A maconha usada diariamente aumenta em até três vezes o surgimento de psicoses. Mas se a droga usada tiver alto teor de THC (Tetra-hidrocanabinol) a possibilidade do surto pode aumentar em até nove vezes. Este é o resultado de estudo feito em 17 centros de pesquisas em seis países: Inglaterra, Itália, Holanda França e Espanha. No Brasil, a pesquisa foi organizada pela pesquisadora e professora da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP- USP), Cristina Marta Del Ben.
No Brasil, a primeira etapa do estudo consistiu na identificação de pacientes em primeiro contato com serviço de saúde devido a sintomas psicóticos. Foram incluídas 588 pacientes de ambos os sexos, com idade entre 16 e 64 anos e residentes em cidades da região de Ribeirão Preto. A pesquisa foi realizada entre 2012 e 2015.
Os pesquisadores avaliaram a idade do paciente, se o uso da droga era diário ou não, tempo de uso, tipo da droga, quanto foi gasto com a maconha, entre outros questionamentos. O resultado do estudo internacional mostrou relação entre o uso da droga com o surgimento de psicoses nos casos novos avaliados.
Em Ribeirão Preto, o estudo apontou 17 novos casos de surtos psicóticos, por ano, para cada 100 mil habitantes. Na região, foram 21 novos casos e em São Paulo, capital, 19 casos. “A nossa hipótese, que precisa ser melhor estudada, deve ter relação com os fatores econômicos. Mas outros fatores podem ter influenciado no resultado”, explica a professora sobre a diferença de números entre as regiões.
Em países em que a maconha com alto teor de THC é a mais usada, o número de novos casos de psicose é maior do que em locais em que o uso é baixo. “Em Londres, a incidência foi de 61 novos casos de esquizofrenia para cada 100 mil habitantes. Enquanto em cidades pequenas da Espanha, esse índice foi de 6”, explica. Amsterdam e Paris também apresentam números próximos a capital inglesas.
Segundo o estudo se retirasse a maconha em Londres e Amsterdan o índice de casos de esquizofrenia cairia, 30% e 50%, respectivamente. “O estudo mostrou é que se não houvesse a droga com alto grau de TCH, nessas cidades, seria possível reduzir o surgimento de casos novos de psicoses”.
Na região de Ribeirão Preto, “o uso de maconha com alto teor de THC foi relatado por apenas uma pequena parcela de participantes do estudo (1,5% dos controles de base populacional e 3,6% dos pacientes). Por outro lado, o uso diário de maconha foi observado em 7,4% dos controles e 25% dos pacientes, o que se refletiu num risco 2,5 vezes maior de ocorrência de psicoses entre os indivíduos com uso diário de maconha.
“Tendo-se em vista o impacto causado pelas psicoses, a compreensão da etiologia e fatores de risco é fundamental para o desenvolvimento de políticas públicas e ações de prevenção, bem como, para a promoção de melhorias da vida daqueles que estão direta ou indiretamente afetados por esses transtornos, por meio de ações terapêuticas mais eficientes”, afirma a professora em seu relatório.
Psicoses
Os transtornos psicóticos caracterizam-se, principalmente, pela presença de alterações no pensamento e na senso percepção, que são frequentes, intensas, causam sofrimento significativo e levam a um prejuízo significativo do funcionamento social, ocupacional e de relações interpessoais do indivíduo.
Essas manifestações são comuns na esquizofrenia, mas também podem ocorrer em outros transtornos mentais, como transtornos de humor e transtornos induzidos pelo uso de substâncias psicoativas, entre outros.
Os transtornos psicóticos, também denominados genericamente como psicoses, constituem grave problema de saúde pública, sendo associados a uma perda significativa de anos de vida produtivos, taxas de mortalidade maiores do que aquelas observadas na população geral e enormes custos para o indivíduo e a sociedade.