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Personalidade e Literatura

Nos estudos literários, o tipo é estudado como uma das possibilidades de personagem a ser criada. Configuração esquemática, tanto no sentido físico como no psíquico, projetada como um indivíduo “real”, totalmente determinado, bem como, um dos três elementos estruturais essenciais do romance, o tipo, segundo alguns estudiosos, é uma das caracterizações das personagens planas, lineares, definida por um único traço, imutável ao longo de toda obra. Prática comum no romance histórico, a presença do tipo, se justifica pela necessidade de existir representantes de um dado meio ou classe social em cujos destinos ficcionais se refletiriam tendências importantes e mudanças históricas. Representando a socie­dade ou um grupo social específico, tem sua construção literária possibilitada, entre outros aspectos, gra­ças à atenção que o autor confere à significação de suas palavras, bem como, à prática da oralidade que a mesma estabelece entre locutores e interlocutores na trama textual, o que lhes garante a representação linguística e imagética importantes para inseri-las no universo de determinada época. Planas, seu papel vincula-se a uma situação específica ou a uma conduta generalizada, característica esta que também a distancia da caricatura, distinguida, esta última, por apresentarem uma qualidade ou ideia única levada ao extremo, de forma a tal distorção conclamar a sátira propositadamente.

Identificadas, portanto, pela profissão, comportamento e classe social, ou seja, por um traço distinti­vo comum a todos os indivíduos de uma mesma categoria, seria, por exemplo, o homem bom, defensor dos valores sociais; o homem mal, defensor das vilanias; o ancião, aquele que sabe dar conselhos, entre outros, todos possuindo em comum uma competência interiorizada. Exemplos? As personagens doen­tias e obsessivas de Edgar Alan Poe, bem como, os tipos femininos fortes de Jorge Amado, os tipos solda­do, bruxa, cientista e artista de José Saramago, os personagens cruéis, as cortesãs, os padres misteriosos e os tipos mesquinhos de Honoré de Balzac, vindos do submundo e com um linguajar característico do mesmo, e o velho pescador de Ernest Hemingway, entre outros. Tal estrutura, retomando estudos em psicologia, podendo ser compreendida, em resumo, como “essa conformação única de características que constitui um Emerson, um Beetho­ven, um Hitler, uma Madame Curie, um vendeiro de esquina na cidade de Terre Haute, um varredor de Calcutá, um gaúcho da Argentina”.

Por sua vez, certamente é possível utilizar a psicologia para lançar luz à interpretação e valoração de obras literárias, assim como, é possível proceder da mesma forma em rela­ção à sociologia, à filosofia, à história e outras disciplinas mais que, apoiadas em seus construtos teóricos, podem auxiliar o leitor na compreensão de conceitos fundamentais sobre os quais um enredo literário possa ter sido elaborado. Estudiosos do assunto, favoráveis à existência de um campo limitado de inter­pretações num ponto dado da narrativa, entende que a interpretação mediatizada pela diversidade de campos de conhecimento deve destacar o sentido do texto e comunicar esse sentido em relação a outros, transpondo-o do domínio subjetivo ao domínio do intersubjetivo. É atraindo uma linguagem adequada à sua produção de sentido, que a obra literária, na medida em que, exercitando o princípio da síntese, afirma uma linguagem comunicável, capacita-se a ser mimética.

Outros estudos já reconhecem existir na literatura, independentemente do gênero e forma por ela adotados, a aptidão para a representação de um conteúdo indissociável do mundo e da história, bem como, de seus respectivos correspondentes no mundo das referências imaginárias. Entretanto, em tais estudos reside o alerta para os perigos de se direcionar interesse investigativo a rascunhos, versões rejei­tadas, exclusões e outros cortes originais efetuados por autores: a despeito da compreensão estilística que poderemos vir a ter de seu autor, os mesmos já não pertencem à obra de arte que se analisa, não valori­zam o que há de concreto no que foi literariamente criado.

Específico para tratar de qual/quais critério/critérios faz/em com que algo seja considerado literatu­ra, o termo literariedade, definido como discurso fictício ou imitação dos atos de linguagem cotidianos, assim como, em relação a certas propriedades da linguagem, apresenta, teórica e metodologicamen­te, relevantes aspectos do objeto literário. Representando o real ou se auto-representando, uma obra literária pode apresentar intenções realistas, na qual a personagem é identificada como indivíduo social; intenções semânticas convencionais, nas quais o narrado faz a mediação de instâncias que acontecem na narrativa; intenções de simulação, nas quais o dizível e o indizível são sempre indiretos; e intenções de simbolização social, na qual a narrativa compreende uma retomada da maneira como a sociedade se simboliza a si própria.

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