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Resiliência climática e desenvolvimento urbano

Costumo dizer que quando elaboramos um trabalho nós o fazemos com tudo o que conhecemos a respeito daquele assunto, mas também com tudo o que desconhecemos. É impossível ter o domínio completo a respeito de qualquer tema, mas quanto mais o dominamos, maiores são as chances de realizarmos com qualidade determinada tarefa. Na esfera pública, por exemplo, estão à disposição dos gestores, o conhecimento e o desconhecimento dos seus quadros técnicos em cada área da administração.

Acredito que a função do Estado em um país em desenvolvimento, com grandes desafios socioeconômicos e ambientais, seja o de se antecipar a conflitos e proble­mas, tomando decisões que resguardem o interesse coletivo e buscando o equilíbrio entre as forças do livre mercado e as necessidades da população menos favorecida. Não é essa a vocação dos governos neoliberais que dominam a cena na atualidade, não obstante os pressupostos constitucionais invocarem a seguridade social.

Antecipar significa planejar. Planejar ações embasadas em conhecimento e não em crenças ou negacionismos descolados dos fatos. Diagnósticos bem elabo­rados sobre a realidade de uma comunidade e seu território é um bom começo.

Recentemente participei de um workshop latino-americano, realizado em Niterói (RJ), promovido pela Associação de Cidades Alemãs, intitulado “Resiliência climática e desenvolvimento urbano”. Lá estávamos Brasil, México, Equador, Colôm­bia, Argentina e Alemanha. Técnicos e gestores de administrações municipais e os facilitadores. Há muito tempo não sentia a irmandade tão aconchegante e genuína que existe com nossos queridos vizinhos da América Latina. Creio que a centralida­de da Amazônia no atual cenário de mudanças do clima nos aproximará ainda mais.

Foram apresentadas, discutidas e avaliadas “boas práticas”em cidades quejá respondem às mudanças climáticas e que se preparam para se adaptar às transfor­mações em curso. As plataformas de diálogo e aprendizagem Connective Cities, Ciudades e Gobiernos Locales Unidos (CGLU) e Sociedade Alemã de Cooperação Internacional (GIZ) promovem intercâmbio de experiências e oferecem apoios para a elaboração e execução de projetos.A discussão sobre a replicação dessas boas práticas foi o foco do evento.

O desafio que está colocado para nós é mensurar, construir,avaliar e ampliar a resiliência climática das cidades.Conhecimentos nas áreas de climatologia, orde­namento territorial, mobilidade, serviços ecossistêmicos, ciclo hidrológico urbano, governança ambiental, planejamento participativo, educação para mudanças climáticas, financiamento, defesa civil, entre outros, são necessários para lograr êxito em projetos desta natureza. Daí a importância de prefeituras contarem com quadros técnicos capazes e motivados.

Os marcos legais contemplados nos planos diretores podem estar coadunados ou descontextualizados do cenário climático atual. No Brasil, a drenagem urbana, por exemplo, é um tema que não está devidamente atualizado na esfera da gestão pública.Temos construído cidades inimigas da água. Observem a ocupação equi­vocada dos fundos de vale, a retificação e canalização de cursos d’água, e as obras de drenagem pluvial que expulsam a água rapidamente para fora do ecossistema urbano. Esse paradigma ultrapassado quando associado a taxas crescentes de evaporação, geram cidades quentes e áridas.

Muita mobilidade individual nos centos urbanos significa pouco espaço para se preparar ou se adaptar a um clima hostil. O desconforto das altas temperaturas compromete o bem-estar e a saúde da população, a mobilidade livre – percursos a pé e de bicicleta –, e podem afetar o setor econômico da construção civil. O habitat humano na contemporaneidade, em suas diferentes escalas, deve estar atento também à mitigação das mudanças do clima.Cidades que esbanjam água, combustíveis, carne,energia, cimento e madeira, por exemplo, deverão pagar pelo desperdício, visto que o ambiente é um bem comum.

Neste sentido, três agendas globais se comunicam diretamente com a escala local quando o assunto é resiliência climática e desenvolvimento urbano: os Obje­tivos de Desenvolvimento Sustentáveis (ODS) mirando 2030; o Marco de Sendai para a Redução de Risco de Desastres (2015-2030) e o Acordo de Paris com suas metas nacionais espontâneas, mas de execução obrigatória, que começam a ser cobradas a partir de 2020.

Niterói, pelo que pude observar, chamou a si o desafio de se desenvolver com atenção plena às demandas sociais e ambientais. Por isso, teve oportunidade e altivez de sediar tão relevante evento. Que siga em seu caminho de melhorar a qualidade de vida da totalidade de seus habitantes. Obrigado a todas as institui­ções que de alguma forma me permitiram essa experiência.

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