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A voz que abriu a porta do pop nos anos 90

Por Julio Maria

Quando saiu o primeiro diagnóstico apontando um câncer severo no cérebro da sueca Gun-Marie Fredriksson, em 2002, ela tinha 44 anos, 70 milhões de discos vendidos e um sonho de menina indo muito além do esboço. No subúrbio impronunciável de Östra Ljungby, na Suécia, pai e mãe humildes saíam para trabalhar e deixavam os cinco filhos sozinhos. A mais nova, Gun-Marie, esperava o dia passar em frente ao espelho cantando músicas dos Beatles.

Os médicos afirmaram que o câncer que a levou nesta segunda, 10, aos 61 anos, seria devastador. Sua vida nos palcos acabaria em poucos meses e, fora deles, só seria possível dentro de uma estimativa de 5% de chances. Ainda que sobrevivesse, haveria sequelas. Seu corpo perderia os movimentos, a visão do olho esquerdo ficaria comprometida e, aos poucos, sua memória se desintegraria. Isso, lembrando, há 17 anos.

A parte que a medicina não explica pode estar em uma coerência histórica de Marie que tem a marca do improvável desde que tudo começou. Pois ela e o amigo (e não irmão nem marido) Per Gessle pararam de cantar em sueco em suas bandas de rock originais para assumirem o inglês e fazerem uma usina exportadora mundial de 19 hits subsequentes, com canções vestidas de rock, ou rock com alta carga de canção, potencializando o pop mundial na “nova era”.

Estava tudo indo bem na Suécia em 1988, quando sua população era de pouco mais de 8 milhões de habitantes, seu orgulho nacional era o Abba e Tove Lo não era nem projeto de artista. O Roxette, banda que unia os já dois pop-sueco-stars Marie Friedriksson e o guitarrista e vocalista Per Gessle, estava em seu segundo álbum, Look Sharp!, batalhando espaços nas rádios europeias. Marie, uma aposta da EMI, vinha firme à frente da dupla e atrás de um gigantesco piano de cauda, suecamente loira e completamente desconhecida nos Estados Unidos. Até o dia em que um estudante norte-americano de Minneapolis, em viagem de intercâmbio na Suécia, operou o primeiro milagre de Marie Friedriksson.

O garoto Dean Cushman pirou ao ouvir The Look, a canção que invadia rádios nobres e plebes da Rainha Silvia, e voltou para os Estados Unidos com um CD. A canção não dizia muito além do fato de que a mulher em questão tinha “o olhar” definitivo, congelante e aterrador, uma espécie de “olhar 43” em tradução livre. O jovem se dirigiu então aos estúdios da KDWB 101,3 FM de Minneapolis e pediu encarecidamente que o programador ouvisse a descoberta. Ao sentir o potencial das vozes, no caso elas apareciam alinhadas, sustentadas por guitarras e sem sinais do piano de Marie que arrebanharia fãs com canções românticas, o DJ da emissora resolveu fazer cópias piratas da música e as enviou para outras estações de rádio de sua empresa. Como um vírus, o nome Roxette espalhou-se pelos EUA – até então o portal obrigatório para tudo que quisesse se massificar no mundo, incluindo no Brasil.

Após o milagre de Cushman, algo que os americanos chamaram de “caso Cushman”, veio o de Julia Roberts. Um dia após alguém da produtora Touchstone Pictures ouvir The Look no rádio, o telefone de Marie tocou. A dupla era convidada para ter uma canção sua na trilha sonora de um novo filme, com direção de Garry Marshall. Sem tempo para compor algo novo, os artistas resolveram mandar uma canção originalmente natalina feita dois anos antes e nunca lançada, Christmas for the Broken Hearted. Reformulada, virou It Must Have Been Love com uma energia de fazer flutuar Richard Gere e Julia Roberts em Uma Linda Mulher.

O terceiro milagre seria no palco de 2012, uma turnê para rever sua plateia dez anos depois da primeira aparição do tumor e provar que as previsões de suas própria canções e do jornal The Sun – de que Marie Friedkssom já estava na lista das vozes inesquecíveis do mundo – poderiam ser mais poderosas do que os diagnósticos científicos.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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