A prevalência de obesidade e sobrepeso tem aumentado nos últimos anos. Em 2014, mais que 1,9 bilhões de adultos foram considerados com sobrepeso e, destes, 600 milhões foram classificados como obesos. Considerando as pessoas jovens, em 2013 foi estimado que aproximadamente 42 milhões de crianças e adolescentes, entre as idades de 15 e 18 anos, e, aproximadamente, 13% das crianças abaixo de 5 anos, foram classificadas com sobrepeso ou obesidade. Nesse ritmo de crescimento, espera-se que cerca de 60% da população mundial alcançará valores de índice de massa corporal (IMC) críticos por volta de 2030. Por conta disso, esse aumento substancial na incidência das pessoas afetadas por sobrepeso ou obesidade tem se tornado um grande problema de saúde pública.
De fato, sobrepeso e peso são fatores de risco elevados para muitas doenças, tais como, problemas cardiovasculares, diabetes e até desordens psicológicas e neurológicas. Considerando esse cenário, parece útil investigar os fatores predisponentes e agravantes que aumentam o IMC e a gordura corporal, relacionadas ao aumento de apetite. Em linha com essa necessidade, nos últimos anos tem havido interesse nos mecanismos cognitivos envolvidos no sobrepeso e na obesidade. Especificamente, alguns estudos têm focalizado a relação entre funções executivas e obesidade, ou seja, de que forma os processos cognitivos afetam ou são afetados pelo excesso de peso.
Entre os inúmeros estudos a respeito, aqueles publicados por Prickett et al (em Obesity Research & Clinical Practice, 2015, 9, 93-113) e por Favieri et al (em Frontiers in Psychology, 2019, 10, 2126) revisaram sistematicamente a existência e a natureza da relação entre excessivo peso corporal e funções executivas, considerando tanto estudos transversais quanto estudos longitudinais, visando extrair uma possível causalidade entre essas variáveis. Os estudos selecionados envolveram participantes obesos e com sobrepeso entre 5 e 70 anos, incluindo 63 artigos com delineamento transversal (considerando apenas um período etário) e 28 artigos com delineamento longitudinal (ao longo de um grande período de vida). As funções executivas analisadas foram: flexibilidade cognitiva, inibição, memória de trabalho, tomada de decisão e planejamento, solução de problemas.
Estas revisões sistemáticas indicaram a presença de uma relação entre funções executivas e sobrepeso e obesidade. Todavia, os dados sugeriram uma tendência bidirecional nessa relação, o que pode ser a causa do fracasso das intervenções visando redução de peso. Bidirecional significa que alguns estudos suportam a hipótese de que os comportamentos alimentícios afetam o funcionamento executivo, isto é, os hábitos saudáveis de alimentação promovem a preservação das funções cognitivas ao longo da vida. Na direção oposta, outros estudos são inclinados a sustentar que as funções cognitivas são consideradas como preditores dos comportamentos de se alimentar e, consequentemente, de mudança do peso corporal.
De acordo com esta última hipótese, as deficiências nas funções executivas são consideradas como a causa das atitudes inapropriadas para alimentar-se e representam um gatilho tanto para as desordens alimentícias quanto mudanças nos escores de índice de massa corporal (IMC). Interessante observar, também, que, nestas revisões, pobre desempenho nas tarefas de funções cognitivas também ocorreu em pessoas com sobrepeso e não, apenas, naquelas obesas. Também não ficou muito claro nas revisões quais das funções executivas analisadas são mais afetadas que outras pelo sobrepeso ou obesidade, embora as revisões indicarem, robustamente, uma conexão poderosa entre processos cognitivos, especificamente funções executivas e excessivo peso corporal, destacando a importância de considerar a natureza da associação entre essas variáveis em estudos acerca do sobrepeso e obesidade.