicais, em 1982, rendendo a ele o Grande Prêmio da Crítica no Prêmio Molière. A música nunca o abandonaria. Dirigiu O Lago dos Cisnes, de Tchaikovsky; Tuhu – O Villa-Lobos das Crianças, de Guida Borghoff e O violinista no Telhado, de Joseph Stein, e a Ópera do Malandro, de Chico Buarque, entre outros.
Sua estreia na ópera foi com uma produção de O Elixir do Amor, de Donizetti, no final dos anos 1990, no Festival Amazonas de Ópera; em seguida, dirigiu Nabucco, de Verdi, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, onde seria diretor responsável por óperas; e O Guarani, de Carlos Gomes, mais uma vez em Manaus.
Com o passar dos anos, acrescentaria ao seu repertório clássicos como Carmen, de Bizet, no Rio de Janeiro, e Pelleas et Mélisande, de Debussy, um de seus principais trabalhos, apresentada no Teatro Municipal de São Paulo em 2012 e 2018, com um cenário construído a partir do uso da luz para recriar a atmosfera da ópera, símbolo da literatura simbolista.