Os métodos atuais, utilizados para o manejo de surtos pandêmicos, são muito mais intervenções comportamentais, ou educacionais, visando a aderência aos programas de vacinação, práticas de higiene e distanciamento social, que outras coisas. Por sua própria natureza, em tais procedimentos, variados fatores psicológicos desempenham papel primordial para que se alcance algum grau de sucesso, uma vez que o excessivo estresse emocional, associado com a infecção real em potencial, constitui um problema de grande significância clínica e pública. Em adição, os fatores psicológicos são relevantes para entender, e endereçar, os padrões comportamentais destrutivos que podem surgir resultante da infecção séria e generalizada. Vamos, então, descrever brevemente algumas destas respostas psicológicas a uma epidemia.
As primeiras reações são aquelas associadas a danos, perdas e mudanças. Muitas pessoas são resilientes ao estresse que, para muitos que convivem com surtos epidêmicos de inúmeros outros eventos, não menos estressantes, surgirá ao longo da convivência com pessoas acometidas pela covid-19 ou sujeitas aos grupos mais vulneráveis à mesma. Neste contexto, o medo fragilizará aquelas mais intensamente que outras, enquanto terceiras tentarão buscar o equilíbrio emocional demandado pela situação. Especialistas chegam a afirmar que o trauma psicológico será provavelmente muito maior do que o trauma médico. Isto é, os efeitos psicológicos da pandemia serão mais pronunciados e disseminados, além de duradouros, do que os próprios efeitos somáticos da infecção. A ponto de que, para alguns, os efeitos psicológicos de uma epidemia tipo covid-19 persistirão muito tempo depois dos mesmos terem se recuperado do vírus, bem como, de outras pessoas, também envolvidas nos cuidados de outrem acometidos, passarem o mesmo.
Obviamente, as pessoas reagem aos fatores psicológicos estressantes, tais como, medo, indiferença, fatalismo, ansiedade, depressão e similares de forma muito diferente umas das outras. Dentre essas, algumas podem se tornar tão ansiosas que experenciam níveis clínicos significativos de estresse, evitação e prejuízo funcional, alcançando, até mesmo, um grau tão elevado de tal comportamento que passam a requerer tratamento específico para sua desordem emocional.
Checagem repetitiva de sinais vitais e aferição dos sintomas associados à covid-19 podem ocorrer em resposta à emergente ameaça de infecção. Por sua vez, checagem excessiva, clinicamente desnecessária, caracteriza pessoas obcecadamente preocupadas com a própria saúde. Tais comportamentos podendo, entretanto, sobrecarregar o sistema de saúde, como tem ocorrido nos diferentes hospitais ou UBDSs dos diferentes municípios brasileiros, alguns já superlotados e demandando, lamentavelmente, critérios na escolha de quem deverá ser hospitalizado ou não.
Desordens mentais podem ser disparadas, ou exacerbadas, por eventos estressantes relacionados à pandemia, incluindo desordens de ânimo, de ansiedade e de estresse pós-traumático. Essa última podendo ser, inclusive, agravada por exposição à mortalidade provocada pela pandemia, aqui incluindo mortes de parentes próximos e de demais vulneráveis. Da mesma forma, depressão ou enlutamento severo podendo ocorrer em pessoas que têm perdido parentes próximos. Também, sentimento de culpa nos casos de alguém acreditar ter sido possível salvar um ente querido que não o foi, bem como, de ter disseminado o vírus de modo inconsciente.
Outro conjunto de reações psicológicas refere-se à busca desesperada por curas milagrosas e remédios populares. Um fato constatado por pesquisadores é o indivíduo que, em face a um perigo real, tal como a contaminação pela covid-19, ser altamente irracional em sua tomada de decisão. Nestes casos, as pessoas procuram, desesperadamente, remédios populares para proteger seus entes queridos, aqui incluindo chás diversos, banhos de vinagre e sal e abuso de fumo e bebidas alcoólicas, além de consumo exagerado de comprimidos de vitaminas C e D que acabam sumindo das farmácias. Interessante, também, é que, durante a pandemia, os indivíduos se engajam em todos os tipos de comportamentos supersticiosos, na esperança de manter a si e aos seus em segurança. Novenas, oferendas, promessas, imagens, castigos e similares são dispostos a fim de se alcançar a cura para o problema.
Em épocas de pandemia, nota-se, portanto, que ansiosos e depressivos, ou perturbados psicologicamente, são mais prováveis de agirem desesperadamente para evitar que eles próprios e os seus sejam infectados. Como consequência, espera-se, obviamente, elevada busca por substâncias e elementos milagrosos, acompanhados da exacerbação de comportamentos negativos, durante o surto epidêmico. A nossa realidade tem espelhado isso. A morte, neste cenário, generalizando-se como mera estatística.