Tribuna Ribeirão
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Radical e universal

Sérgio Roxo da Fonseca *  
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Finda a Grande Guerra, aprendi que os japoneses, italianos e alemães haviam deixado de ser os inimigos número um da humanidade. Os comunistas e os maçons tomaram o seu lugar. Os primeiros eram ateus e os segundos discípulos de satanás.  
Ao ingressar no seminário de Ribeirão Preto, em 1950, meu pai havia me revelado que era maçom. Informação que eu não poderia transmitir a ninguém. Sou excomungado, acrescentou.  
Este não era o único problema da época. Os marcianos, montados em discos voadores, estavam invadindo a terra, infernizando os homens e as mulheres. A principal revista da época, “O Cruzeiro”, chegou a publicar uma fotografia de um disco voador passeando sobre o horizonte da praia de Copacabana. 
Concluía que se meu pai é excomungado, vai para o inferno. Eu então rezava toda a noite pedindo a Deus que, depois da minha morte, tivesse a bondade de jogar minha alma nas profundas do inferno. Entre morar no céu com os anjos ou no inferno com o capeta, preferia a segunda opção para poder ficar ao lado do meu pai, por quem devotava enorme admiração e hoje inesquecíveis saudades. 
Quantos aos marcianos, se acaso invadissem a terra, eu me comprometeria a colocá-los a correr. A verdade estava sempre do meu lado, devendo vencer a dos outros, custasse o que custasseMesmo quando um era o senhor dos céus e os outros moradores de um planeta desconhecidoEu era um radical. 
Angustiado procurei o Padre Luís de Abreu, orientador dos alunos, transmitindo minhas angústias, com a maçonaria e com os marcianos. Quebrando o segredo prometido revelei a ele que meu pai era maçom. “O meu também é maçom”, respondeu-me espantosamente. “Mas os dois vão para o inferno”, disse acabrunhado.  
“Não vão para o inferno, pois quando Cristo morreu no calvário derramou seu sangue para salvar toda a humanidade, incluindo os maçons. Todos foram resgatados”. Fiquei de boca aberta. 
E a invasão dos marcianos”. Acrescentou que não acreditava que houvesse marcianos nem em Marte e nem na Terra. Mas se existem não se pode temer. “Você não acredita num só Deus? Se existem marcianos o nosso Deus é o Deus dos marcianos”. 
O Padre Luís de Abreu havia lutado ao lado daqueles homens que morreram em busca de uma democracia para o Brasil. Tinha participado da Revolução Paulista de 1932. 
Vivíamos no ano de 1950. Fiquei mais espantado aindaCom certeza o Padre Luís tinha na alma a certeza de sua fé, mas a existência da contestação não o afligia. A sua verdade era marcada pela universalidade e não pela radicalidade, campo no qual os contrários são inimigos pétreos e não apenas adversários. A humanidade, segundo suas palavras, unia todos os homens ainda quando não alinhados sob a mesma fé. 
Em Ribeirão Preto, havia pouquíssimas escolas universitárias. O Padre Luís de Abreu trabalhou muito, naqueles dias, para instalar a PUC nestas terras. Sem êxito. 
Voltou para Campinas, sua terra natal. A crônica afirma que teve grande sucesso, colaborando com a instalação da PUC campineira, espalhando pelo seu caminho as regras da universalidade humana que, muito embora marcada por conhecidos erros, figurava como única marca de existência ligando todos os homens no caminho da paz. 
 
Promotor de Justiça aposentado e advogado 

 

 

 

 

 

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