Desde que o novo coronavírus (covid-19) começou a se espalhar por todo o Brasil, motivando autoridades federais, estaduais e municipais a recomendarem o isolamento social e a interrupção de atividades econômicas, algumas empresas privadas e órgãos públicos vêm suspendendo a contratação de novos estagiários.
Nesta terça-feira (14), o governo de São Paulo anunciou um plano de contingência para tentar reduzir despesas com pessoal e encargos sociais. A medida suspende a admissão de estagiários por tempo indeterminado. Segundo o Decreto nº 64.937, a suspensão vale para todos os órgãos da administração direta e autarquias e “decorre da pandemia da covid-19”.
Também alegando “a possibilidade de contágio pela covid-19”, o Ministério Público de Roraima (MP-RR) suspendeu o processo de contratação de estagiários de nível médio para sete comarcas do interior do estado. Iniciativa adotada também por prefeituras, como a de Divinópolis (MG) e pela Procuradoria-Geral de Nova Iguaçu (RJ).
Eduardo Vaz, superintendente nacional do Instituto Euvaldo Lodi (IEL), uma das principais entidades do país a intermediar o contato entre empresas, órgãos públicos e jovens candidatos a estágios, disse à Agência Brasil que, pelo menos nas regionais da entidade, o cancelamento ou suspensão dos termos de estágio já assinados “não tem sido uma grande preocupação”, ao contrário das consultas sobre trabalho remoto, ou seja, o home office.
“Até o momento, não recebemos informações de que termos de estágio [já em vigor] estejam sendo suspensos. Claro que, em função das incertezas, algumas empresas optaram por aguardar um pouco mais para lançar novos processos de recrutamento e seleção de estagiários, mas há vários outros em andamento, e temos usado a mesma tecnologia que possibilita o trabalho remoto para fazer as entrevistas e a seleção à distância”, disse o superintendente.
Home office
Segundo Vaz, nesse momento, as dúvidas mais frequentes por parte dos empregadores diz respeito à possibilidade legal dos estagiários trabalharem de casa e sobre como orientar as tarefas a distância, proporcionando que os jovens possam conciliar teoria e prática.
“Hoje, a maioria dos estagiários, eu diria que quase a totalidade, está fazendo trabalho remoto, em suas residências”, garantiu o superintendente. Segundo ele, o home office em tempos de pandemia ganhou impulso após o Ministério Público do Trabalho (MPT) emitir a Nota Técnica nº 5, na qual afirma que a medida visa a “proteger a saúde dos trabalhadores, empregados, aprendizes e estagiários adolescentes” durante o tempo que as autoridades de saúde recomendarem o isolamento social como forma mais eficaz de evitar que o novo coronavírus se espalhe.
Encabeçado pelo procurador-geral do Trabalho, Alberto Bastos Balazeiro, o grupo de procuradores do trabalho que assina a nota técnica recomenda que, sempre que possível, as entidades públicas ou privadas substituam por atividades remotas as tarefas que empregados de 16 anos a 18 anos de idade desempenhavam presencialmente. Para viabilizar essa mudança, os empregadores devem garantir ao estagiário a adequada estrutura de tecnologia de informação e de supervisão das atividades. E “em nenhuma hipótese poderá haver a substituição das atividades teóricas pelas atividades práticas” ou prejuízo financeiro, com redução da remuneração paga ao jovem.
“A pandemia caracteriza situação excepcional e motivo de força maior sendo, assim, fato capaz de [no limite] caracterizar a interrupção da prestação de serviços sem implicar em redução ou não pagamento da remuneração dos aprendizes, tampouco da bolsa estágio”, defendem os procuradores na nota técnica.
O superintendente do IEL lembra, contudo, que a Lei de Estágio continua sendo o documento mais importante para sanar eventuais dúvidas. E que os setores responsáveis devem continuar demandando os jovens e, principalmente, acompanhando a execução das atividades solicitadas. Para Vaz, os estágios contribuem não só para a capacitação dos estudantes, mas também para as companhias.
“É importante as empresas abrirem essas oportunidades para o maior número possível de jovens, para que eles possam ter suas primeiras experiências profissionais e complementar sua instrução. A maior parte deles está habituada ao ambiente digital, está conectada, e têm habilidades que podem ser de grande proveito para as organizações em um momento como este. Por isso, temos recomendado que as organizações dêem prosseguimento aos seus processos de recrutamento de estagiários e aos seus programas de retenção de jovens talentos”, disse o superintendente.
UNE
A preocupação com a situação econômica dos estudantes cujos estágios estão perto do fim motivou o representante da União Nacional dos Estudantes (UNE) no Conselho Nacional da Juventude (Conjuve), Luis Filipe Eich, a propor que o órgão sugira a prorrogação dos prazos finais. “Se um contrato de estágio vence agora, no meio desse período de crise, o estagiário ficará desamparado, sem renda, pois ninguém mais está contratando”, argumentou Eich.
O superintendente do IEL, Eduardo Vaz, admitiu que a proposta de Eich pode ser positiva. “Se é algo para beneficiar os jovens talentos, podemos estudar e, se for o caso, apoiar. Lógico que cada empresa tem seu próprio calendário, seu programa de estágio. Precisamos conhecer melhor a ideia, mas alguma flexibilização temporária na Lei de Estágio pode ser positiva nas atuais circunstâncias”, acrescentou Vaz.
Edição: Fernando Fraga