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Um passeio pelo western, para revisitar o clássico ‘Shane’

Por Luiz Carlos Merten

Como em toda segunda à noite, o Telecine Cult abre espaço para o western em sua programação. A partir das 20h25 e até 2h05 – quando entrará um Godard, Salve-se Quem Puder (A Vida) -, serão apresentados três, em sequência. Imprensado entre Caminhos Ásperos, de John Farrow, o pai de Mia, e As Aventuras de Búfalo Bill, de Jerry Hopper, com Charlton Heston, está Os Brutos Também Amam, de George Stevens, que mereceu, anos atrás, um pequeno no tamanho, imenso no alcance, ensaio do crítico Paulo Perdigão – Western Clássico. Perdigão, que, numa certa época, foi programador de cinema da Globo, não dissecou apenas os elementos que fazem de Shane, título original, um filme tão especial. Pegando carona no Woody Allen de A Rosa Púrpura do Cairo, e utilizando a ferramenta do vídeo, Perdigão refez o final da obra-prima de Stevens. Por uma questão de direitos, o filme nunca circulou. Ninguém tem mais condições do que Sérgio Augusto de (re)avaliar o Shane de Perdigão. Eram amigos.

Três filmes nessa segunda-feira. E para começar Hondo, que no Brasil se chamou Caminhos Ásperos. John Wayne faz o guia de cavalaria que assume a proteção de uma mulher e seu filho. Geraldine Page e o garoto vivem no Oeste selvagem, numa rota por onde passarão guerreiros apaches em pé de guerra. Baseado numa história de Louis L’Amour, o filme é reputado por seu uso da paisagem e pela presença de Wayne que, em 1953, estava no topo. As Aventuras de Búfalo Bill chama-se Pony Express no original. Conta como o lendário William F Cody e seu amigo Bill Hickok criaram o correio a cavalo entre o Missouri e a Califórnia. No Dicionário de Cinema, Jean Tulard define Hopper como artesão consistente e destaca sua contribuição ao gênero justamente pelo uso da paisagem em Pony Express.

Mas o melhor e mais importante desses três filmes é indiscutivelmente o de Stevens. Não que seja uma unanimidade. Para alguns estudiosos, Stevens psicologizou o gênero, nessa forma indo na contramão de autores puros como Anthony Mann e Budd Boetticher. Com John Ford, Frank Capra, John Huston e William Wyler, integrou o grupo de cinco cineastas, todos figuras de prestígio em Hollywood, que decidiram acompanhar as tropas dos EUA, durante a 2.ª Grande Guerra, documentando seus avanços na Europa e no front do Pacífico. Stevens, em especial, filmou a libertação dos campos de concentração dos nazistas. Dizia que conheceu o horror da realidade, e nada poderia surpreendê-lo. Era um diretor de comédias e musicais, clássicos de aventuras (como Gunga Din, de 1938). A experiência mudou sua vida e seu cinema. Nos anos 1950, e baseado no seu conhecimento das pessoas, Stevens criou sua trilogia informal sobre a vida norte-americana – Um Lugar ao SolOs Brutos Também Amam e Assim Caminha a Humanidade. Pelo primeiro e pelo terceiro, venceu o Oscars de direção de 1951 e 56.

Stevens filmou Shane em 1951, mas demorou dois anos para lançá-lo. Um pouco isso se deveu pelo complicado processo de montagem. Stevens foi sempre discutido por filmar com diversas câmeras, de diversos ângulos, qualquer cena. Alguns críticos veem nisso a própria ausência de mise-en-scène, mas ele sempre preferiu dispor de muito material, buscando as melhores combinações na sala de montagem. O filme propõe um duelo alegórico entre o bem e o mal. Shane chega à cidadezinha do vale, vindo das montanhas, para ajudar pequeno fazendeiro e sua mulher. Stevens evoca todos os temas míticos do western – a luta a socos, o amor idealizado, o funeral, o duelo final. E tudo é visto pelo filtro do olhar do menino, o que transforma Shane, interpretado por Alan Ladd, num herói maior que a vida. O final marca o rito de passagem, a transformação do menino, Joey, em homem. Clint Eastwood é louco pelo filme, que refez como O Cavaleiro Solitário, em 1985.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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