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Sócrates, Datena e o Rolex

Abrindo mais uma vez a gaveta de minha memória, lembrei-me de Sócrates e Datena e de várias situações em que eu estava junto da dupla ou então que me contaram. Quando eu e o Doutor estávamos numa fase muito produtiva para criar canções, eu sempre compunha a melodia e a gravava tocando violão e cantarolando “lalaiá” numa fita K7 que deixava com o Magrão. Ele ouvia várias vezes até achar um tema que batia com a música, depois colocava os versos. Tinha a mania de rimar sempre a segunda linha com a quarta e assim fize­mos mais de 50 músicas.

Uma das canções que a gente fez foi o samba de breque “Conta especial”. Certa noite, no Empório Brasília, estava com meu violão cantando nossas músicas quando ele sugeriu: “Buenão, ainda não fizemos um samba de breque”. Eu também sempre quis compor um samba de breque, aquele em que o sambista tá mandando ver no gogó e, de repente, dá um breque, fala alguma coisa e segue o jogo sem perder o compasso.

Pois bem. Quando entreguei a fita a Sócrates, disse: “É um samba de breque, Magrão”, e ele perguntou se tinha algum tema. Falei pra ele: “Imagine a cena, Magrão. O cara chega em casa depois de um dia duro e a mulher arma o maior barraco. Ele, muito nervoso, passa a mão no carro e sai sem destino. Ao passar pela rua Saldanha Ma­rinho, no Centro de Ribeirão Preto, em cada quarteirão dá de cara com um monte de travecos fazendo gestos provocativos. Ele passa e vai direto para aquela famosa chácara lá na Ribeirânia”.

“Tá bom”, disse o Doutor. “Deixa comigo”. Dia seguinte, de manhãzinha, ele ligou. “Buenão, fiz a letra, vem pra cá com a viola”. Adorei a letra, e da estória que contei o Magrão aproveitou só a travesti. O Doutor imaginou um gerente de seção daqueles chatos, mandão, mas que à noite, na balada, mostra o que realmente é. Já na madruga conhece uma loiraça e daí tenta voltar a ser o gerentão. Tarde demais, a moça percebe que ele é um grande “viadão” (sic).

Nessa época, em 1999, a TV Record estava começando aqui em Ribeirão Preto e Datena e Sócrates tinham um programa juntos. José Luiz Datena, que já conhecia nosso samba de breque, convidou­-me para participar com meu violão e o Magrão cantando. Foi logo fazendo um pedido a Sócrates, tipo “Magrão, ao vivo você não pode cantar a palavra ‘viadão’, troque por cidadão, senão o Bispo (Edir Macedo) nos manda embora, aí estamos ferrados”.

“Viadão” era a última palavra do samba, e Magrão falou: “Deixa comigo”. Mas o Doutor era terrível, dei a introdução, Sócrates começou a cantar – e o Datena nos policiando o tempo todo – e, no final, Magrão não resistiu e cantou “Foi aí que ela notou que o garotão tinha jeitos e trejeitos de ser um grande ‘viadão’”… Datena quase teve um infarto, eu e Magrão morrendo de dar risadas e o comercial da TV até entrou no ar.

Tempos depois, Datena foi pra Sampa trabalhar com TV, e o Magrão também foi fazer um curso de medicina esportiva, queria ser um competente técnico de futebol. Sócrates não ostentava nada, nem relógio, até que Datena lhe presenteou com um Rolex.

O trânsito na hora do rush parava geral em Sampa e, numa destas, Sócrates estava com seu carro próximo ao velho Mercadão, trânsito não fluía, dois caras bateram no vidro e exigiram seu Rolex. Quando ele desceu o vidro foi reconhecido pelo ladrão, que gri­tou para o outro: “Cara! É o Sócrates, é o Doutor”. O outro ladrão segurou a onda meio que paralisado, enquanto o primeiro disse: “Vai com Deus, Doutor, desculpe aê”. E sumiram entre centenas de carros. Magrão ficou rindo sozinho.

Noutra feita, sete da noite, Marginal Pinheiros parada, um moto­queiro viu o Rolex no braço do Magrão, bateu no vidro, mostrou a arma na cintura e deu sinal para Sócrates tirar o relógio. O Doutor obedeceu e ele vazou acelerando sua máquina, naquele manjado corredor de carros. Nunca mais Magrão usou relógio (rsrsrsrs). Como diz meu amigo, o maior humorista do Brasil, Chico Lorota… Acunticido!!!

Sexta conto mais.

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