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Sócrates e Vicente Matheus

Havia noites em que Sócrates danava a contar histórias e mais histórias, e eu ficava ligadaço porque isso me enriquecia como um ser vivente que estava tendo uma rara oportunidade que muitos gostariam de ter, de estar ali no meu lugar.

Eu sempre tive a curiosidade de saber como ele conheceu e como foi contratado por Vicente Matheus, presidente do Corinthians na época. Até que resolvi perguntar. Naquela noite o Magrão estava com a corda toda. Ele riu um bocado e começou a contar. “Buenão, Matheus, com aquele seu jeito simplório, era um tremendo estrate­gista. Era pra eu ir para o São Paulo, que dependia da venda de um jogador pra fechar comigo”, disse o Doutor.

E prosseguiu: “Já era pro Matheus ter me comprado antes, ele perce­beu que pisou na bola. Foi quando a diretoria e a torcida do Corinthians cobravam dele porque havia comprado o jogador errado. Era pra ser eu, mas ele comprou o Geraldão que jogava comigo no Botafogo”. Pois bem, Matheus ficou sabendo que o São Paulo estava vendendo um jogador e que iria contratar o Magrão com a grana, mas acertou que compraria o jogador tricolor, apenas pediu uns dias de prazo.

Sorrateiramente, Matheus juntou uma maleta de dinheiro e encarou mais de 300 quilômetros pela Rodovia Anhanguera até as margens do Rio Pardo. No rancho do Mortari, bateram o martelo e passaram a régua. Até alguns anos atrás, da mureta do Clube de Re­gatas via-se o rancho do outro lado, e eu comentava com meus filhos Lucas e Paulo: “Tão vendo aquele rancho? Foi ali que Sócrates foi contratado pelo Vicente Matheus para jogar no Corinthians”. Hoje desapareceu cercado por árvores e mato.

Sócrates contou que saiu da Faculdade de Medicina onde estava em aula e foi com seu pai até o rancho. Magrão até tentou botar areia na jo­gada dizendo: “Seu Matheus, eu não sou perfeito, tenho minhas vontades e o senhor pode não gostar”. Matheus, empolgado, dizia: “Não importa, o que importa é que você faça gols pelo meu Corinthians”.

E o Doutor: “Mas seu Matheus, eu gosto de tomar minha cerveji­nha”. A velha raposa rebatia: “Você pode tomar sua cervejinha desde que faça gols pelo nosso Timão”. Resultado, Magrão cedeu e naquele momento colocaram água no chope do São Paulo.

Das muitas histórias contadas nos muitos jantares na casa de Matheus, tem uma que é genial. Matheus e sua esposa, Marlene, le­varam Sócrates para conhecer o quarto deles, conta o Doutor. “Bue­não, o quarto era imenso e a cama ficava no alto, era preciso encarar muitos degraus para chegar lá. “Rindo, Sócrates falou: “Matheus, depois de subir esta escadaria toda você ainda dá conta da Marlene?”

Riram um bocado e Magrão perguntou a Marlene como eles haviam se conhecido. Ela falou: “Vicente, é melhor você contar”. Ele começou: “Sabe, Socrátes – o Magrão dizia que ele mudava o acento de seu nome porque tinha dificuldade com a pronúncia (rsrsrs) –, Marlene era secretária nas minhas pedreiras e a gente tinha um rolinho, minha esposa estava doente fazia anos, mas não morria. Estávamos esperando ela partir para oficializarmos nossa união”.

Matheus emendou: “O tempo passou e nada, até que Marlene foi pedida em casamento e me falou: ‘Olha, Vicente, sabe como é, eu quero me casar e já esperei muito’”. O presidente jogou a toalha, Marlene se casou, e meses depois a esposa do Matheus partiu. “Daí fui atrás do meu grande amor”.

O folclórico presidente prossegue: “Socrátes, eu ficava imaginan­do como chegar no cara e dizer que tinha vindo buscar a Marlene, não sabia a reação dele, mas vi que não adiantava ensaio e fui do meu jeito mesmo. Cheguei pra ele e falei: ‘Olha aqui, fulano, vim falar com você primeiro porque se falar com ela sei que ela virá mesmo… Quanto você quer pelo passe da Marlene?’ O cara retrucou: ‘Mas seu Matheus…’ Aproveitei e mandei mais: ‘Acho melhor você aceitar, eu ajeito sua vida’. O cara viu que tinha perdido e aceitou e aqui estamos nós”. Imaginem o tanto de risadas.

Sexta conto mais.

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