Não precisa de GPS. É só chegar ao distrito de Bonfim Paulista e perguntar onde mora ou onde é a borracharia do Adélcio que facilmente você receberá a informação. Mais que conhecido, Adélcio ou simplesmente Zil é uma pessoa querida e tem alguns casos e histórias divertidas. Um dos comerciantes mais antigos da cidade, ele é o personagem da edição deste domingo do Tribuna.
Mas por que Zil? Ele diz que é por conta de gostar muito da Seleção Brasileira. “Quando tem jogo eu torço mesmo. Eu me visto com a camisa da seleção e fico gritando Brasil sil sil… ficou Zil”, ri.
Adélcio Batalha, o Zil, hoje com 64 anos, é borracheiro e distribuidor de gás. Foi um dos pioneiros nos dois ramos em Bonfim. Mas antes, morava na roça. “Era sofrido. Muito sofrido. Trabalhava na lavoura de café, de tomate. Ganhava pouco, mas nunca fugi do trabalho”, disse.
Jovem, resolveu arriscar em Bonfim. “O meu sogro disse na época: O que você vai fazer da vida? Eu acreditava em mim. Sei que trabalho muito, sempre trabalhei. Sabia que ia conseguir trabalho”, conta.
Chegou a Bonfim na casa de parentes e em três dias arrumou um emprego que mudaria sua vida. “Perguntaram se eu queria trabalhar na borracharia da pedreira Inderp. Falei que queria, mas que teria que aprender. Me deram o emprego”. Mas, a vida de trabalho duro das lavouras não ficou para trás. “Ai que trabalhei mais ainda. Muito mais sofrido. Era caminhão atrás de caminhão e eu carregando aquele monte de pneu. O salário não era bom, mas aprendi a profissão”.
Adélcio saiu da pedreira e resolveu arriscar novamente em busca de outro emprego. Mas a borracharia parecia ser a sua sina. “Não fazia 3 dias que tinha saído da pedreira. Estava de roupa social. Ai o Luiz Martinez perguntou se eu queria tocar a borracharia dele que estava desativada no posto. Entrei no galpão e daquele jeito mesmo que estava comecei. Resumo, fiquei mais de 8 anos”.
Ao término da parceria, Adélcio decidiu que queria o negócio próprio. Foi atrás de um imóvel em uma imobiliária. Conseguiu um ponto. “Mas pensa num local cheio de entulho. Tiramos mais de quatorze caminhões de entulho. O rapaz da imobiliária não acreditou que eu iria ficar com o ponto, porque todo mundo tinha desistido. Eu fui com tudo”.
O negócio prosperou. Um comerciante vizinho lhe ofereceu para ser distribuidor de gás. “Eu pensei em negar, mas os caras da Ultragaz vieram e me convenceram. Pensa, eu era o único distribuidor de Bonfim. Ganhei e guardei dinheiro”.
Além da borracharia e da distribuição de gás, ele também começou a administrar a lanchonete do vizinho, que não queria mais saber do negócio. “Eu trabalhei como um doido. Sempre gostei. Toquei tudo ao mesmo tempo”.
Mas o sucesso nos negócios despertou outros interesses e o ponto comercial que antes de ser alugado era indesejado, passou a ser almejado. “Foi um rolo. A proprietária queria que eu ficasse, mas o neto dela queria o ponto. Eu fiquei com uma pulga atrás da orelha e pensei: vou fazer minha oficina num local meu”.
Mais uma vez mudou, mas, agora em definitivo. Montou a estrutura no quintal da própria casa. Fez um muro dividindo o depósito de gás e a borracharia da moradia. Deu certo.
Hoje aposentado, Adélcio deixou o negócio para o filho trabalhar. “Mas como é em casa, tô sempre aqui”, finaliza.
Histórias e casos
As histórias de Adélcio Batalha são tão conhecidas como ele próprio. Durante a entrevista, alguns moradores do distrito, que passavam pela rua, paravam e pediam para ele contar esse ou aquele caso.
“Mas muita coisa eles aumentam ou inventam. Falam que fui eu”, brinca. “Tem muita invenção e muita verdade, é que aumentam. Eu gosto de brincar, de zoar, mas sem machucar ou agredir ninguém”.
Uma das mais famosas é quando ele estava no bar e pediu um mototaxi. O mototaxista chegou, ele subiu na garupa, andou 20 metros, pediu pra parar e pagou, porque o bar era ao lado da casa dele. “Foi mais ou menos verdade. Eu não pedi, mas ele tava lá e eu paguei a corrida. Foi R$ 15,00. O rapaz ficou sem entender. O bar estava lotado. Bom pra ele que ganhou R$ 15,00”.
Certa vez se envolveu em um acidente de carro em Ribeirão Preto. “A mulher brava desceu do carro e disse. Eu sou advogada e tenho advocacia. Eu gritei pra ela, sou borracheiro e tenho borracharia. Não teve nada demais, mas eles contam e aumentam um pouco”, ri.
Uma das mais famosas é quando foi ao baile da cidade de macacão de entregador de gás. “Eu estava chegando da pescaria. Parei no bar e me chamaram para entrar no baile. Entrei e tinha o repórter que me viu e foi logo me entrevistando. Tá na internet né. Todo mundo viu”.
Black power
Outro detalhe que chama a atenção das pessoas e deve ter chamado a atenção do repórter é o visual de Zil. Cabelos longos e cacheados estilo black power. “Eu gosto e sempre usei assim, mais cumprido antes”, admite.
Aposentado, Zil diz que só não fica mais na beira do rio pescando porque o gelo acaba e não dá pra conservar os peixes. “Eu sou pescador bom. Os peixes que pesco eu dou aqui para os amigos e vizinhos. Eles esperam”.
Borracharia exótica
Mas quem entra na borracharia do Zil não entra em um local comum. O pequeno cômodo é lotado de objetos diferentes que vão desde animais empalhados a latas de cervejas importadas.
“Começou com um primo que me deu uma coruja empalhada. Depois um trouxe uma cobra num vidro. Uma pele. Um peixe e ai foram trazendo e eu ajeitando aqui. Tudo presente das pessoas”, conta.
O cenário rende fotos e selfies. “Muita gente chega aqui e pede pra tirar fotos. Eu deixo. Mas não tem nada demais”.
Entre os objetos alguns violões. “É que eu gosto de tocar. Tinha uma dupla sertaneja Adélcio e Eduardo. A gente tocava na lanchonete. Lotava. De vez em quando eu toco e canto aqui”.