Mais de um milhão de pessoas foram às ruas do Chile nesta sexta-feira, 25 de outubro, para pedir melhoras sociais no país. Com bandeiras, apitos, cartazes, panelas e frigideiras para se fazer ouvir, houve protestos pacíficos de norte a sul do país, no oitavo dia de marchas contra o governo do presidente Sebastián Piñera.
Os protestos já resultaram em ao menos 19 mortes. A concentração na praça principal de Santiago foi inédita. A intendente (governadora) da região metropolitana da capital, Karla Rubilar, informou no Twitter que mais de um milhão de pessoas estavam reunidas, enquanto mais gente chegava de outras regiões. “Aqui está marchando o Chile todo, são diferentes dores, com diferentes tristezas, mas muita esperança”, afirmou ela.
Os manifestantes expressavam demandas como melhores salários e aposentadorias e melhorias no setor de educação, com uma massa sem porta-vozes nem organização aparente. A analista Marta Lagos, diretora do Latinobarómetro, afirmou à Associated Press que a magnitude das manifestações é inédita, nunca vista durante a ditadura do general Augusto Pinochet (1973-1990) nem desde o restabelecimento da democracia.
Mais cedo, na vizinha cidade portuária de Valparaíso o Congresso chileno foi esvaziado pela primeira vez desde sua reabertura, em 1990, após centenas de manifestantes tentarem cruzar o perímetro de segurança, em meio a enfrentamentos com a polícia, que os reprimiu com violência.
Para alguns analistas, o quadro poderia piorar mais. “Após o que vimos nas ruas de Santiago, é difícil imaginar uma saída que não envolva a renúncia de Piñera e novas eleições”, afirmou à AP a pesquisadora Jenny Pribble, do Departamento de Ciência Política da Universidade de Richmond, nos Estados Unidos.
Houve também nesta sexta-feira uma greve de caminhoneiros, que circularam lentamente em uma rota que une o norte ao sul do país e passa por uma divisa de Santiago. Os caminhoneiros exigiam mudanças na cobrança de pedágio, pedindo que eles não sejam mais cobrados nas rodovias privadas.
“Esta crise se soluciona com política, não com uma lista de supermercado de políticas sociais”, afirmou Lagos, a diretora do Latinobarómetro. “Não há fundos, por isso não se pode fazer nada além de política, aqui é preciso haver uma liderança que entregue uma agenda distinta, com caras novas, que sejam dignas de crédito e capazes de interpretar e conduzir a população.”
Muitas manifestações têm sido duramente reprimidas e aumentam as denúncias de abuso por parte da polícia. A Alta Comissária da Organização das Nações Unidas para os Direitos Humanos, a ex-presidente chilena Michelle Bachelet, anunciou na quinta-feira o envio ao país de uma comissão para examinar denúncias de violações aos direitos humanos, após Piñera convidá-la a visitar o país.
Nesta sexta-feira, a Anistia Internacional anunciou o envio de uma equipe para documentar “as graves violações aos direitos humanos e possíveis crimes de direito internacional que estão sendo cometidos por agentes do Estado”, afirmou Erika Guevara Rosas, diretora para as Américas dessa entidade.