Compor uma música parece fácil – até que é, quando ela já desce, não sei de onde, pra dentro da cabeça da gente já pronta. É difícil acontecer, mas é possível, até porque já tive este privilégio.
A frase título é de Vinícius de Moraes, nosso poeta que vestiu com versos e rimas uma quase canção de ninar composta por Toquinho. Nas idas e vindas de Toquinho aqui pra Ribeirão Preto, ele intimava Sócrates a armar uma pelada com ele e seus músicos antes dos shows.
Magrão não só organizava peladas inesquecíveis, como cedia alguns amigos para completar o time do amigo. Eu mesmo cheguei a jogar nos dois lados, era uma honra pisar no gramado da chácara do Zé Strambi com meus ídolos Sócrates e Toquinho, que detestava perder.
Porém, mesmo perdendo, na noite seguinte, no palco do nosso maravilhoso Theatro Pedro II, só pra sacanear o Doutor, ele comentava sobre o jogo e dizia que seu time, mais uma vez, deu um show de bola e ganhou de goleada. A gente ali, na plateia com o Magrão, assistíamos a tudo sem poder retrucar, só nos restava dar boas risadas.
Mas, o gostoso destas peladas era o depois, a hora da resenha e saboreando aquele churrasco caprichosamente assado pelo Luizão, cozinheiro do Magrão, e o chope que encharcava nosso verbo. O Doutor cutucava Toquinho para que ele contasse suas histórias vividas ao lado de Vinícius e o amigo mandava ver.
Essa, por exemplo, vi e ouvi Toquinho contar várias vezes. Ele dizia que Vinícius tinha um ciúme doentio dos amigos, dele então nem se fala, pois o considerava um filho. Toquinho conta que, em certa ocasião, estavam em um bar em Paris, com muitos brasileiros presentes. E onde tem brasileiro tem alegria, comentava Toquinho.
De repente, do nada, deu um chilique no poeta. Ele se levantou e disse: “Vou embora”. E foi saindo, sem que ninguém entendesse o porquê. Toquinho, vendo que o amigo estava pra lá de Bagdá e o hotel em que estavam era próximo, foi seguindo o parceiro. Ficou a uns dez metros de distância, mas o poeta percebeu, parou, virou-se e viu o amigo.
Toquinho disse ter recebido dele um dos melhores abraços da sua vida, choraram um bocado abraçados ali naquela calçada de Paris. Foi quando Vinícius perguntou ao amigo: “Toco, porque nós brigamos?” Toquinho, rindo, respondeu: “Não sei, Vini. E o poeta emendou: “Poxa, Toquinho, não vamos brigar mais não, eu te adoro parceiro, não vale a pena ficarmos tristes por picuinhas”. E foram abraçados, rindo e cantarolando para o hotel.
A partir desta história Toquinho começou a compor “Porque será”, que eu canto e adoro, ela narra bem o caso contado por ele. Seus parceiros nesta composição são Vinícius e Carlinhos Vergueiro.
“O filho que eu quero ter” é uma música que nasceu do desejo de Toquinho de ser pai de um menino. Recebi um zap do querido amigo Antonio Carlos Augusto Gama, brilhante advogado e poeta de primeira. Essa história eu já conhecia, porém não me lembrava. Toquinho e Vinícius estavam num hotel à beira mar, na praia de Boa Viagem, em Recife. Toquinho, mais uma vez, falou com Vini sobre seu desejo de ser pai de um menino.
Revelou que já havia até feito a música, mas faltava a letra. Vinícius pegou o gravador com a fita e disse ao parceiro: “Vá pra praia se divertir com os músicos”. Nosso poeta não gostava de praia, mas não escondia sua paixão por um bom uísque.
Toquinho voltou à tardinha e encontrou Vinícius aos prantos com a letra da música na mão. Olhou pro Toco e disse: “Veja se ficou do seu gosto”, De imediato ele a cantou e foi aquele chororô. Toquinho vivia as turras com seu pai e contava tudo a Vinícius, que o aconselhava.
Até que nasceu o filho homem tão desejado e Toquinho foi logo contar a Vinícius. Os dois festejaram muito e depois o poeta sabiamente lhe disse: “Que bom, Toquinho, quem sabe agora você vai entender o seu pai”.
Procure ouvir “O filho que eu quero ter”, com Toquinho.
Sexta conto mais.