Por Marco Antônio Carvalho, Gilberto Amendola e José Maria Tomazela
Quatro em cada cinco crianças e adolescentes brasileiros entre 11 e 17 anos realizam menos atividade física do que a uma hora diária recomendada. A porcentagem constatada no País (83,6%) é maior que a média mundial, de 81%, de acordo com estudo divulgado ontem pela Organização Mundial da Saúde (OMS) na revista científica The Lancet, e realizado em parceria com Imperial College London e Universidade da Austrália Ocidental. Para a OMS, ações urgentes são necessárias, como políticas voltadas ao aumento da atividade física, principalmente para garotas.
Os dados mostram que em 15 anos, entre 2001 e 2016, a realidade brasileira pouco se alterou, passando de 84,6% para os atuais 83,6% de jovens sem a frequência de exercícios recomendada. Entre os meninos, as atividade físicas são mais frequentes, mas 78% ainda não as realizam dentro do padrão recomendado. Entre as meninas, esse número chega a 89,1%, seguindo uma tendência mundial que a OMS pretende combater. Para isso, a organização pede políticas específicas para promover, atrair e manter garotas ligadas a essas atividades.
No mundo, a variação ao longo das duas últimas décadas foi mais significativa entre garotos do que entre garotas. No sexo masculino, a falta de atividade passou de 80,1% para 77,6%, enquanto que, no sexo feminino, foi de 85,1% para 84,7%. O estudo alerta que, se a tendência continuar, a meta de reduzir em 15% a taxa de inatividade não será alcançada até 2030.
“Em todas as regiões (do mundo), meninas foram menos ativas que meninos, com diferenças significativas em sete de nove regiões”, detalha o estudo. Foi nas Filipinas que a falta de atividade física acabou mais sentida entre os meninos (92,8%); já a Coreia do Sul foi onde o porcentual para as meninas foi o mais alto (97,2%). Bangladesh é o lugar onde os jovens mais praticaram atividades. Mesmo assim, ainda há 66,1% de crianças e adolescentes longe de atingir a meta estipulada.
Os pesquisadores destacam que os benefícios de um estilo de vida fisicamente ativo são bem conhecidos. Eles incluem a melhora cardiorrespiratória e muscular, além de efeitos sobre os ossos e o metabolismo. Os benefícios para a saúde se estendem da adolescência para a vida adulta, com impacto ainda sobre a atividade cognitiva e a sociabilidade comportamental.
Padrão urbano
O endocrinologista Mario Carra, presidente da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso), vê os números ligados a um padrão mais urbano de vida. “As crianças ficam mais isoladas e se dedicam a fazer as coisas mais fáceis, passando muito tempo em frente a telas, seja de televisão, computador ou videogame”, disse. A rotina, explicou, pode levar a uma ingestão calórica maior. “O maior problema da falta de atividade é o fato de isso ser o primeiro passo para o aumento de peso, podendo levar a uma série de eventos associados à obesidade, como hipertensão, diabete. A atividade física ajuda a manter os padrões metabólicos estáveis.”
Família de patins
Enquanto os amigos preferem jogos eletrônicos, Loene, de 9 anos, prefere a liberdade de andar de patins. “Muito melhor. Não gosto de ficar muito parada”, disse. Os pais de Loene, Herbert de Jesus, de 33, e Lucinei Dias, de 34, incentivam a aptidão para atividades físicas da filha. “A gente não gosta muito de tecnologia. Então, preferimos sair com ela para brincar no parque”, conta.
Estudante do 1.º ano do ensino médio, Isabela Letícia Fogaça, de 16 anos, sonha em ser bombeira militar, mas antes precisa vencer seu reconhecido sedentarismo. Ontem, caminhava com a mãe nos jardins do Paço Municipal de Sorocaba, onde mora. “Vim porque minha mãe me puxou. Por mim, estaria em casa estudando”, disse.
Cláudio Fernandes, coordenador da área de esportes da Escola Stance Dual, percebe na prática como o apelo da tecnologia e de uma vida mais automatizada se reflete na propensão ao sedentarismo dos adolescentes. “Antigamente, quando as escolas iam formar times esportivos para as competições, de futsal, vôlei e basquete, sempre tinham mais interessados do que vagas. Hoje, é bem diferente, se você tem 15 vagas em um time, aparecem 10 alunos”, contou.
Ainda assim, Fernandes enumerou uma série de ações que a escola em que trabalha promove para quebrar o sedentarismo ou reduzi-lo “Nós levamos alunos do 8.º e 9.º ano para correr no Ibirapuera, por exemplo. Eles saem da rotina e isso é muito importante.”
O estudo destaca a necessidade de se identificar, entender e intervir nas causas sociais, econômicas, culturais e tecnológicas que podem perpetuar os baixos níveis de participação e as diferenças entre os sexos. As políticas, apontam os pesquisadores, devem promover o aumento da atividade física em todas as suas formas, incluindo esportes, brincadeiras e recreação, assim como a mobilidade a pé e em bicicleta. “A ação requer engajamento e resposta coordenada de múltiplos setores, como escolas, famílias, planejadores urbanos e líderes comunitários e da cidade.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.